O Vale dos Anjos

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Um sistema de governo opressor, uma cidade sombria e um imperador tão terrível quanto todos os outros reis. A química que completa o império do Vale dos Anjos é de arrepiar, é fria e obscura.

Venham crianças. Entrem! O imperador e a cavalaria estão vindo!

Aquele era o brado de uma mãe que vivia sob o assombro daquele que ofuscava a alegria do reino, o próprio imperador. Ela avistou os corvos marchando, rasgando a neblina como se estivessem saindo para uma batalha.

O reino do Vale dos Anjos tem dominado a região no aspecto militar e na organização estrutural do Alto Continente. Apesar do nome celestial, a cidade se assemelhava mais a um domínio de anjos caídos. Todos estavam subjugados pela autoridade de um senhor que escolhia até a hora da morte de seus servos.

Quando falamos do frio, da obscuridade e dos arrepios, não era uma metáfora, era real. O aspecto geográfico do Vale dos Anjos era confuso; os invernos eram rigorosos e os verões pareciam nunca existir.

Durante o alvorecer e no crepúsculo era quase impossível a locomoção nas ruas. A cidade foi presenteada com uma névoa, aliás, não se sabe ao certo de onde vinha aquela forte neblina. O Vale dos anjos era quase um buraco em meio a montanhas; era um acidente geográfico que dava acesso a cidade e o mar ficava bem distante daquele país. As vezes a névoa era gélida, e as vezes mais parecia uma fumaça quente que provocava sérios problemas para a população local.

Mas de onde vinha então a riqueza e o império do Vale dos Anjos?

Bem... A região era rica em minérios e o imperador era rico em arrogância; o trabalho escravo favorecia o andamento da economia e o sonho do imperador era encontrar a esmeralda escarlate, por isso fazia do Vale dos Anjos um verdadeiro canteiro de obras subterrâneas.

A família de Cassius era tão fascinada por cristais, que logo após a morte do rei Romero I de Alecrim, fizeram de tudo para dominar uma região que foi construída por Romero. Era a Cidade Luz, onde tinha o tão cobiçado Palácio de Cristal. Essa região era para ser a capital de todo o Alto Continente, mas o pai de Cassius havia tomado a cidade para si e consequentemente seu filho fez o favor de dar continuidade no perverso plano de seu pai. Ao longo dessa estória, a Cidade Luz ganhará mais informações.

O então imperador Cassius VII assumiu o reinado aos dezessete anos de idade. Seus pais morreram envenenados por um de seus parentes que desejava o trono. Com o declínio, Cassius foi exilado quando tinha treze anos, mas o ódio o levou a elaborar um plano diabólico para tomar o poder novamente e restaurar a honra da família real.

Durante quatro anos ele planejou e retornou silenciosamente à cidade. Cassius fez a cabeça de vários soldados, montando um exército na ilha onde estava exilado e assim desceu até o Vale dos Anjos para massacrar aqueles que haviam destruído sua família.

O único problema é que, Cassius não perdoou nem o próprio povo. Os culpou por aceitarem o novo reinado sem reclamar e isso provocou uma imensa ira no coração do imperador. Ele dominou o reino, mas deixou que o ódio devastasse o seu coração.

Quando Cassius chegou ao Vale dos Anjos, sua tropa era tão numerosa que assustou o seu tio, o rei assassino de seus pais. O exército era chamado de "corvos" e por sinal, a divindade do reino é o deus Arash, simplesmente um lendário corvo branco que é respeitado e adorado por todos os moradores da cidade. Cassius é deveras devoto de seu deus e adota as cores brancas, mas é fascinado pelo preto, sendo seu exército uma verdadeira nuvem escura que domina territórios ano após ano. O problema do angelinos, como são chamados, é que eles são monoteístas, ou seja, apenas o deus Arash é o supremo, os outros são apenas servos ou anjos dele.

