EU NÃO ESTOU COM INVEJA. É o que tento me convencer enquanto olho pai e filha brincarem na parte de fora do café.
Talvez eu esteja com inveja do que eles têm. Afinal, eu já tive isso, e perdi tudo. Eu já fui genuinamente feliz, era o tipo de pessoa que dava risadas olhando para o céu enquanto pensava na sorte que tinha. Hoje, meus sorrisos não são verdadeiros. Mas eu continuo a sorrir.
Provavelmente porque eu sei que pessoas se sentem desconfortáveis perto de pessoas tristes, e apesar de não estar bem, não quero que pessoas boas sintam o mesmo. Então eu finjo. E depois de tanto tempo fingindo é quase como se eu não soubesse mais como sorrir, muito menos como dar uma risada.
Do balcão onde estou tenho uma visão perfeita dos dois nas mesas da rua da loja, não posso ver seus rostos já que eles estão de costas, mas sei que estão rindo. Consigo ver seus peitos se mexendo de acordo com o ritmo de uma risada. Eles são felizes.
E de algum jeito estranho, é como se isso bastasse para me acalmar.
Eles são felizes.
O Lucy's, café onde trabalho, é relativamente pequeno, mas bastante aconchegante. É um bom refugio do frio, aqui dentro é quente e cheiroso, um cheiro que lembra família, a canela dos bolinhos e de alguns cafés, o chocolate dos doces que são feitos na hora e estão sempre quentinhos.
As paredes são claras e as mesas bem distribuídas, prateleiras com especiarias em potinhos de vidros são espalhados pelas paredes dando um certo contraste, já que tem uma cor de madeira, mas o detalhe que eu mais gosto é a parede de vidro principal, a que permite a vista para a rua.
Que hoje, agora, me permite ver mais que só a rua.
Aurora olha para trás e sorri para mim, que respondo com um aceno para a menina de cabelos dourados. Ela pula do colo do pai e abre a porta de entrada do café, deixando o ar frio da rua entrar, vejo a criança respirar fundo absorvendo o cheiro de chocolate, um pouco de canela, e é claro café.
A garotinha corre em minha direção sorrindo —ela está sempre sorrindo— e sobe no banquinho se sentando em minha frente, abaixo levemente meu corpo para igualar nossas alturas.
— Aqui cheira gostoso Daisy. — ela diz com sua voz suave e delicada.
— Concordo princesa. — dou um beijo molhado e barulhento em sua bochecha e me viro para o cliente que me chama.
Enquanto preparo seu pedido, vejo Aurora olhando para tudo encantada.
— Quer fazer um cappuccino para seu pai? — pergunto e assisto seu sorriso triplicar de tamanho.
— Quero! Quero! Quero! Eba! — ela bate as mãos uma na outra animada.
Ela fica em pé no banquinho e eu a seguro passando a loirinha por cima do balcão, trazendo-a para meu lado.
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O Frio Do Inverno
Dragoste"Espero que você ache a felicidade que vem fingindo ter" Ela não sabe viver, sobrevive e respira dia a dia, mas não vive. Recém-chegada na cidade, sem dinheiro ou esperanças, Daisy arranja multiplos empregos e mesmo assim ela não tem dinheiro para s...