Prólogo

100 3 0
                                    

            28/08/2014
Valentina narrando...

  Acordo com os raios de sol entrando pela janela,dou uma olhada no relógio e corro para tomar um banho. Optei por usar um vestido simples e floral,sapatilhas e uma make leve. Estou tão animada,eu e minha mãe teremos um dia só pra gente,faz muito tempo que não passamos uma tarde juntas e essa é a oportunidade perfeita.Termino de arrumar o cabelo quando minha mãe entra no quarto.

-Bom dia!- Diz dando um beijo em minha testa- Vejo que acordou cedo hoje, também estou animada,mas você não acha que é um pouco cedo demais  pra se arrumar,só vamos sair daqui a meia hora.- Ela diz olhando as horas no despertador.

- Achei melhor acordar cedo pra não correr o risco de se atrasar- Digo,olhando no espelho- E você dona Mirela,não vai se arrumar?- Digo tentando imitá-la e ela ri.

-Tô indo,e enquanto isso você toma seu café da manhã.-Ela sai do quarto e eu vou tomar meu café,pego o celular e fico mexendo até minha mãe me chamar,entro no carro e vamos para o shopping.

   Ficamos passeando,compramos algumas roupas,acessórios,sapatos e um perfume para o meu pai. Vamos a praça de alimentação,sentamos com uma quantidade absurda de sacolas em uma mesa próxima a uma pilastra,pedimos lanches e refrigerantes, comemos e voltamos a andar pelo shopping. Passamos próximo a sala de cinema e minha mãe fica enlouquecida com um filme de comédia romântica,choramos e rimos o filme inteiro. Estou me divertindo muito,quero passar mais tempo com minha mãe,mas esta parece não ter os mesmos planos.

-Tina,acho melhor a gente ir embora- Ela fala olhando uma mensagem no celular,provavelmente meu pai deve estar chamando.

-Não,por favor.Está tão legal,vamos ficar um pouco mais- Falo com cara de choro,mas ela não se convence.

-Vamos logo,já ficamos bastante tempo aqui- Ela fala guardando o celular e ajeitando as sacolas em seus braços.

-Tá bom.- Digo indo brava em direção ao carro e ela vem põe as sacolas no banco de trás e vamos embora. Ficamos até a metade do caminho em silêncio,até ela o quebrar.

-Por que você tá assim? Não viemos no shopping juntas? Não foi isso o que você me pediu?- Ela diz sem tirar os olhos da estrada.

-POR QUE EU TÔ ASSIM? DEVE SER POR EU VIVO TE PEDINDO PRA FICARMOS UM TEMPO JUNTAS E SÓ AGORA QUE VOCÊ CONSEGUE UM TEMPINHO, TEMOS QUE VOLTAR PRA CASA PRA ATENDER AOS CAPRICHOS DO PAPAI.-  Grito e ela olha pra mim com raiva.

-EU JÁ FIZ O QUE VOCÊ QUERIA, VOCÊ TÁ CANSADA DE SABER QUE EU NÃO TENHO TEMPO,PORQUE ESTOU TRABALHANDO. PARE DE SER EGOÍSTA E PENSE UM POUCO- Uma lágrima solitária escorre pelo meu rosto enquanto ela grita comigo. Eu só queria um tempo,não sou egoísta. Ela estava olhando pra mim com raiva quando de repente nosso carro é acertado por um caminhão,não temos nem tempo de reagir,é tudo muito rápido. Olho para o lado e vejo minha mãe com as roupas ensanguentadas e tento ajudá-la,mas sinto um ardor terrível no corpo, vejo que também me machuquei,continuo tentando me levantar inúmeras vezes mas não consigo,sinto meus olhos pesarem e minha visão ficar turva,ouço apenas o som de sineres e desmaio.

4 dias depois...

  Acordo num quarto branco sozinha,olho em volta e sinto uma certa dificuldade em me movimentar e automaticamente me lembro do acidente. Devo estar no hospital.Como será que minha mãe está? Fico presa em meus pensamentos quando um médico entra no quarto acompanhado de meu pai,com um semblante muito triste.