O imperador era misterioso e sanguinário. Cassius chegou na cidade destruindo tudo o que via pela frente. Ao chegar no Palácio Angelino, parecia que o deus Haya, rei do inferno, havia saído com seus demônios até a cidade do deus Arash. Cassius não teve piedade e levou o rei, a rainha e os príncipes até a sacada do castelo e os decapitou frente ao povo, que assistiu silenciosamente a matança.

Essa é a história que há quinze anos marcou o império de Cassius VII. Atualmente, ele rege a cidade com punho de ferro, num sistema ditatorial opressor. Cassius vive sozinho, sem amor, família ou afeto. Ele mudou o nome e a estrutura do palácio, das ruas e dos bairros. Agora em tons góticos ele vivia no famoso Castelo Negro, impecável e magnífica obra do país.

Aos trinta e dois anos, ele parecia não sofrer com o tempo. Cassius era demasiadamente bonito. Seus cabelos claros e olhos verdes acinzentados eram belíssimos, mas completamente sem vida e sem alegria. Tinha um corpo escultural como um bom guerreiro e se exaltava em mostrar o peitoral definido e o abdômen rasgado para todos que visitavam o palácio.

O imperador soube da comemoração em Alecrim, mas não foi convidado. O rei Romero II tem um medo terrível de Cassius e por sinal, tem dívidas eternas com o Vale dos Anjos.

Cansado da rotina monótona do castelo, o imperador saiu do seu trono e caminhou até a sacada de onde havia massacrado a antiga família real. Ele então se pronunciou aos seus servos.

─ Peguem as minhas vestes imperiais. Preparem uma caravana. Convoquem o exército. Sairemos desse tórrido lugar o mais rápido possível.

A multidão de escravos desesperados com o pronunciamento do imperador, saíam em direção de suas alas.

─ Senhor? Então decidiu ir a Alecrim? – Perguntou um dos conselheiros do rei.

─ Sim! Aquele reino tem muitas dívidas a pagar.

─ Mas, Senhor, é arriscado! – Replicou.

Antes que o imperador respondesse, o conselheiro Auro interrompeu o outro representante do rei.

─ Tranque a sua língua, antes que o deus Arash a devore. Apenas ouça o imperador!

Auro foi um dos primeiros a ajudar as ideias de Cassius. Ele presenciou todo o massacre da sua família e consequentemente auxiliou o imperador durante os quatro anos na ilha. Era um homem experiente e não hesitava em repreender os mais novos.

─ Por que me interrompeu assim, senhor Auro? – Disse o conselheiro.

─ Acaso não lembras que nosso senhor é capaz de arrancar a sua língua e servi-la aos porcos? Por Arash! Tenha mais cuidado com o que falas, homem! Quando falei do nosso deus, na verdade me referia ao nosso imperador. – Disse Auro, bem baixinho.

Cassius, na sacada, ficou completamente irritado com a natureza do Vale dos Anjos.

─ Maldita neblina! Mal consigo enxergar um palmo à minha frente.

Auro chegou e lhe pôs as vestes reais. O imperador então chamou o general.

─ Titus, convoque todos os corvos. Precisamos viajar até Alecrim.

─ Sim, Majestade. Estarão prontos em imediato. – Disse o general.

─ Auro, mande que o arauto anuncie pela cidade que irei passar. Se alguém ousar entrar na minha frente, minha espada será a última coisa que seus olhos verão.

O conselheiro o tinha como um filho e fazia de tudo para manter a ira do monarca. Assim, o respondeu:

─ Entendido, Majestade!

Cassius começou a sua jornada. Era hora de subir a montanha e seguir com sua tropa até Alecrim. Ele tinha um plano para se vingar do rei Romero II. Contudo, se surpreenderá com algumas coisas que acontecerão no reino de Alecrim.

Toda história tem um ponto final, mas para Cassius era apenas um novo começo para aquilo que ele chamou de vida ao longo dos seus trinta anos.

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