10 - Quase um casal

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"Quase um casal
Quase que rolou um sentimento
Nós ficamos perdidos no tempo
Ficou pela metade ficou pra depois.
Quase nós dois."

Alguma vez você já sentiu seu chão sumir, ou que o mundo bruscamente parou de girar? Pois bem, é assim que estou me sentindo exatamente agora. Eu queria, ou melhor, precisava ser forte, até porque eu estava diante do homem que me deu tanto... Mas a questão não era essa.

Me sentia devastada em todos os sentidos. Simplesmente não conseguia parar de olhar para a tela do celular onde acessava a notícia. Meus olhos pareciam petrificados. Havia lido e relido várias vezes, o suficiente para perder as contas e os fios de cabelo. Simplesmente não conseguia dizer nada.

"Paula Fernandes e Marcos Pitombo se beijam em show da cantora em Goiânia."

Parece que a noite rendeu! Após a participação da cantora Paula Fernandes em um festival sertanejo, que também contou com Jorge e Mateus, Chitãozinho e Xororó, Matheus e Kauan, Michel Teló, dentre outros nomes do cenário atual na noite desse sábado, ela foi flagrada aos beijos com o ator Marcos Pitombo. O possível mais novo casal foi clicado em um camarote exclusivo, organizado pela assessoria da cantora. Vale ressaltar que Paula está solteira após recente anúncio do término do noivado de quatro anos com o dentista Henrique do Valle."

Ramón: Sabrina... querida... - sacudia meu braço.

Depois de alguns segundos, saí do transe. Eu não queria acreditar que aquilo estava acontecendo. Sites de fofoca também mentiam se fosse necessário, afinal conheci esse mundo. O passado jornalista ainda habitava em mim. Mas a foto estava ali, não havia resquícios de photoshop ou editor similar. Havia acontecido, não importa o quanto eu quisesse negar isso.

Mesmo com os olhos pesados, me virei no sofá para encarar o rosto de Ramón. Consegui perceber que seus olhos antes triunfantes, agora mostravam-se tristes. No fundo o entendo, afinal o magoei tanto e ele tem motivos de sobra pra odiar o Marcos. Queria dizer algo a ele, mas estava cansada e triste demais para isso. O dia já tinha sido longo e eu só queria descansar. As forças simplesmente se esvaíram de mim, a vontade de colocar minha vida em ordem, me reacostumar ao fuso horário... todos os meus planos que tracei quando voltei a pisar nesse apartamento depois de voltar do paraíso, que num piscar de olhos se tornou o inferno da minha alma. Sem graça, pedi a ele para se retirar, agora mais calma do que há alguns minutos. Aleguei estar cansada demais para uma conversa.

Queria tanto que fosse somente isso.

Ele não pestanejou e saiu, e logo fui fechando a porta detrás dele. Me vi numa situação que havia saído da minha zona de conforto. Estava péssima. Encostei na madeira fria da porta de mármore envernizado e chorei, como nunca. Meu peito estava carregado com um peso tão grande, que chegava a doer. Quase já não me lembrava como era se sentir assim. Como ele foi capaz de destruir tudo? Cheguei a escorrer até sentar no chão, e lá fiquei. Eu juro que dormi no chão do hall.

Duas semanas depois, eu já estava acomodada, planejando e realizando. Tinha tomado a séria decisão de me afastar por hora das redes sociais para evitar novas decepções. Já havia avisado na semana anterior em todos os veículos para tranquilizar os fãs, que sempre me tratam com muito carinho. No começo relutaram, mas entenderam. Sem contar os sms que determinadas pessoas ainda insistem em enviar. Comecei a passar mais tempo com meus pais e meu irmão, mais do que de costume. Aquele acolhimento familiar me preenchia muito, mas não completamente. Sabia que faltava um detalhe, mas no momento eu não queria me recordar. Voltei a me dispor pra novos projetos com o grupo de teatro. Gabriel Godoy se juntou a nós e tudo tem sido fantástico. Acho que para o próximo ano já colocamos uma peça em cartaz aqui na capital.

Tudo parecia estar conforme planejado, até que recebi uma mensagem: "Sabrina, faz tempo que não nos falamos, que tal irmos pra um happy hour? Sem pressão e sem inconveniências, eu juro! xoxo." Ramón estava de volta ao Brasil. Confesso que fiquei surpresa de como ele havia aceitado bem esse período onde não havia mais nós. Com isso, acabei percebendo que ele é melhor sendo um amigo do que um namorado. Isso me fez tomar uma decisão que eu não tinha coragem de expor e precisava colocar tudo em pratos limpos com ele. Talvez eu arruinasse o passeio, mas acho que depois de tudo eu consiga contar. Resolvi então aceitar o convite: "Então te vejo lá!".

Algumas horas depois, me dirigi até o lugar combinado. Era um bar conhecido no Ibirapuera, onde muitos frequentavam durante as happy hours que se estendiam até mais tarde. Ramón me aguardava no balcão próximo ao barman. Me cumprimentou com um beijo no rosto e sentamos. Conversamos sobre a vida e as rotinas. Conforme o diálogo se estendia, eu tinha cada vez mais certeza que o meu interesse por ele e pelas coisas que falava havia mudado. Eu criei um afeto daqueles de irmão, sabe? Mas como transmitir algo a ele sem lhe dar esperanças de que iremos voltar? Que não tem mais espaço para nós dois, pelo menos não casados?

Já a altas horas, a banda convidada inaugurou os trabalhos tocando um rock nacional. Até que eu achei que estava vendo coisas. Ramón num pulo subiu no palco e cochichou no ouvido de um dos integrantes, logo que houve o primeiro intervalo. Logo que pisquei, ele tomou o microfone e me convidou a subir ao palco. Surpresa e um pouco envergonhada, fiz o que pedi, sem entender nada. Olhando para mim, segurou minha mão, se ajoelhou e disse:

Ramón: Sabrina... sei que passamos por altos e baixos durante 5 anos, mas... estou disposto a começar do zero e que esse recomeço seja do seu lado. Me dá mais uma chance? Você aceita renovar seus votos de compromisso comigo?

Fiquei totalmente sem reação. Não conseguia encará-lo. Resolvi olhar ao redor: todos no recinto devolviam o olhar, atentos aguardando minha resposta, afinal era um quase pedido de casamento. E ele ali, imóvel, esperançoso. Como dizer a ele que eu já não sou mais a mesma para começar tudo do zero, se minha alma já reiniciou seu ciclo?

Que aquela viagem havia mudado minha vida? Ou melhor, uma pessoa?

E como falar quando seu olhar cruza em direção à porta e automaticamente seu coração acelera? Isso mesmo. Ele estava lá, observando tudo, chorando. Quando ergui os olhos para evitar fazer o mesmo, vi que ele saiu correndo, como se não quisesse ser visto. Tarde demais, pois aquilo já tinha sido suficiente para destruir meu coração.

Crônicas de um casal de amigosOnde histórias criam vida. Descubra agora