Cap. 7- Um pequenino acidente (Julieta)

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-Está atrasada!

              Pulei com o susto que levei. Jackson estava a minha espera do lado da porta tentando fazer cara de mal, enquanto flexionava os músculos dos braços, pra me intimidar.

-Jack! Quer me matar? Foram só cinco minutos de atraso!

              Encarei o rapaz, ele é bonito, tem cabelos descoloridos, loiros, e seus traços são bem diferentes. Ele daria um ótimo personagem pra uma das minhas histórias, alguém belo, educado e exótico, com personalidade leve. Adicionei isso em minhas notas mentais, me inspirar em Jack em um futuro protagonista. O melhor daquela situação toda foi o ver tentando e não conseguindo sustentar a expressão de chefe ranzinza, não combinava com ele. Jackson era alguém que fazia os outros rirem e que tinha o riso fácil. Precisava de muita coisa pra que ele ficasse irritado de verdade, e eu nunca tinha feito nada pra chegar nesse ponto.

-Você ainda vai se afogar em chá gelado! Tá viciada nesse troço. - disse apontando para a embalagem, agora vazia em minhas mãos.

-Seria meu sonho? Mergulhar em chá? Hahaha! Nem é vício, só bebo todo dia de manhã! - Falei tentando fazer graça, e funcionou, ele desfez a carranca e riu pra mim.

              Depois de ser levemente repreendida e receber a lista de tarefas para aquele dia, segui para detrás do balcão, coloquei meu avental e me pus a trabalhar. Hoje seria dia de faxina e organização de estoque, pior dia de todos, sempre acabava comigo. Enquanto Jackson ficava na loja para atender os clientes, bem raros pelas manhãs de sexta, eu segui para uma portinha que ficava aos fundos da loja e dava acesso ao depósito.

              O lugar tem aquele cheiro característico de livros, um pouco de poeira e bolor. Assim que entrei comecei a espirrar, precisaria do meu antialérgico. Comecei a fazer o meu trabalho por ali com a porta aberta, pensando que aquilo era o necessário para que eu não precisasse correr para o medicamento. Infelizmente, estava errada. Ao mexer em uma das prateleiras mais altas acabei esbarrando em uma caixa que deve ter sido esquecida por ali em outras faxinas, causando uma chuva de poeira sobre os meu rosto. Saí dos fundos tossindo horrores, com o nariz vermelho e os olhos, mesmo que protegidos pelas lentes dos meus óculos, lacrimejantes.

-Oh! Julieta? Estava chorando? O que foi? Meu Deus! Não sei reagir a uma Julieta sozinha, triste e desamparada! O oppa não tem experiência com isso! Cadê a Julieta de sempre! - ele falou tudo gritando de maneira dramática e me chacoalhando pelos ombros.

-Jack oppa! Já deu, não acha? Preciso do meu antialérgico! Você sabe que eu não estava chorando, só estava lidando com poeira e velhice com capas de couro!

              Fui em direção a minha bolsa para procurar pelos comprimidos. Achei a caixa com facilidade, mas quando abri me deparei apenas com a bula do meu remédio. Nada da cartela de comprimidos estar lá dentro. Revirei a bolsa por mais um tempo e foi então que me recordei. Sábado passado, durante a faxina semanal em casa, uma das minhas tarefas fora a de retirar o pó e acabei precisando tomar o antialérgico. Com a cabeça de vento que tenho, esqueci-me de guarda-lo novamente.

-Porcaria! - praguejei em português baixinho, dando um leve tapa em minha testa.

-Você quase nunca fala sua língua, deve ter feito besteira. Esqueceu o remédio, não foi?

              Com um sorriso super sem graça em meu rosto, anuí. Jackson apenas suspirou e fechou os olhos, ficando em silêncio por um tempo (coisa rara).

-Eu cuido do depósito por hoje. Fica aí atendendo os clientes e limpe o chão da loja. - disse por fim. Meu chefe era mesmo muito bonzinho!

