1 - A viagem

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É, estou de malas prontas, passagem arrumada e roupa passada. Amanhã é pegar o avião e partir pra Portugal.

Desde que voltei para São Paulo e anunciei a data definitiva da viagem, meus pais estão ansiosos. Não que eu esteja menos, entretanto há um detalhe que não deveria me preocupar, mas que não tenho como evitar: a companhia ilustre que irá conosco. Sempre ressaltando pra minha mente que ele não é meu namorado, pra ver se resolvia o caso de inquietude da minha mente, o que no fim das contas foi em vão. Lamentável, Sabrina, lamentável.

Me deitei para dissipar tais pensamentos e descansar, até porque o dia seguinte seria longo. Pelo visto não funcionou. Só consegui dormir quando comecei a imaginar o que ele estaria fazendo ou pensando, se estava ansioso como eu.
No dia seguinte, como de costume, olho a janela e me deparo com um céu azul turquesa como jamais me lembrava, pois a capital era costumeiramente cinzenta, acompanhado de um sol brilhante e alto. Pegando o celular, percebo uma mensagem, que dizia: 

"Sá, já estou na ponte aérea, nos vemos no aeroporto daqui 2 horas". 

Espera, duas horas? Quando olhei novamente, percebi que estava atrasada, muito atrasada! Um pouco aturdida, corri para fazer as coisas que precisava, mas ainda tentando entender o que se passava, pois costumo ser pontual com meus compromissos.

Confesso que cheguei esbaforida no aeroporto, com uns fios rebeldes denunciando minha pressa. Meus pais me olhavam, atônitos, tentando entender o que se passava, mas resolveram não me dizer nada, o que agradeci profundamente, já que nem mesma eu saberia o que dizer. Já mais acomodada, olhei para o portão de desembarque. No mesmo momento uma figura intimamente familiar desfilava pelo corredor arrastando uma modesta mala executiva. Logo que me viu, abriu aquele sorriso de canto só dele. Podia jurar que pela primeira vez senti um arrepio na espinha. "Oi Sá, ansiosa?", me cumprimentou com um beijo na bochecha e logo foi cumprimentar minha mãe, sendo também apresentado ao meu pai em seguida. Mera formalidade. Cerca de 1h depois, anunciaram que o avião estava pronto para o embarque. É, aqui vamos nós.

Depois de acomodados, fomos pra filial discutir o que seria feito em terras lusas. Mencionando, claro, juntamente com o Marcos. Ele era indispensável nessa trajetória e principalmente para os fãs, nada mais natural. Para um dia, se adaptar a fuso horário, vocábulo e lugares inexploráveis é consideravelmente cansativo. Ao chegar em meu quarto, só queria ter uma longa noite de sono.

Na semana seguinte, já mais tranquila, aproveitei a folga para conhecer alguns lugares na cidade com a ajuda de um mapa. Meus pais provavelmente estavam conhecendo alguns restaurantes e adquirindo novos sabores da comida local. Marcos eu não havia visto naquele dia em especial. Me sentia revigorada, afinal, mesmo eu não estando mais em uma rotina intensa de gravações pra novela, esses extras também davam um trabalho considerável. Quando voltei, estava começando a anoitecer, com um pôr do sol de tirar o fôlego. Entrei no quarto disposta a tomar um bom banho, e assim o fiz. Logo que estava secando meus cabelos, minha mãe entra, avisando.

Mãe: Sabrina, meu anjo, se apresse, vamos jantar em um restaurante especial essa noite. Escolha do seu pai. E me faça um favor, aproveita e dá uma chamada no Marcos, ele já está sabendo. Beijos.

Nem tive tempo de contestar, nem tentar entender. Dona Sonia estava eufórica e já havia fechado a porta. Com os cabelos escovados, escolhi um look casual e confortável e saí. Como pedido, fui bater na porta do Marcos. Só me lembro de ter ouvido permissão para entrar e assim o fiz. Depois daquilo, a única coisa que eu via era algo inexplicável: ele estava com um sapatênis, calça esporte jeans e uma polo branca impecável. Já conhecia seu bom gosto para roupas, afinal foram meses convivendo juntos todos os dias, não é? Mas naquela noite tinha algo de diferente nele. Algo que eu não sabia explicar. Pela primeira vez em tempos me encontrei completamente sem palavras. O que estava acontecendo comigo, afinal?

Marcos: Oi, Sá! Nossa, tá bonita hein? Será que to à altura? - riu divertido, ajeitando o cabelo.

Acho que ele deve ter percebido que dei uma leve corada, porque ele começou a me encarar preocupado na mesma hora.

Marcos: Cê tá bem? Tá meio vermelha. Ou é coisa minha?

Pra não deixar transparecer, logo neguei e o convidei a descer comigo para encontrar meus pais que nos esperavam no saguão. Nos dirigimos ao restaurante, que tinha uma vista agradável para o rio que passava por baixo. O menu escolhido foi servido e enquanto, comíamos, uma música ao vivo se inciava. Me atonitava à graciosidade de como o improviso nas apresentações era sutilmente maravilhoso. Quando voltei o olhar para a mesa, percebi que estava sendo observada por ele. Todos nos servimos de vinho, porém meus pais se entreolharam e nos informaram que iriam se recolher. Quase cogitei fazer o mesmo, mas o lugar estava ótimo, então continuei.

Logo fui servida de mais vinho, enquanto eu e Marcos conversávamos sobre a vida, sobre os planos, enfim. Percebi que nos conhecíamos mais do que eu imaginava, afinal criamos um laço de amizade muito sólido com a convivência. Mas então por que eu tinha a impressão de que meu coração estava prestes a sair pela boca? Perdida em meus pensamentos, uma voz enfim me invadiu.

Marcos: Sá, o que acha da gente dar uma volta antes de voltar pro hotel? Pelo menos a gente dá uma forcinha pro vinho descer. - riu, tentando me fazer voltar.

Aceitei, andamos próximos ao rio, vimos um violeiro tocando algumas canções típicas, algumas outras pessoas fazendo o mesmo que nós, até que parei para olhar as estrelas. Então, no que baixei os olhos, percebi que Marcos me olhava fixamente, com um brilho diferente no olhar. Eu conhecia muito bem, mas preferi negar a mim mesma e colocar na cabeça que estava vendo coisas. Para tentar quebrar o clima que estava formando, pois quando eu percebi, eu estava ligeiramente mais perto dele, pedi para voltarmos, pois tinha sido um dia agradável, mas longo. Como cavalheiro que é, não pestanejou e me acompanhou até a porta do meu quarto. O agradeci pela noite, porém algo que eu não poderia prever aconteceu. Antes de eu me virar para fechar a porta, me despedi dele com um beijo no rosto, porém ele acabou virando o rosto e a gente acabou se beijando. Sim, aquilo tinha sido real. Logo ele desencostou seu rosto do meu, e quando ergui o rosto, ele estava corado e, com a voz embargada, me deu boa noite e saiu. E o que eu tinha feito? Fiquei na porta, tentando assimilar com o olhar perdido nas portas à minha frente.

Troquei de roupa e me deitei. Tinha perdido completamente o sono, até que meu celular começa a vibrar. Ramón. Por um momento me esqueci completamente dele, inclusive de que eu não estava usando meu anel de compromisso naquela noite. Ele estava me ligando, porém eu não conseguia responder. Eu só queria chorar. O que está acontecendo comigo? 

E essa era uma pergunta que parecia demorar a findar.

Crônicas de um casal de amigosOnde histórias criam vida. Descubra agora