Fracas emoções

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Com o passar do tempo, Betânia percebia a cicatrização na pele, no pé mutilado e até o crescimento das unhas das mãos.

Um pouco de vaidade brotou nela, que pediu a Tino que quando fosse para o centro, lhe comprasse um esmalte rosa. Sempre gostou dessa cor. Sua mãe, que lhe tinha tanto amor, a ajudava a escolher esmaltes, batons, sombra e até colônias no catálogo do Avon.

- Ah, mamãe... Tenho saudade dela. Ela deve estar sentindo minha falta. Será que me procuraram?

- Com certeza devem ter te procurado, mas o idiota do delegado Serafim não vai mover um dedo pra te ajudar. Ele é pior que vampiro. Parece que gosta de sangue. Credo! - Tino era barbeiro e um excelente pedicuro. Fazia as unhas do pé de Betânia enquanto tagarelavam. - Não sei se vai lhe fazer diferença, se eu fosse você, eu não ia procurar mais desgraça em minha vida. Não faço ideia do motivo de terem te machucado tanto, em minha opinião, se você "pintar" na sua cidade vai praticamente convida-los a terminarem o "serviço".

- Eu sei Tino, já pensei nisso. Só que... eu queria tanto ver minha mãe.

- Betânia, sua cidade não é tão longe assim daqui. Eu posso tomar um ônibus e ir lá. Escreva-me uma carta que entrego a ela. Assim, não que eu goste de fofoca, mas descubro algumas coisas.

- Não gosta de fofoca?

Tino parou o que estava fazendo e estreitou os olhos para ela.

- Não gostei do seu tom, garota.

- Só lhe perguntei.

- Ahhh...

Dois pares de olhos encararam Marvin como se ele acabasse de descer de um OVNI. Ele nunca verbalizou perto do irmão. Acabara de fazer e foi por Betânia. Ele pareceu querer dizer-lhe algo.

- Marvin, fique tranquilo. Não vou fazer nada de forma precipitada. - Marvin abriu um sorriso onde exibia todos os 32 dentes. - Nem vou "deixar" o Tino me fazer essa gentileza.

- Acho bom que você reconheça que sou mesmo um cara gentil. - Sorte que Tino não compreendera o sarcasmo na frase dela. E por esse motivo, Marvin e ela não conseguiam parar de rir. - Acabou!

- Tino eu estava só...

- Suas unhas, olhe se ficou bom assim.

- Tino! Ai, Tino que lindo. Você é tão caprichoso, eu amei. Pena que meu outro pezinho...

- Betânia, não se queixe, você ainda pode caminhar com a muleta. Tem gente sem as pernas, sabia? O que são uns cinco dedos "atorados"... Você está viva! Fique feliz por isso. Mas voltando ao assunto: sou mesmo muito bom! Você tem pés muito bonitos. Mesmo o cortadinho é bonito. É até mais lindo que o outro, porque significa que você aguentou algo que os covardes não vão aguentar quando...

- O que? Quando o que?

- Pessoas ruins tem um destino meio trágico, "às vezes"... Não queira cair nas mãos do delegado. Não queira mesmo.

- Aquele que você odeia? Porque?

- Ele é pior que muito bandido quando lhe pedem que "justiça seja feita". Mas tem aqueles entojados lá do centro da cidade que acham que tudo é boato.

- Acho que só Marvin que não costuma ser cheio de mistérios e falar por enigmas.

- Amada, acredite. Todo boato que "inventam" aqui nesse "cú de mundo" é uma verdade.

Betânia revirou os olhos e suspirou. Quando se deu conta, tinha as unhas das mãos feitas e gritou:

- Tino, eu te adoro! Ficou lindo. Ué, nem vi você fazer.

O Papai UrsoOnde histórias criam vida. Descubra agora