Lar doce Lar?

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  Quando nós chegamos em Mitchell, o clima começou a dar uma virada. O vento passava com velocidade pela grama rasteira da estrada, com um barulho irritantemente chato.
Eu estava seguindo Maggie, com um certo receio do lugar que ela nos levava.
Uma vez ou outra eu esticava o pescoço, só pra olhar no GPS do carro dela. Sem nem olhar no GPS, eu sabia claramente que aquele caminho não era conhecido.
-Ou - falei, botando a mão pra trás e cutucando a perna de Ashley, que acariciava a cabeça de Lily, que estava deitada em seu colo - Essa rota não tá no GPS...
-E você lá tá com GPS aqui, maluca? - riu ela, balançando a cabeça.
-To olhando no da sua tia, sem graça - falei, com os olhos fixos na estrada, que começava a ser de terra.
Vi, pelo retrovisor, os olhos de Ashley se arregalarem levemente, e ela falou, com a voz aguda:
-Você não tem problema de visão, Teri?
Franzi as sobrancelhas, assentindo.
Era verdade, afinal de contas, eu estava de lente...
-E como tá conseguindo ver uma coisa que nem eu consigo? - perguntou, confusa.
-Hum... - falei, procurando as palavras para uma explicação, mas não vieram, porque nem eu sabia.,
Lily levantou a cabeça, olhando para mim pelo retrovisor.
-Visão, visão aguçada - ela falou, tocando nos próprios olhos, depois, levantou o dedo indicador - Estamos perto...
Perto? Perto de que?
Espera! Visão aguçada? Será que era o meu poder? Que?
Voltei a atenção para o caminho, diminuindo a velocidade, como Maggie.
A gente tava chegando a algum lugar, parecia, sei lá, a entrada de uma fábrica, com chancela e tudo.
Maggie parou o carro e desceu dele, se aproximando do nosso.
Parei o carro também e abri a janela, sorrindo para a morena de olhos azuis em minha frente.
-Chegamos meninas - falou, enfiando a cabeça pra dentro - Vou falar com o Liam e já venho.
Ela se distanciou, indo até a guarita, onde um homem de cabelos grisalhos abria um sorriso, saindo de lá para vê-la melhor.
-Sua tia costuma fazer amizade com os porteiros? - perguntei, analisando o local minuciosamente, era um bom lugar para um portal, bem afastado de tudo...
Ash estava atordoada, a boca em formato de "o" já dizia isso.
-Ash, calma - falei, desprendendo o cinto de segurança e me virando pra ela.
Eu abri a boca pra falar mais coisa, mas não saiu nada, era melhor só deixar aquelas duas palavras no ar mesmo. Ela não ia me ouvir, conhecia ela o suficiente pra saber disso.
Lá fora, Maggie e o tal Liam se abraçavam, como velhos amigos se reencontrando. Talvez fosse isso mesmo.
-Hum... Não sei vocês, mas eu to querendo esticar as pernas - sorriu Ash, voltando à si e abrindo a porta do carro - Vamos?
Relaxei os ombros e saí do carro também, pisando na terra e arrumando minha calça.
Lily saiu do carro, depois que Ash abriu a porta pra ela.
A magia concentrada naquele lugar era bem notável, a atmosfera estava diferente, como se, ali, os tais poderes ficassem mais aguçados. Devia ser por isso que a minha lente estava me incomodando, porque, num mundo mágico, eu tinha a visão perfeita.

***

-Então o carro não vai sofrer danos? - perguntou Maggie, apontando os carros para Liam, que assentiu, trancando a guarita.

