Capítulo XXXII

1K 74 14
                                    

Alfonso respirou fundo, expandindo as narinas e sentindo o sangue ferver. Detestava quando alguém tentava lhe dizer o que fazer, mas aquele era Christopher... Ucker, também conhecido como seu melhor amigo é alguém a quem ele jamais desejaria ou faria mal. Tudo isso, porém, não evitou que ele fosse extremamente ácido em sua resposta:

— Acaso te parece mais saudável que eu saia por aí entornando copos e mais copos de Brandy e fodendo mulheres aleatórias, das quais sequer lembrarei o nome no dia seguinte, já que estava chapado demais pra isso? É isso que você considera saudável?

— Eu só quero que se distraía, cara . – respondeu com paciência, ele sabia que quando Alfonso estava frustrado com alguma coisa, nem adiantava apelar pra uma discussão. — Sei que está sendo uma barra. Primeiro tudo o que aconteceu com a Dulce e agora a Anny resolve...

— Você não entende. – Alfonso murmurou.

— Entendo mais do que você pensa. – Christopher revelou, o pesar evidente em sua voz. — Apesar de ser seu melhor amigo desde daquele primeiro dia em que nos conhecemos no campus da universidade, também me tornei amigo de sua esposa. A minha admiração pela presença de espírito e o talento de Anahí só cresceram e minha namorada é a melhor amiga dela. Tenho visto como ela está e posso afirmar com segurança, não está sendo fácil pra ela também.

— Por que está me torturando com todo esse assunto? – Alfonso retorquiu. — Tudo bem, Ucker. Não sou perfeito, é verdade. Estou longe de ser... mas estou lidando com esse caos da melhor maneira que posso. Pode não ser boa o bastante pra você, porém como meu amigo, eu peço que não se meta mais nisso. Tire todas essas ideias de mulheres e bebida da cabeça. Acredite, nenhuma dessas coisas seria capaz de entorpecer, de anestesiar o que eu sinto.

— Eu só não entendo porque insiste em se isolar e atormentar todos ao seu redor enquanto isso.

Alfonso franziu a testa sem entender.

— Eu? Atormentando todos ao meu redor? Que porra é essa que você está falando?

— A porra que eu tô falando é que basta cinco minutos nas dependências desse hotel pra ouvir os seus funcionários reclamarem de você, Alfonso! – Christopher inclinou-se sobre a mesa do amigo, obrigando-o a encara-lo. — Eles estão trabalhando sobrecarregados, estão exaustos... e você não se toca disso. Eu entendo o que você tá passando melhor do que ninguém e você sabe bem disso, porque me viu arrasado quando a Kate me largou por aquele hipster pra viver fazendo mochilão pelo mundo e tomando chá de ayahuasca!

Alfonso acabou rindo da maneira com que amigo tratava o que tinha acontecido no passado... mas a verdade é que ele sabia de tudo aquilo e, de fato, tinha visto o estado deplorável em que o amigo ficará após ser traído e abandonado.

— Achei que não fosse superar... – Christopher continuou, sabendo que agora tinha a atenção de Alfonso. — Que não existisse outra mulher no mundo pra mim. Não conseguia entender como ela podia ter me deixado sem nenhuma cerimônia, depois de uma história de anos...

— Me lembro disso. – Alfonso disse, rindo, mesmo sabendo que aquele assunto não tinha a menor graça. — Vocês namoravam desde que tinham treze anos, não foi? Não sei como ela foi capaz de te deixar no altar e fugir com um homem que mal conhecia... Não faz sentido nenhum.

— Eu fiquei furioso. – Christopher assumiu. — Queria brigar com todo mundo e gritar com o universo por ter sido tão injusto comigo... demorou, mas eu entendi o que tinha acontecido de errado.

— O que quer dizer com isso?

— Eu era um adolescente vivendo sua primeira paixão e achando ingenuamente que ela seria a última. — ele gesticulava. — Eu criei uma Kate na minha cabeça que não existia em nenhum outro lugar exceto ali... e isso... isso a sufocou, como poderia ser diferente? Eu fiz todo um projeto de vida pra nós dois e em nenhum momento a consultei... eu deixei me levar pela emoção do primeiro amor. Ela me amava naquela época, Poncho, eu sei disso... e eu achava que aquele amor seria o suficiente... mas não foi. A vida que eu quis pra nós dois, era exatamente isso: o que eu queria. Eu devia ter visto isso antes.

