Cap.2 - A ponte (Eunwoo)

42 7 5
                                    


Eu estava deitado em minha cama, ouvindo música no escuro enquanto encarava o teto e tentava entender como andavam as coisas entre eu e Julieta. Me levantei e fui em direção a janela e pude vê-la saindo de casa. Acho que ela não esperava que eu estivesse olhando por lá e nem que a veria saindo. Mesmo sem ser possível enxergar do andar de cima pude saber que o que ela secava com o tecido de sua roupa eram suas lágrimas. Eu a conhecia bem demais, ela sempre fazia isso de um jeitinho desengonçado quando não queria ser vista chorando.

Aquilo me deixou preocupado. Tinha quase certeza que a garota estava me evitando na hora da saída. Nós sempre voltamos juntos, sem exceções. Mesmo quando um de nós está mal por alguma razão, nos encontramos e voltamos juntos, depois de chegar em casa a gente conversa, contando tudo, sem segredos. Quando a situação é mais séria e nós não queremos compartilhar com os demais amigos da casa temos um local pra onde costumamos ir. A velha ponte do parque.  É um lugar abandonando de um parque, que fica um pouco afastado da nossa casa. Nós o descobrimos enquanto caminhávamos pelo lugar. A gente sempre ia pra lá quando nos sentíamos muito mal. Nem sempre chegávamos juntos, mas sempre saíamos de lá lado a lado. Eu ainda me lembro da primeira vez que ela foi pro local sozinha, depois de ser incomodada por algumas meninas do colégio por ter uma aparência diferente.

*Flashback On*

Ela estava 17 e eu com 18 anos e morávamos na mesma casa, ela estava no último ano do ensino médio. Julieta era aluna de um programa de intercambio e, por isso, morava na minha casa desde os seus 15 anos. Minha mãe é apaixonada por ela, sempre tratou Ju como uma filha, já que sempre quis uma. Somos muito próximos, ela foi a primeira menina com quem conversei de verdade e eu fui seu primeiro amigo quando ela chegou do Brasil. Tudo que eu e minha família queríamos era que ela permanecesse aqui na Coréia, por isso eu tentava ajudar ela nos estudos, por mais que não precisasse. Afinal de contas, não é à toa que ela está aqui. Julieta passou em primeiro lugar na prova do intercambio. Por mais que sua família não admitisse na frequência que a garota merecesse, ela era fonte de grande orgulho pra eles.

Julieta é do tipo de menina que gosta de se mostrar sempre forte e alegre, seu sorriso é sua marca registrada, parece brilhar como o Sol. Por isso, quando vi que ela estava cabisbaixa ao dizer que iria dar uma volta eu já sabia que alguma coisa estava errada. Segui meus instintos e fui até aquela ponte velha da qual ela havia gostado tanto. De acordo com a garota, o local era poético, uma solução para um problema que fora esquecida e abandonada. Ela dizia ver algo profundo nisso e eu apenas ria de minha amiga com pinta de escritora. Quando cheguei ao local, a vi sentada na beirada da ponte com suas pernas encaixadas no vão entre o chão da mesma e a primeira barra de segurança, balançando vagarosamente, enquanto isso sua cabeça se encontrava sobre seus braços, que estavam apoiados na segunda barra de segurança da ponte. Ao seu lado vi que havia uma latinha de seu refrigerante favorito, não sabia como ela gostava daquilo, era uma bebida de blueberry, extremamente doce. Ela dizia que o gosto e a cor eram exóticos, assim como ela, e eu gostava disso.

Depois de observá-la por um tempo decidi ir falar com a menina. Ela parecia tão frágil, tão diferente daquela menina a qual eu estava habituado, que quis colocá-la em meus braços, acariciar seus cabelos meio rebeldes, beijar-lhe a testa e dizer que tudo ficaria bem, mas não o fiz. Sentei-me ao lado de minha amiga e ouvi a mesma suspirar. Decidi, então, me pronunciar.