- Filha,que bom que acordou.- Tentou forçar um sorriso mais foi em vão- Esse é o doutor Felipe,ele vai te examinar enquanto eu resolvo algumas coisas,tá bom?- Ele me da um beijo na testa e sai apressado,me deixando sozinha com o doutor. Felipe é muito bonito,mas tem em seu rosto além de tristeza um cansasso palpável.

-Que bom acordou,já estávamos ficando preocupados com você,pequeno milagre.- Ele diz com ternura e se aproxima para me examinar.

-Quanto tempo eu fiquei dormindo?- Pergunto pensando que seria no máximo 12 horas.

-Quase quatro dias.- Responde com um mescla de tranquilidade e preocupação,sem parar de examinar minhas feridas.- Você é uma garota de muita sorte,pequeno milagre. Tenho certeza que você vai se recuperar logo e...Superar.

-Por que você fica me chamando de pequeno milagre? -Sinto meu coração apertar e minha respiração ficar descompassada- O que você quer dizer com superar?

-O fato de estar viva já é um milagre,o acidente foi muito feio e você poderia não ter sobrevivido. Deus te salvou,permitiu que você vivesse.- Meu coração ficou mais acelerado ainda,se o acidente foi tão feio assim,minha mãe deve estar muito mal,não posso deixá-la sozinha agora.

-Felipe,onde minha mãe está internada?Como ela está?- Sinto uma angústia invadir meu coração- Ela tá bem,né?- Seu semblante fica triste e ele responde com cautela.

-Valentina,sua mãe...-Meus olhos se enchem de lágrimas,tento contê-las mas é quase impossível- Quando os paramédicos chegaram ao local do acidente você e sua mãe já estavam desacordadas,ela perdeu muito sangue,tentamos submetê-la a uma transfusão...Ela lutou pra reagir,mas não conseguiu. Sua mãe faleceu.

  Quando ouvi aquilo sair de forma tão clara da boca de Felipe meu coração quase parou. Minha mãe está morta. Fiquei sem ar,era uma dor imensa,não importava o quanto eu chorava ou gritava,era como se tivessem arrancado uma parte minha,era uma dor tão insuportável,eu tentava parar e tentava tomar fôlego,mas não conseguia. Felipe me abraçou forte e por pouco segundos ele conseguiu me conter. Chorei até que não houvesse em meu corpo uma só gota de água,fiquei tão exausta que acabei dormindo chorando.

  Uma semana se passou,meus dias foram cheios de dor,de saudade e de solidão. Meu pai vinha me visitar duas vezes ao dia,sempre que o via ele estava pior,olheiras enormes e escuras,desarrumado e às vezes com cheiro de bebida. Recebi alta e meu pai foi me buscar,já me sentia melhor fisicamente,mas emocionalmente estava cada dia pior. Quando cheguei em minha casa percebi que não era a única,a casa estava toda desarrumada,havia copos e garrafas de gim,rum e whisky todas vazias,cacos de vidros e em cima da mesinha de centro havia uma foto de minha mãe molhada com as lágrimas do meu pai. Meu pai me ajudou a ir para o quarto,puxou uma cadeira e sentou-se à minha frente.

-Tina,eu...Sei que nunca fui um bom pai,mas eu vou cuidar de você,vou estar ao seu lado...-Ele começou a chorar,era raro demonstrações de sentimentos vindas do meu pai,mas desta vez não tinha como se segurar- Eu sei que ela faz falta,mas eu estou aqui.- Levantei e o abracei com toda a força que tive,quis poder transmitir paz,mesmo que não tivesse- Eu vou comprar os remédios que o médico receitou e alguma coisa pra você comer. Já volto.- Ele se levanta,me dá um beijo na testa e sai secando as lágrimas.

   Enquanto ele ia comprar os remédios que Felipe receitou, me levantei e tentei arrumar as coisas,meu pai não estava bem e mesmo que eu não tivesse totalmente recuperada decidi que o melhor seria por as coisas em ordem. Enquanto jogava o lixo e limpava a sala,vi uma garrafa de rum pela metade,sabia que não devia tomar,mas era como se fosse puxada pelo desejo de me libertar dessa dor. Bebi um gole,depois outro e quando vi a dor que me tortura havia sumido.Se esse era o preço da paz,eu estava disposta a pagar.

A doida e o religioso Onde histórias criam vida. Descubra agora