Tudo entre começo e fim

3. Amora

"E quem um dia irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo coração, e quem irá dizer que não existe razão?"
- Eduardo e Mônica (Legião Urbana)

                                                                   Amora

- Bem vindo ao Denny's - eu disse a Austin. Era "apenas" uma lanchonete inspirada nos anos 80. Apenas entre muitas aspas, já que é o melhor lugar da cidade para viajar no tempo com um velho genial, o próprio Denny, e a melhor pizza do Texas.

Vou ao Denny's desde antes de aprender a ler, aquelas mesas são tão familiares para mim quando minha própria casa. Os jogos de fliperama e o karaokê me salvaram de onze anos de puro tédio.

- Sério? Nunca imaginei que você gostaria de um lugar como esse. - disse Austin, em um tom sarcástico.

- Cala a boca e aprecie a vista, Austin.

- Chega, vou ficar com mais rugas que Ams. Brigaram o caminho todo - interviu Ashley.

- Não tenho rugas. Minha velhice é espiritual.

Enquanto discutiamos, Denny, se aproximou.

- Boa tarde, moças. Vejo que tem companhia - disse ele, com um ligeiro sotaque galês. Denny e os pais viviam em uma casa de campo em Galês, até que ele completou dezoito anos e decidiu explorar o mundo em uma aventura. Nunca entendi porque escolheu ficar em Austin, mas o importante é que tínhamos ele e seu sobrinho, nosso melhor amigo e mascote, Temaki. Nomes de comidas são comuns na minha vida.

- Esse é Austin de Brigton, Denny. Esse é Denny de Galês, Austin. - apresentei.

- Prazer, senhor.

- Senhor? Tenho cara de velho? Me chame de Denny e, tinha me esquecido do quão bonito nosso é. Passei alguns dias em Brigton, há muito tempo, me lembro do píer. Lindo lugar.

- Realmente, Denny. Mal cheguei aqui e já sinto falta.

- Te digo uma coisa, menino, a saudade não diminui com o tempo, parece até criar raízes no seu peito, nunca te abandona.

- Muito sábio e filosófico, mas não quero ouvir mais nada. Estou com fome - disse Ash enquanto ocupava um lugar na mesa de canto na qual sempre nos sentavamos.

- Eu também, os cavalheiros podem conversar depois, muito obrigada. Quero pizza - eu disse me juntando a ela.

- Aceitamos o que a moça quiser, certo, Ashley? - respondeu Austin.

- Sempre.

Comemos nossa pizza ao som de "All Apologies", com Ash reclamando de como "About A Girl" é melhor em todos os sentidos. Mas eu não estava realmente ouvindo, só conseguia pensar em como aquele garoto irritante chegou do nada e ficaria o ano todo conosco. Era uma grande mudança, e eu não gostava disso. Mas poderia aprender a lidar com ela.

***

- Você vai dormir na minha casa. Sem discussão, só estou avisando.

- Por que? Acho que se Emma me ver lá de novo, ela vai chamar uma agente social e dizer que eu moro na rua.

- Porque faltam dois dias pras aulas voltarem. O verão chegou ao fim, minha cara. E ela vai deixar. Emma te adora.

- Que seja. Vou passar em casa, preciso de roupas.

Deixei Ashley e Austin esperando no carro e entrei em casa, ouvi meus pais conversando na cozinha e percebi que deveria mesmo sair. Eles não começariam a gritar ou algo assim, mas quando abrissem o vinho, seria melhor não estar ali.

Peguei minha mochila e coloquei o que precisava, então desci para a cozinha e disse:

- Vou dormir na Ash. Preparei um discurso de uma hora sobre meus motivos dessa vez e posso fazer uma apresentação de slides, mas isso só vai fazer vocês atrasarem o jantar.

- Tudo bem, quando volta?

- Quando acordar, então depois das três da tarde, provavelmente.

- Emma e Spence estão lá?

- A senhora fala como se elas fossem nos deixar sozinhas.

- Deixaram uma vez e vocês destruíram a cozinha.

- Comida a mais nunca fez mal a ninguém.

- Não quando está nas paredes. - interviu meu pai. Edward Rosier, engenheiro e músico nas horas vagas, mas seu maior feito foi ser notado por uma universitária bonita e muito exigente, quando tinha apenas dezesseis anos. Edward e Mônica, é tanta coincidência que parece destino.

- Estou saindo.

- Boa noite, querida - disse minha mãe.

- Boa noite, Amora - disse meu pai.

- Boa noite.