Uma noite romântica
Na Maceió de outros tempos, menor e mais ingênua, a cidade vivia noites de festa e alegria, nos grandes bailes que lotavam clubes que não existem mais. Talvez apenas na memória dos mais velhos. Certa noite, nesta Maceió romântica, Carolina estava apreciando o grande baile, com banda de fora e tudo, quando percebeu os olhares interessados de um simpático rapaz, bem vestido, que segurava no braço uma capa de chuva preta.O desconhecido tomou coragem e foi falar com ela.
– Olá, moça bonita. Qual o seu nome?
– Carolina – disse ela risonha.
– Bela noite, não?E os dois engataram na conversa e na dança, noite adentro. Sorriam e cantavam, como em um filme de época. Tudo era perfeito. O olhar do rapaz dizia que ele poderia muito bem se interessar por aquela pequena. Finalmente, quem sabe, ele namorava alguém firme e largava aquela boemia… Talvez até casasse?! Controlou a empolgação. Mas estava decidido a rever a garota no dia seguinte. Daria um jeito.
Ao final do baile, com os corpos moles de tanto dançar, o rapaz fica surpreso quando ela aceita o convite de uma carona para casa. Perfeito de novo. Ele mal acredita.
Chove muito e ele oferece sua capa para Carolina, que se protege enquanto correm para o carro do rapaz. Quando chegaram ao bairro do Prado, entre a Praça da Faculdade e o Cemitério da Piedade, a garota pede que ele a deixe ali, na esquina de sua rua. Ele insiste para ir até a porta da casa, que ficava bem próxima. Ela responde que prefere assim, e falou firme. Ele aceita. Não queria contrariar a moça no fim de uma noite perfeita.
– Deixo minha capa contigo. Amanhã venho buscar, certo?
Ela concorda com um sorriso, desce do carro e segue pela rua escura, não sem antes deixar seu endereço e roubar um beijo do rapaz. Ele espera um pouco, e quando acha que ela estava na segurança de casa, segue seu próprio caminho através da garoa fina. Já ansioso pelo dia seguinte.
Sob a luz de um novo dia
Na manhã seguinte, o rapaz acordou ainda sonhando com a moça do baile. Voltaria para buscar a capa, mera desculpa, queria era conquistar Carolina. Esperou a manhã passar, para não incomodar a garota e a família em seus afazeres. Por volta das 2h da tarde, ele foi, um tanto nervoso, até o endereço indicado no papel, na rua em que deixara a jovem na noite anterior.– Boa tarde – disse uma senhora simpática que o rapaz identificou como mãe de Carolina. Ele apresentou- -se, muito educado, e falou sobre a noite anterior, quando conheceu sua filha, e explicou que estava ali para buscar a capa e conversar com a moça, se lhe fosse permitido.
A mãe de Carolina Sampaio não conteve as lágrimas e reagiu com agressividade.
– Minha filha Carolina morreu, anos atrás.
O rapaz ficou branco e sentiu como se perdesse o chão sob seus pés. Pensou por um segundo, e não acreditou. Imaginou que a mãe não queria a filha, tão viçosa e sabida, de conversa com homem estranho. Mas a mãe mostrou a foto de Carolina pendurada na parede, e ele a reconheceu. Era uma foto de defunto. Morta, e maquiada como nunca em vida. Com data de chegada e saída deste mundo impressa na moldura.
O rapaz cambaleou. Primeiro se sentiu mal, o estômago revirou. Depois, insistiu e teimou. Não podia ser. A mãe, abismada com aquilo, o convidou ao Cemitério da Piedade, que ficava a poucos metros daquela mesma rua, para ver o túmulo de sua filha.
Eles caminharam até a sepultura. Lá estava escrito: “Carolina Sampaio”, com a foto da moça do baile. E sobre a lápide, o rapaz encontrou sua capa de chuva preta.