-Podem me seguindo que eu já mando vocês pra Dimensão das Trevas - falou, se sentando na moto preta, do lado de lá da chancela.
O nome da dimensão era de dar um frio na espinha, lembrava vagamente o inferno, mas acho que no inferno não tem um orfanato para crianças poderosas.
Ash entrou no carro com Lily novamente e eu me aproximei de Maggie.
-Tem certeza de que isso é seguro? - Sussurrei - Quer dizer, Dimensão das trevas, né? Parece, sei lá, inferno, trevas, submundo...
Maggie soltou uma risada leve e balançou a cabeça.
-Pode ficar tranquila, Teri, não tô embarcando vocês pro inferno, é só o nome mesmo.
Algo na fala dela ficou vago, como se Maggie escondesse algum detalhe importante, ou não quisesse que nós soubéssemos de alguma coisa.
Isso me deixou meio intrigada, mas fazer o que.
Entrei no carro, o ligando novamente.
Liam abriu a chancela para nós e foi indo, pela ruazinha escura com sua moto barulhenta.
Continuei os seguindo, tendo alguns vislumbres de árvores altas lá na frente, do tipo que não se vê na estrada, só em filmes que se passam em florestas bonitas e, enfim, árvores meio estranhas.
Lá estava incrivelmente escuro, comparado ao restante da estrada, onde estava ventando, mas a luz do dia reinava ainda.
Liam parou a moto, bem no meio das árvores, onde descia uma rampa de cimento, coisa nova de se ver no meio de uma floresta.
-Liguem os faróis do carro - pediu ele, ligando o da moto - Vou só deixar o caminho certo e vocês continuam sozinhas.
No carro, Ash estava com as pernas pra cima do banco, com Lily segurando firme em seu braço.
-Tudo certo aí atrás? - Perguntei, enquanto estávamos esperando Liam voltar pra cima.
-Aham - murmurou a morena, dobrando os lábios - Tudo ótimo!
Ri fraco, do nervosismo quase palpável dela. O de Lily estava estampado em sua testa, quase escrito em néon num letreiro escuro.
Parecia realmente coisa de filme, se fosse assim, eu sabia exatamente o que íamos encontrar lá em baixo.
-Calma gente, vai dar tudo certo - falei, erguendo a cabeça.
Era bem típico meu. Eu podia não saber o que ia acontecer, mas queria assegurar quem eu amava que não ia ser ruim. Era como o meu dever passar confiança pra todo mundo, e eu acabava tendo ela de sobra. Não sei se também se confundia com otimismo, porque eu sempre me julguei bem pé no chão...
Liam subiu a rampa com a moto, com uma ruguinha estampada no meio de suas sobrancelhas. Aquele velho tava escondendo alguma coisa.
Quem dera ter a audição apurada, assim eu ia ouvir tudo o que ele tava falando pra Maggie, pela janela do carro.
Depois de bater um papo com ela ele veio até nos.
-Se segurem, e que a magia as proteja - falou, dando um sorriso confortante, com os dentes meio tortos.
Acho que ver demais não tava sendo bom pra mim.
"Magia", a palavra já tava até soando familiar no ouvido. Nos últimos dias, tinha ouvido tanto falar nela! Era como uma prima distante, que sempre esteve ali, mas ninguém nunca havia notado.
O carro de Maggie começou a descer a rampa, e eu fui atrás.
Eu sempre gostei de livros de ficção, desses com portais e magia, mas nunca imaginei que isso fosse acontecer comigo.
O portal era roxo, um roxo bem berrante e brilhante, dava pra cegar alguém com aquilo! Era algo que eu nunca nem tinha sonhado em ver, cara! Incrível é bem pouco pra resumir aquilo!
O frio na barriga aumentou ao passar pelo portal, onde eu, instintivamente e impulsivamente, fechei os olhos e segurei bem firme no volante.
Eu nem lembrei de olhar se a Ash e a Lily estavam bem... Na hora H, dá nem pra pensar direito...
Fora a chacoalhada monstra no carro, foi como atravessar um túnel. Ou melhor, uma montanha russa. Aquela adrenalina que faz seus cabelos voarem, sabe? Era exatamente aquilo que acontecia.
Depois de passarmos pelo portal, abri os olhos, sentindo a atmosfera mais leve.
O dia lá fora estava ensolarado, mas muito diferente do "outro lado".
-Vocês estão bem? - Perguntei, me virando para trás.
Lily estava com a cabeça escondida nos braços de Ash, que estava com a cabeça inclinada pra frente.