-Obrigada Oppa! Você é melhor! Sabe disso, né? - disse com a maior gratidão possível. Ele apenas sorriu pra mim enquanto balançava de leve sua cabeça.

-Mas tenho uma condição! - meu sorriso murchou rapidamente. Lá vem!

-Você e aquela sua amiga vão ter que sair comigo um dia desses pra dançarmos!

              Claro! Quase me esqueci dessa paixão que ele nutre por Emily, só ela que não vê. Concordei com a condição dele apenas pra poder bancar o cupido desses dois. Pelo menos uma de nós duas  tinha que se dar bem, não é mesmo? 

                                                                             ~•~

              Era de tarde, pouco depois do almoço, quando havia terminado de arrumar as prateleiras da loja. Acabara de correr um pano pelo chão quando escuto o sininho da porta tocando, indicando a entrada de alguém. Levanto os olhos, me apoio no rodo e abro meu melhor sorriso de vendedora, mas este logo some quando me deparo com minha melhor amiga, me encarando como uma mãe encara a filha que chega fora do horário combinado em casa. Uma de suas sobrancelhas, sempre tão bem feitas, estava erguida e seus lábios levemente comprimidos. O interrogatório iria começar agora.

-Olá, dona Julieta! - droga! Ela tá mesmo brava. "Dona Julieta"? Tô lascada.

-Oi Emyzinha, linda e maravilhosa! Fonte de luz na terra! - digo sorrindo largamente e tentando fazer charme pra ela.

-Nem me venha com essas coisas. Hoje essa fera não se amansará!

              Felizmente, ou não, antes que ela dissesse mais alguma coisa a porta dos fundos se abre e um Jackson levemente suado, com uma expressão séria sai de dentro do depósito. Em seus braços, agora expostos devido as mangas de sua camisa terem sido arregaçadas, ele tentava equilibrar uma caixa enorme com uma pilha de grossos livros encima. Aquela cena fez com que eu e Emy ficássemos de queixo caído, Jack estava muito sexy daquele jeito (estou apaixonada, mas não sou cega, qual é?). Sacudo a cabeça e percebo que ele estava tendo problemas para andar sem que todos aqueles livros caíssem. Como o chão ainda estava úmido, seus pés deslizavam. Uma cena catastrófica envolvendo meu chefinho e uma queda horrível se passa em minha mente e eu, como uma pessoa muito boa, corri para evitá-la. Porém, o que tenho de boa eu também tenho de descoordenada.

              Eu poderia tentar explicar tudo da melhor maneira possível, mas a verdade é que nem mesmo eu sei o que aconteceu. Lembro-me apenas de três coisas. Primeiro, eu correndo até Jack, me esquecendo de que o piso estava molhado (gênio!). Segundo, Jackson correndo até mim porque eu escorreguei e derrubando a pilha de livros. Terceiro, mas não menos importante, eu olhando pra laje da loja e vendo um livro, desnecessariamente grosso e de capa dura, vindo em minha direção. Doeu? Muito. Eu gritei? Sim! Como estou agora? Deitada no chão, com um galo se formando na parte de trás da cabeça, por ter batido ela no chão, e um corte na testa, já que fui atacada por um livro de crônicas, bem longas pelo visto.

              Quatro pessoas com semblante preocupado aparecem em meu campo de visão, duas Emilys e dois Jacksons. Que ótimo, estou vendo tudo duplicado. Tentar me levantar estava fora de cogitação, ficaria mais zonza ainda.

-Oppa, acho melhor eu ir pra casa. - falei meio embolado, parecia que eu estava bêbada.

-De jeito nenhum! Você tem que ir para o hospital! Está sangrando! - quem me respondeu foi Emily, já que Jackson só sabia pedir desculpas e me encarar assustado.

              Emily resolveu me salvar e tomou o controle da situação. Rapidamente mandou Jackson pegar um pano limpo e me ajudou a fazer pressão no corte, depois os dois me ajudaram a levantar e ir para o carro do mais velho. A loja foi trancada e fomos para o hospital mais próximo dali.

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