VI

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Havia várias pessoas ausentes em minha vida e uma delas, era a minha madrasta, ela vivia para trabalhar, mal parava em casa. Minha mãe havia morrido há anos, em um terrível acidente de carro. E eu ainda não havia superado isso, mas meu pai, pelo visto, sim, já que havia arrumado outra mulher. Uma mulher que me odiava e me queria bem longe de meu pai, mas infelizmente, para ela, esse vínculo seria dificilmente rompido, afinal são laços de sangue, e como não podia nos separar, fazia da minha vida um verdadeiro inferno, me fazendo de empregada, no tempo em que ela estava trabalhando e também no tempo ócio dela. Eu não aguentava mais isso, não sabia como meu pai fora capaz de se casar com alguém como ela. Uma pessoa tão asquerosa, mesquinha, desprezível e muitos outros adjetivos, deste porte.

Meu último dia de férias foi entediante, exceto pelo tempo em que passei com Rachel, fomos para a praça, no centro da cidade, havia várias árvores ao redor dela, o que a deixava bem bonita e dava um certo ar de tranquilidade. Estávamos andando tranquilamente até que uma bola de futebol, feita de trapos voa em nossa direção e resolvo devolver aquele projeto de bola para o lugar de onde veio, até que vejo Mon, vindo em minha direção, entreguei a bola para ele, ficamos a dois dedos da boca, por míseros segundos, segundos o suficiente para bagunçar a minha mente e me fazer sentir borboletas borbulhando em meu estômago, como todas as vezes que eu o via.

Mais um ano escolar havia começado e junto consigo, mais responsabilidades, provas, trabalhos, coisas normais da vida de estudante. Coisas que poderiam até ser chatas, mas eram necessárias para uma maior  e melhor captação de conhecimentos, que um dia, seriam muito úteis, já outros assuntos, nem tanto. 

Passaram-se algumas semanas e Mon e eu, acabamos começando uma amizade, o que eu achava que seria meio impossível, mas uma amizade as escondidas, nos encontrávamos todos os dias na biblioteca da escola e passávamos tardes inteiras nela, conversando, inclusive sobre livros, sobre a vida, coisas normais, até um certo ponto. Eu me sentia confortável ao lado dele, mas não sabia se podia confiar nele, afinal, mal começamos a nos conhecer, eu nem sabia o seu verdadeiro nome ainda, apenas o apelido, que todos o chamam, desde que soube da existência dele. Era bom passar um tempo com ele, mas as escondidas? Será que isso estava certo? Era realmente necessário isso? Isso confundia cada vez mais e mais a minha pobre mente. Ele tinha vergonha de mim? Vergonha de manter uma "amizade" com uma garota esquisita como eu? O meu maior medo era esse, ele estar me enganando, me usando, me iludindo, me fazendo de gato e sapato. 

Rachel já havia notado algo estranho entre nós dois, talvez um clima, um ar diferente, slá, mas eu não me sentia segura o suficiente para falar com ela sobre essa, como devo chamar, "amizade ás escondidas". Eu me sentia horrível tendo que esconder isso da minha melhor amiga, mas talvez isso fosse necessário. Afinal, não tinha nada garantido ainda, não sabia se deveria chamar de amizade, ao certo, talvez ainda fossemos apenas conhecidos ou  meros desconhecidos, se conhecendo pouco a pouco. Pelo menos estávamos nos conhecendo, coisa que eu  juraria que nunca aconteceria na vida, afinal, pessoas totalmente diferentes, em diversos aspectos. Éramos praticamente opostos, vivíamos em realidades totalmente diferentes. Talvez isso nos faria bem, talvez não, mas o que se têm a fazer é esperar, pagar pra ver. Talvez desse certo, talvez não, mas sem tentar, o "não dar certo" seria definitivo. Agora eu poderia tentar mudar isso, talvez até tentar falar sobre meus sentimos em relação á ele, mas com a tamanha vergonha que sinto e o  quão tímida sou, isso seria meio impossível, o mesmo que procurar uma agulha num palheiro.  No dia em que eu resolver falar em relação a isso á ele, o carvão vai ficar branco e a neve será preta.

A cada dia que passava, meus sentimentos por aquele garoto estavam mais confusos ou até claros, em certo ponto. Meu coração acelerava toda vez que o via, aquele garoto havia bagunçado a minha vida no último ano, talvez ele estivesse brincando com o meu coração, talvez não. Mas eu não tinha coragem, coragem de tentar, de insistir nisso, insistir pra valer e não em olhares cruzados, mãos raspando uma na outra nos corredores, sorrisos dados de canto toda vez que nos víamos( era a nossa forma de cumprimento), esbarrões, olhares tímidos, tentativas frustradas de falar um com o outro. Duas vidas que foram tremendamente mudadas por conta de simples atitudes, que nem se quer foram intencionais, mas éramos apenas dois adolescentes, sem coragem ou talvez sem um pingo de esperança de que algo assim, poderia realmente dar certo. Pessoas muito diferentes, de realidades totalmente opostas. Será que daria certo? Será que nos arriscaríamos por isso? Talvez fosse necessário, talvez não. A única coisa que eu tinha certeza, é que já passava da hora de pararmos com estes joguetes, mantendo uma amizade que poderia muito bem ser pública, sendo privada. Ninguém sabia ou desconfiava, era estranho manter uma amizade com alguém, desse jeito, se escondendo feito animais selvagens fugindo de caçadores. Aquilo mexia comigo e muito, eu me sentia horrível e eu não tinha para quem contar e desabafar, por que para todo o resto, nós dois não nos conhecíamos, éramos invisíveis um para o outro. Mas eu era a invisível para o mundo, me sentia cada vez mais desnorteada. Apenas mais uma pessoa invisível e sem voz no mundo.

Eu era apenas uma adolescente, não era? Eu simplesmente não me encaixava na sociedade, imagina me encaixar no tipo ideal de alguém, teoricamente. Eu estava passando por diversas mudanças e assim, mais um ano se passou, tão rapidamente, a vida monótona, sem grandes evoluções, a não ser as de pensamento e na idade, afinal, agora eu estava deixando o ensino fundamental e entraria no ensino médio.


Um Amor Para Toda A VidaOnde histórias criam vida. Descubra agora