-Ahn? Já chegamos? - Perguntou Ash, voltando à posição normal.
-Bom, isso não parece nem um pouco com o nosso mundo, então acho que sim... Porém, não vejo nenhum orfanato por aqui.
Lá fora, estávamos numa floresta muito colorida. A maioria das árvores altas eram vermelhas, as normais eram amarelas ou azuis e uma ou outra era de um roxo bem forte.
-Que coisa linda - sussurrou Ash, com o nariz grudado na janela.
Os pássaros eram bem animados, cantavam alegremente, dava pra ver alguns ninhos nas copas das árvores vermelhas, um deles tinha alguns ovos de diversas cores.
Inapropriado, mas será que os passarinhos eram gays? Ué, o ovo era coloridinho, por quê não?
O carro de Maggie estava parado fazia um tempo, eu já tava ficando impaciente.
-Vou ver se sua tia tá viva - falei, saindo do carro.
Me estiquei, endireitando o corpo e afundando os pés na grama fofa e azul clara.
Era tudo tão vivo, sei lá! Será que era efeito da magia? Será que ela fazia as coisas ficarem vivas?
Andei devagar, tomando cuidado pra minha bota não atolar, tipo em trilha, e fui até o carro de Maggie.
Ela estava virando uma lata de energético, com a cabeça virada para trás.
Bati no vidro dela, dando um susto nela.
-Tá em choque, é? - Perguntei, rindo.
Ela abriu a porta do carro, me estendendo a lata.
-Hello - falou, sorrindo fraco - Ainda se habituando ao local?
Abri a porta do banco de trás, me sentando com as pernas pra fora e abrindo a lata, ouvindo o simpático barulhinho do gás saindo da bebida.
-Ah - dei de ombros - Sim, né? Aqui é bem mais colorido... Tipo, eu nunca tinha visto árvores roxas ou vermelhas... - Ri fraco - Acho que um dia acostumo.
Ela sorriu e eu encarei a latinha, dando uma golada na bebida fresca.
-Estava com saudades daqui - falou ela, olhando para o nada - Desde que Ash nasceu, praticamente.
Sorri fraco, encarando uma flor que acendia em várias cores.
"Vermelho, azul, amarelo, verde, laranja, vermelho".
-Deve ser legal viver num lugar onde as flores mudam de cor - brinquei, tomando mais um gole do energético.
Passei a mão nos cabelos, dobrando os lábios.
-Acho que precisamos ir - ela falou, jogando a latinha vazia dentro da caixa térmica.
Assenti, saindo do carro e fechando a porta.
-Dezessete crianças, hein? - ri fraco, depositando um beijo em sua testa - Precisaremos de boas doses desses energéticos!
Ela riu e eu fechei a porta dela também, sorrindo e voltando para o carro.
Ash tinha ido para o banco da frente e tentava sincronizar a alguma rádio, mas, pelo jeito, não funcionava.
-Cabeçuda, outra dimensão lembra? - ri alto, sentando ao lado de Lily, que estava com a cabeça entre o banco do motorista e do passageiro - Já que você já tá ai na frente, dirige até o orfanato, vai!
Ela riu alto, fechando a porta e colocando o cinto.
-Só se você me der um gole do energético - falou, colocando a mão para trás.
-Já pressentia isso - resmunguei, dando a lata na mão dela.
Lily colocou a cabeça pra trás, encostando no banco e virando para mim.
-E lá vamos nós! - cantarolei, rindo fraco.***Enorme.
Eu nunca tinha visto um orfanato tão grande! Talvez porque eu estivesse acostumada com alguns abrigos de crianças, onde 50 delas tinham que se espremer em dois quartos.
Eram muitas janelas, com dois andares, pelo que pareceu, e a entrada era lindíssima! O jardim então, nem se fala!
-Meu Deus - Ash sussurrou, debruçando no volante para ver melhor - É muito grande!
Assenti, abrindo a janela e colocando a cabeça pra fora, como um Golden Retriever, para ver mais pra cima.
-Minha Nossa Senhora da casa grande, que que é isso? - Falei, balançando a cabeça.
Era praticamente uma mansão, aliás, a maioria das casas pelas quais havíamos passado eram assim.
Tudo era mais colorido, mais alegre e com um quê de elegância aqui. O nome era Dimensão das Trevas, mas de trevas eu ainda não tinha visto nada "trevoso".
Maggie parou o carro na frente da grande casa, num tipo de estradinha de pedras, própria para estacionar carros.
Ash fez o mesmo, tirando o cinto e olhando para mim e para Lily, dobrando os lábios.
