Visita...

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Quero uma vida onde a morte não me surpreenda.

E quando ela riscar no calendário o dia de me fazer uma visita.

Estarei sentada na velha poltrona de couro corroída pelo tempo.

Não poderei abrir a porta.

Mas sei que ela também não será educada e entrará sem bater.

Irei lhe oferecer biscoitos.

Como uma forma de distraí-la.

Sutilmente ela irá recusar.

Caminharei pelos cômodos sentindo o âroma de cada lembrança me arrancando suspiros.

Não posso esquecer do antigo quarto da bagunça.

Eu sei que deveria ter mandado pintar.

Sabia que estava me esquecendo de alguma coisa.

A ponta dos meus dedos já enrugados e quase sem digitais, tocará a parede descascada.

Contornarei cada sonho rabiscado na tinta azul.

Sonhos tão sonhados.

Alguns realizados, e outros simplesmente esquecidos em alguma gaveta.

Um sorriso rasgará os meus lábios ao entrar no último espaço.

Dormindo na cama espaçosa, está meu sonho mais bem planejado.

A nostalgia irá invadir o ambiente, me envolvendo em uma linha do tempo.

Com cuidado para não acordá-la me sentarei ao seu lado.

Colocarei uma mecha do seu cabelo castanho atrás da orelha.

Para que eu possa gravar cada detalhe do seu rosto.

Minhas palavras sussarradas em seu ouvido declamando todo meu amor.

Deixarei meu último conselho.

Certifique-se de todas as noites de refletir sobre o que tem feito.

Se estiver orgulhosa de tudo que fez até aqui, tenha bons sonhos.

Mas se o orgulho não te acompanhar.

Acho melhor fazer alguma coisa pra mudar isso antes de fechar os olhos.

A voz da visita indesejada anuncia que o badalo da última hora tocou.

- Está pronta?

- Nunca estamos...


NOTAS FINAIS

Esse poema foi selecionado e faz parte da Antologia Poética do Concurso Nacional Novos Poetas - Sarau Brasil 2017.

A Chuva Me Viu ChorandoOnde histórias criam vida. Descubra agora