CAPÍTULO VII
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Quando o sol finalmente raiou, eu esperava ansioso pelo educador, era claro que eu seria libertado, as possibilidades eram tantas que eu me vi nervoso com a demora, não importava o quanto nosso pai era sistemático descobri que ele era um verdadeiro anjo perto dos policiais que conheci horas antes, a grade de acesso à galeria abriu-se ruidosa, a primeira cela foi aberta e os dois detentos saíram, observando-os pela grade vi os dois passarem sorridentes, um deles com mais de um metro e noventa, pesava uns cem quilos, era grande e gordo em minhas definições o outro era magro bem magro e caminhava levemente arcado, esguio, transmitia a imagem de um péssimo mentiroso, tinha em média um metro e oitenta, as têmporas marcadas e os olhos no fundo o tornava inconfundível, juntos lembravam o gordo e o magro, do serreado de teve, cada um com uma toalha no obro andavam a passos largos e no final do corredor entraram em uma pequena sala sem porta, sempre acompanhados de um educador carrancudo.
Prestei atenção e minutos depois os rapazes voltaram, assim que entraram o homem de calça jeans, camiseta branca e colete preto abriu minha cela, perguntei quando sairia dali, ele olhou fixamente para mim por alguns segundos.
"É a primeira vez que foi apreendido?"
"Sim, mas sou inocente", conclui.
Para mim não bastava a certeza de minha inocência, achava que convencendo as pessoas a minha volta eu seria ouvido e levado a sério, descobri tempos depois que o único que me levaria a sério seria eu mesmo, ninguém estava interessado em ouvir muito menos, condoer-se de mim.
"Pra começar mesmo que seja inocente o período mínimo aqui é de quarenta e cinco dias, isso se não houver contradições em seu depoimento."
"Espancamento", pensei em silêncio, mas corrigindo mentalmente o falante homem.
"Então para que não sofra além do necessário acho melhor conversar com seu colega e aprender tudo o que precisa", disse fazendo menção ao garoto ao meu lado.
Quando olhei a minha direita meu cérebro literalmente congelou, a notícia de meu tempo de permanência e as condições de meu colega me fizeram ficar calado, olhando o desconhecido já intitulado colega de cela, pensei seriamente na morte, ele com certeza já tinha data marcada e passaporte carimbado, a morte o esperava ansiosa isso era certo. O magro da cela ao lado não estava em seus melhores dias, mas não chegava a ter a expressão morfética e olhos alienados à realidade, mesmo ao caminhar ou parecer animado, minha mente traiu-me e mostrou-me um futuro nada feliz, em poucos segundos centenas de coisas ruins passaram pela minha cabeça enquanto eu a meneava não concordando com o filme dentro dela. O educador trouxe-me de volta jogando uma velha toalha branca em meu ombro.
"Siga seu colega vocês têm exatos cinco minutos, não desperdicem."
Caminhamos até a sala que vi anteriormente e descobri do que se tratava, a cor era a mesma, dividida por box o banheiro era igualmente horrível, um registro encravado na parede deixava aparente somente a borboleta para que pudesse ser aberto, o som da água caindo no box ao lado era alto e o rapaz parecia não ligar ao fato dela estar fria, molhou e ensaboou-se em um minuto, enquanto eu continuava estático à procura do chuveiro. Dois fios grossos no alto da parede logo acima da ponta do cano denunciavam que em um passado distante a dignidade passara por ali, no lugar dela restara apenas a criatividade de alguém indignado com a situação e esperançoso por mudança. A pessoa em questão usou uma garrafa pet de refrigerante, cortando alargou um pouco o gargalo até que o cano coubesse, com dezenas de furos improvisou o chuveiro que eu tanto queria.
"Cara se eu fosse você eu andava logo, se ele entrar e você não estiver pronto..."
Os mortos falam, pensei comigo achando-me engraçado, quando repentinamente ouvi pegadas se aproximando, como uma criança que não cumpre uma determinada tarefa delegada pelos pais, corri e abri a água que caiu abundante e gelada, arrancando me suspiros e sussurros. A garrafa não servia para nada a não ser para espalhar a água, assim que fiquei molhado ouvi o educador chamando-me, pois meu colega já estava quase seco, nu e em silêncio, enquanto vestia-se. Ele parecia conhecer o sistema e a rotina desse lugar, sem pestanejar colocou a mesma cueca e o mesmo uniforme.
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VOCÊ PRA MIM
RomanceAs emoções se misturam num compendio onde tudo faz sentido, o mistério prende o leitor de forma enigmática por traduzir em palavras um amor cindido e complexo, que só quem viveu é capaz de compreender.