-Isso é um palácio, não um orfanato - falou, se virando para frente de novo, onde Maggie se esticava, com a porta do carro escancarada.
Mordi o canto do meu lábio, abrindo a porta devagar e observando a casa minuciosamente.
Era grande. Muito grande. A janela maior dava para um escritório, preto e branco, as menores eram quartos, todas abertas, permitindo que o vento batesse nas cortinas de cor neutra.
-É ótimo ter boa visão - ri fraco, sentindo o vento bater de leve em meus cabelos.
Lily saiu do carro também, virando a cabeça pra todos os lados, se habituando ao local colorido.
A casa, em si, era branca, sem aquele arco-íris que era o jardim, com as cores exóticas e flores que acendiam. Na verdade, era semelhante à uma casa grande da nossa dimensão, só que com um aspecto mais... Vitoriano.
Lily ergueu a cabeça pra mim, com o olhar curioso e um leve sorriso brincando em seus lábios finos.
-Lar doce lar? - Perguntou ela, com a voz até que mais forte e menos lenta.
Será que seus poderes atiçados a deixavam mais espertinha?
-Pode ser... - Sorri de canto - Quer entrar pra ver?
Ela assentiu, entrando no carro e pegando minha mochila.
Ash ainda estava dentro do carro, tentando desprender a mochila, que havia enroscado no cinto.
-Droga - a morena murmurou, enquanto eu abria a porta do lado dela - Me ajuda!
Ri fraco, contornando o carro e abrindo a outra porta, me esticando no banco.
-Usar a cabeça que é bom, né? - Brinquei, desprendendo a mochila dela.
-Por que você parece fazer tudo parecer fácil? - Resmungou ela, jogando a mochila pra mim, sorrindo de canto - Parece que é hora de rever as tias...
Ri fraco, voltando para o lado de Lily, observando Maggie tirar a sacola de doces do carro dela. Ué, de onde ela tinha tirado aquilo?
Enfim, Ash saiu do carro, fechando a porta com um chute. Ela era delicada como uma retroescavadeira.
Joguei a mochila de gatinho na direção dela, que pegou, num ato reflexo.
Ela saiu do carro, se esticando, foi com tanta vontade, que os ossos dela estalaram. Doeu até em mim!
Ela olhou pra mim, eu olhei pra ela, Maggie se aproximou de nós e Lily inclinou a cabeça. Nós quatro encaramos a casa e suspiramos, ao mesmo tempo.
-Chegou a hora... - minha amiga sorriu fraco, dobrando os lábios.
-Pois é - concordei, pegando a mão de Lily e a de Ash.
Eu encarei a casa mais uma vez. Dessa vez, um rostinho branco, de uma menina com cabelos dourados, presos em uma trança de lado, nos observava também.
-Vamos lá... - riu Maggie, dando a mão para Ash também.
O rosto da menina já não estava mais lá, deveria ter descido para a entrada. Bom, pelo menos era o que eu faria...
Andamos devagar, pelo gramado verde (primeira cor de folha que eu já tinha visto em Deadwood), em direção ao casarão, parando em frente à ele.
De perto, devia dar umas trocentas de mim.
Nenhuma de nós queria tocar a campainha. Então, eu fiz as honras, precisava entrar num lugar menos colorido, ouvindo o barulho mais escandaloso que uma campainha podia fazer.
O som que eu estava ouvindo era o da mudança batendo na porta, seriam muitas malas pra levar pra dentro...   

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Vamos começar deixando bem claro que já faz um ano que eu não apareço por aqui e eu realmente não consigo achar um motivo melhor do que: Eu mudei demais.

Sim, gente, se eu pudesse explicar a mudança, eu explicaria, porém isso está além da minha capacidade, eu só sei que foi uma coisa incrível mudar desse jeito.

Eu não consigo mais escrever a fic como antes, fiquei muito tempo sem tocar nela e parece um bloqueio. Eu prometo tentar de novo, mas não sei o que vai sair, minhas perspectivas mudaram COMPLETAMENTE e eu não sei se vocês que buscam fics como essa vão gostar dessas novas perspectivas.

Bom, eu pretendo postar o que eu tenho. Não vou prometer nada pra vocês, porque a vida anda corrida e eu não faço a minima ideia do que pode acontecer.

Beijinhos de luz pra vocês! 

Com amor, Tia Laly.



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