IV

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Estava tudo tão monótono, exceto uma coisa, o turbilhão de sentimentos que eu sentia por Mon. A cada hora que se passava, só conseguia pensar nele, eu precisava esquecê-lo, mas era praticamente impossível. O que um garoto interessante como ele iria querer com uma garota como eu? É a mesma coisa que misturar água e azeite, não se misturam, ficam heterogêneas. Assim daria para definir o meu amor por ele, um peixe fora de água. Eu tinha medo de me machucar, me machucar ainda mais com algo que seria impossível de ocorrer, opostos extremos. Por que eu estava insistindo em amá-lo se claramente se via que era um amor impossível?

Eu precisava me distrair, sair, mas estava sem vontade, tudo o que eu queria era ficar na minha cama, sozinha, debaixo das cobertas, o dia todo, vestindo um pijama. Estava sem vontade para fazer absolutamente nada. Meus pensamentos voavam até que foram interrompidos por uma ligação:

— Bora sair Mah? Disse Rachel ao telefone.

— Não sei se estou muito afim. Respondo.

— Ah, vamos, poxa, férias são pra se divertir e não para ficar enfornada no quarto. Respondeu Rachel.

— Se eu ir, você vai parar de insistir? Pergunto.

— Ah, claro, só vamos nos divertir um pouco. Disse Rachel.

Rachel desliga o telefone.

Começo a me arrumar para sair com Rachel, sem muito ânimo. Visto uma regata, calça jeans e uso um all star.

Fui ao encontro de Rachel e passamos a tarde toda jogando conversa fora, como sempre. Rachel era uma das poucas pessoas que me fazia sentia a vontade para falar sobre qualquer coisa, mesmo que coisas bobas, ela me completava, em todos os sentidos. Ela era simplesmente a minha melhor amiga, a melhor em todos os sentidos. Aquela pessoa em quem eu confiava, aquela pessoa em que eu daria a minha vida para salvar a dela.

Pessoas, no geral são estranhas, para mim, não gosto muito de interagir com pessoas, me sinto um peixe fora de água, talvez por todo o bullying que sofri na minha infância e pré-adolescência. Existem traumas que são levados para a vida toda, meu medo de me decepcionar novamente, era um deles. Medo de confiar nas pessoas erradas, de contar coisas profundas para as pessoas erradas. Enfim, medo de sentir medo.

O bullying mexe com a pessoa de uma forma completamente traiçoeira, ele mexe com o psicológico das vítimas. No geral, pessoas que praticam bullying são apenas pessoas infelizes que precisam humilhar os outros por besteiras, só para se sentirem melhores e superiores. Mas de superiores não tem absolutamente nada. Você chegar ao ponto de torturar uma pessoa mentalmente só para se sentir superior, só te torna mais lixo ainda.

Todos os dias eu encosto minha cabeça no travesseiros e amargas lembranças do meu tempo de criança voam sobre a minha mente, lágrimas escorrem e encharcam o travesseiro. Um trauma que talvez nunca irei superar. Me sentia completamente deslocada no meio da multidão, me sentia atordoada, me sentia insegura, me sentia com medo. Medo de fazerem novamente comigo o que fizeram no passado. O bullying atormenta a pessoas e ainda existem pessoas que digam que bullying é mimimi, que é culpa da vítima. Só quem já foi vítima dele sabe o quanto ele traumatiza, em alguns casos para a vida toda.

Minha vida estava indo de mal a pior, gostar de um garoto, de verdade, estava me deixando maluca e o final eu já sabia, a única idiota da história seria eu, por amar alguém tão diferente de mim e achar que isso poderia dar certo. Gente como ele, jamais se relacionaria com gente como eu. Somos de mundos completamente diferentes, mas por quê não consigo simplesmente esquecê-lo? Não sentir seria muito mais fácil.

Incrível como você acaba se apaixonando por alguém que você sabe que não pode ter, alguém que completamente diferente de você. Alguém que não tem nada a ver com você. Vivemos em mundos diferentes e só seria mais um amor impossível. 

Quem nunca teve um amor? Ou chegou a pensar que teve um. A vida é assim, pessoas entram, pessoas saem. Você não para de sentir dor, só se acostuma com ela.

Quanto mais longe da sua realidade a coisa esta, mais você quer ela, ironia da vida. Todo dia me pego refletindo sobre diversas coisas, sobre a vida...

Eu me sentia uma completa estranha no mundo, me sentia excluída, rejeitada e isso doía. Eu era apenas uma invisível no mundo. Uma invisível aos olhos do mundo.

Eu só queria saber de estudar porque era isso que me ocupava e ocupava a minha mente. Eu gostava daquela vida monótona, mas ela já estava enjoando.

Eu só queria pelo menos uma vez, ser considerada normal ou pelo menos perto disso. Eu estava cansada de ser apenas uma invisível aos olhos do mundo ou até mesmo um ser insignificante no planeta. Eu me sentia estranha, diferente da maioria, um alien. Alguém que as pessoas não gostam, só por ser diferente, do considerado normal, em meio a sociedade cheia de padrões ideais de beleza. Um padrão inalcançável para mim, um padrão de outro mundo. Algo que me consumia por completo. Algo que me fazia notar que a realidade que eu estava era totalmente diferente. Uma realidade mais incompleta e infeliz, e isso me doía.

Doía ser excluída, doía ser ignorada, doía ser diferente da maioria e não ser tratada com dignidade por causa de meras características físicas. Pessoas deveriam ser vistas pelo que são por dentro e não pelo seu exterior, que é apenas uma casca para uma alma habitar. Uma casca que um dia viraria pó. Uma casca que um dia não existiria mais. 

Por quê essa indiferença toda com as pessoas, só porque teoricamente elas são diferentes do imposto pelo padrão? Não deveríamos ser tratados com igualdade? Pessoas são bem mais que beleza exterior, beleza um dia se vai, mas o caráter não.

Um Amor Para Toda A VidaOnde histórias criam vida. Descubra agora