— Mas e o outro cara... – Alfonso questionou sem perguntar diretamente.

— O hipster? Vicent... foi apenas a saída que ela viu naquele momento, na hora do desespero, pra se ver livre na gaiola de ouro que era nosso noivado.

— Quer dizer que não os culpa... nem um pouco?

— Não. Eu não culpo ninguém. – Christopher respondeu com franqueza. — Exceto a vida, talvez, com seus caminhos sinuosos. Se não fosse Vicent, seria outro. A verdade é que Kate me amava a seu modo, mas nossos objetivos e visões de mundo eram muito diferentes e ela resolveu trilhar o seu caminho. Se não fosse isso, estaríamos os dois enterrados em um casamento por aparências apenas para satisfazer nossas famílias... e Kate estaria infeliz e isso eu não iria suportar. No mais, eu não teria tido a chance de conhecer a mulher mais incrível do mundo. Maite me faz ficar feliz por não ter dado certo com nenhuma outra.

Alfonso percebeu-se refletindo por um momento, por mais que tentasse negar, as palavras do amigo reverberaram dentro dele de uma forma significativa.

— Então acha que devo esquecer Anahí de vez e pular para outra paixão? É o que está tentando me dizer?

— Não. – Christopher meneou a cabeça. — Acho que você precisa definir seus objetivos e entender os dela... o que, francamente, você não vai conseguir se ficar se acabando de trabalhar, sendo um déspota com seus subordinados e vivendo à base de energéticos, café e brandy.

— E pretende me ajudar me levando pra beber ainda mais...

— Não é assim. – Christopher riu, achando graça da teimosia do amigo. — Quero que se distraia, é verdade, mas esse lance de bebida foi você que deduziu... Até porque sei que quem anda bebendo até cair depois do expediente é você. Joana, sua empregada, contou tudo a Anahí.

— Elas falam de mim pelas minhas costas? – Alfonso perguntou exasperado. – Além de tudo ela quer tripudiar em cima de mim... rir do mal que causou ao idiota do Alfonso.

— Não! –  Christopher falou, precisava pôr um pouco de bom senso na cabeça de Alfonso. — Pára de ser cabeça-dura. Você precisa se encontrar primeiro, bro. Você nunca fez algo pra você! Nem uma vez. Algo que não envolvesse sua família, que não os beneficiasse em nada... que não beneficiasse seu pai.

— E o que eu poderia fazer? – suspirou resignado.

— Trabalhar com aquilo que realmente ama seria um começo.

Alfonso estremeceu.

Anos lutando para reprimir seus sonhos de adolescente pareciam dias... no final será que ele sempre seria o menino que sonhava alto demais e sempre se acovardava diante de Armando Herrera?

— E o que seria isso?

— Estou seguro de que sabe do que estou falando.

Ele sabia. E Christopher também, por isso tinha feito aquela insinuação. Ele não deixou brecha para Alfonso voltar a rebater seus conselhos e foi levantando, pronto para ir embora.

— Eu vou indo, bro, mas pense em tudo o que conversamos e quando tiver colocado tudo na balança... – ele piscou cúmplice. — Vá atrás dela.

— Por que?

— Porque você a ama. – disse na lata, vendo Alfonso desviar o olhar diante do peso da verdade. — E ela, por alguma razão que eu desconheço, corresponde esse amor, mesmo que você seja tapado demais pra ver o que está a um palmo do seu nariz.

Alfonso demorou mais um tempo no hotel naquele dia... mais pensando no que Christopher lhe dissera do que trabalhando. Ele devia mesmo ir atrás dela, seria isso que ela queria? Ele não estava certo disso. Anahí tinha sido tão decidida quanto a sua decisão de sair de casa, faria alguma diferença se ele resolvesse pedir para que ela voltasse? Resignado e perdido em seus pensamentos, Alfonso encheu mais um copo e tomou de um gole só.

Water Under The Bridge  ✔️Onde histórias criam vida. Descubra agora