-Não faz o seu tipo ficar cabisbaixa, suspirando e afogando as mágoas em refrigerantes azuis.

Dito isso fiquei aguardando sua fala, mas ela não veio. Ao invés da resposta rápida e cheia de humor costumeira a menina soltou um muxoxo e não aguentou mais se segurar, se desfez em lágrimas na minha frente. Eu não soube como reagir, apenas retornei ao meu desejo anterior, vendo a fragilidade emocional na qual Julieta se encontrava, normalmente ela era tão forte. Senti-me na obrigação de negar a reputação de cara frio que eu gostava de sustentar e lhe consolar. E foi o que fiz, abracei a menina com força e afaguei os seus cabelos, no mais desajeitado cafuné do mundo. Enquanto ela chorava eu pensava em uma maneira de melhorar o seu humor e lhe mostrar que estava ali pra sempre ajudar ela. Quando vi que seus soluços diminuíram resolvi falar.

-Está vendo essa pilastrinhas de madeira que tem nessa ponte?- Ela apenas assentiu então continuei.

-Sempre que um de nós se sentir mal e vier pra cá nós vamos fazer um tracinho na horizontal e vamos colocar a nossa inicial do lado, assim. - Mostrei pra ela como era, pegando minhas chaves e talhando um traço e a letra "J" do lado do mesmo.

Ela olhou para aquilo e levantou sua mãozinha delicada para tocar no entalhe novo do pilar. Antes que ela pudesse falar qualquer coisa prossegui.

-E quando o outro vier encontrar quem estiver precisando aqui e ajudá-lo com os problemas, nós faremos um tracinho na vertical. Indicando que o problema fora resolvido.

Assim que terminei de falar ela me olhou e me deu aquele sorriso solar de que tanto gosto, seu rostinho estava inchado pelo choro de antes, mas percebi que ela não ligava mais para aquilo. Julieta apenas pegou as chaves de minhas mãos e fez um pequeno traço vertical por cima do que eu fizera minutos antes e disse:

-Muito obrigada por me mostrar que eu tenho com quem contar, oppa! - Dito aquilo ela se aninhou no meu peito e assim ficamos por um bom tempo, abraçados e mais unidos do que nunca.

*Flashback Off*

Eu sabia que era pra lá que Julieta tinha ido, tinha certeza disso. Já estava me preparando pra ir socorrer minha amiga. Sempre tive esse sentimento protetor em relação a ela. Sabia que agora Ju possuía mais cinco amigos com quem contar, mas me sentia na obrigação de ser sempre o protetor máximo. Rocky, meu colega de quarto vivia brincando comigo, sempre dizendo as mesmas coisas. "Hyung, eu acho que essa proteção toda é amor. E não é do tipo de amigo, não!" Falava sempre rindo. Eu não achava que fosse isso. É claro que a amava, mas não dessa maneira.

Comecei a me arrumar pra ir encontrar Ju quando meu celular começa a vibrar. Olho pra tela, onde aparecia: "Judy: Está pronto oppa?". Suspirei alto, tinha me esquecido por completo do encontro com a menina depois de ver minha amiga chorando. O que faria agora? Não poderia desmarcar com Judy encima da hora, seria errado, ela parecia tão animada depois que aceitei sair com ela. Decidi, por fim, que sairia com Judy e depois iria ver se encontrava Ju na ponte, mesmo sem ter confirmado com minha amiga. Mesmo que a garota estivesse mal ela ainda poderia falar com Jinjin ou com Moonbin, ela também era bem próxima deles. Talvez eu apenas estivesse arranjando justificativas e desculpas pra mim mesmo, mas foi pensando assim que respondi a mensagem: "Já estou de saída!". Me arrumei apressado e fui buscar Judy para irmos ao cinema como havíamos combinado durante o intervalo daquela tarde.

Nossa PonteOnde histórias criam vida. Descubra agora