O SÉTIMO DIA

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A grande guerra de Haya e Niro havia deixado marcas profundas, e uma delas foi o paraíso dos deuses que havia sido dissipado. A dor dos divinos precisava ser preenchida, até que resolveram criar filhos que o amassem como os anjos os amavam. Seres que respirariam o ar, beberiam das águas, comeriam do fruto da terra, mas não teriam poderes como os deuses. A tentativa era trazer de volta a glória que um dia tiveram.

Os deuses supremos, os doze, viviam juntamente com os outros, que apesar de poderosos, eram inferiores. Cada deus tinha grandes legiões de anjos, que deixaram de existir. Depois que os deuses viraram formas animalescas e a atmosfera do planeta se tornou venenosa, ficou impossível a vida.

Entretanto, Arash e Aleiko trataram de convencer os demais a unir os poderes que tinham para tentar trazer de volta a natureza que havia sido perdida. Haya foi preso no que hoje é a Ilha de Fogo, enquanto Niro está acorrentado em uma jaula, embaixo do castelo da Província Vermelha. Apesar disso, os dois jamais perderam seus poderes e ainda são adorados, pois são deuses da destruição e da guerra. Todos ainda são devotos, principalmente em suas cidades.

Foram criadas então as plantas, as árvores, a água e o ar foi enfim restaurado. O céu avermelhado deu lugar ao lindo azul do dia e à escuridão da noite. Foi então que Alissah, deusa da natureza, semelhante à coruja e adorada em Felicia, decidiu que fossem criados os animais.

Cada animal teriam o rosto semelhante ao de um deus, mas não poderiam andar como os deuses. Eles tentaram, mas os animais não atingiram o nível desejado de evolução e assim estagnaram, ficando apenas em suas formas originais.

Foi aí que Lybia, com inteligência riscou no chão a figura de um homem e uma mulher. Ela fez isso em lágrimas, pois lembrava bastante a aparência deles antes da grande guerra. As lágrimas de Lybia correram pelas figuras desenhadas no chão e de repente, os dois primeiros seres humanos ganharam forma. Nem a própria deusa acreditou no que fez, mas aquilo era real. Por isso, Lybia é extremamente adorada e naquele dia, o sétimo dia, era a data marcada para celebrar a criação. Tudo graças aos deuses, principalmente a Lybia.

Naquela ocasião, os deuses haviam colaborado fielmente para uma tarde ensolarada e uma longa noite estrelada em Alecrim. Finalmente era chegado o grande e último dia da festa da deusa Lybia e aquele encerramento iria marcar todos os doze reinos do Alto Continente.

Todos precisavam se encontrar ao redor da grande construção localizada na frente do castelo. Na praça de acesso ao palácio, havia sido edificada uma grande estátua de bronze da deusa de Alecrim e todos deveriam se posicionar diante dela para prestar-lhe culto.

Entretanto, o rei Romero era tão egocêntrico que queria disputar a fama até com a própria divindade. Este, quando viu que a glória de Lybia estava maior que a dele, tratou logo de elaborar uma estratégia para ser notado como um grande rei. Romero ordenou que extraíssem o maior número de flores para que fossem colocadas como um tapete, desde cortejo da praça imperial até a sala do trono do palácio.

O povo do Alto Continente contava as horas do dia com base nos movimentos do sol e o movimento das sombras. Já durante a noite, eles seguiam a lua e o barulho de alguns animais. A rasga mortalha, por exemplo, sempre anunciava quando metade da noite já tinha passado. A ocasião da festa do sétimo dia estava marcada para começar quando a sombra da estátua da deusa chegasse até a escadaria do grande castelo de Alecrim. Era como se fosse mais ou menos quatro horas da tarde.

Apesar de tudo, aquela cerimônia religiosa não tinha nada de adoração aos deuses. Era uma festa caricata, onde o que mais importava era que os reis se promovessem, afim de declarar quem era o melhor ou mais poderoso do Alto Continente.

Após algum tempo, a multidão já se encontrava na praça imperial. Todas as classes sociais de Alecrim se reuniam, mas nem todos conseguiam ficar perto do cortejo, pois a multidão se tornava uma imensidão. Os que não chegavam até a estátua, ficavam aglomerados no alto das casas, muros e onde mais pudesse. Ninguém naquele dia poderia ficar em suas moradas, era uma ordem a prestação de culto e sacrifícios. Era também o dia da oferenda dos nascidos. Aquela lei que esmagava cruelmente a sociedade.

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