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CELINE

Havia sido difícil ter que encarar a minha mãe novamente, era como se um pesadelo do passado tivesse voltado para a minha vida novamente. Como se uma assombração que eu desejei por anos, viesse logo quando eu já não precisava mais dela. Haviam sido tantos anos sem uma presença materna ao meu lado, que havia se tornado natural uma mãe ausente em minha vida. Porém, quando aquelas batidas soaram tão suavemente na porta, o meu coração não foi capaz de aguentar a pressão e eu entrei em um desespero inerte.

Quando vi Ethan ali na minha frente, nervoso e sem saber o que fazer, meus olhos ficaram focados nele por alguns segundos, foram segundos o suficiente para ver um lado mais humano e menos com o desejo de me matar. Quando suas mãos tocaram as minhas, nossos olhares se encontraram bem de perto. A sensação de conforto veio por um instante, mas as batidas na porta pareciam martelar na minha cabeça.

O pedido que fiz a Ethan, foi inusitado. Beijá-lo parecia a coisa certa a se fazer. Seria uma distração nada comum, mas seria melhor do que ouvir a voz da minha mãe do lado de fora, porém quando nossos lábios se tocaram, eu senti aquela sensação eletrizante novamente, assim como na primeira vez que nos beijamos no clube, e assim como naquela primeira vez, eu comecei a sentir o meu corpo separando-se da minha alma. A visão que tive naquele momento, foi perturbadora.

Eu conseguia ver Ethan parado em frente ao templo que Mai e eu havíamos visitado naquela noite. A lua alta no céu iluminava as ruínas antigas, projetando sombras longas e distorcidas. À sua frente, uma criatura colossal erguia-se imponente, maior do que qualquer ser que eu já tinha testemunhado. Era um Yatu, mas não qualquer Yatu—seu tamanho era surreal, um verdadeiro monstro que parecia desafiar as leis da natureza. Não deveria existir algo assim, mas lá estava, emergindo das trevas como uma manifestação do puro terror. E pensar que essa abominação estava trancada dentro daquele maldito hipócrita... 

Ethan tinha tentado me matar, tudo para salvar alguém de uma maldição que o perseguia, uma decisão desesperada de um homem acostumado a lidar com horrores além da compreensão humana. Ele enfrentava criaturas como aquela regularmente, apesar de carregar uma delas dentro de si. Eu ainda podia sentir o gosto do beijo que o derrubou—ele desmaiou em meus braços, seu corpo relaxando de uma forma que me fez temer o pior. Por um momento, pensei que ele tivesse morrido.

Sem hesitar, carreguei Ethan para o meu quarto,  o deitei na cama com cuidado, observando seu rosto exausto. As sombras dos eventos daquela manhã ainda pairavam sobre ele, mas eu tinha outros problemas para resolver. Minha mãe estava todo lado de fora, insistindo em falar comigo. Eu não poderia mais ignorá-la, por mais que desejasse. Respirei fundo, tentando acalmar a tempestade dentro de mim antes de encarar o que estava por vir.

Quando abri a porta, a primeira coisa que me atingiu foi o olhar de tristeza nos olhos dela. Havia algo de doloroso em vê-la ali, em frente àquela casa que costumava ser seu lar, mas que nunca trouxe paz. Ela sorriu ao me ver de perto, um sorriso forçado, carregado de anos de ausência e de palavras não ditas.

"Celine, minha filha. Eu senti tanto..."

"Sem esse papo. Entra logo."

A voz saiu mais fria do que eu esperava, mas não me importei. Não queria ser gentil com ela. Uma parte de mim a odiava tanto que o perdão parecia impossível, mas outra parte, talvez mais profunda, insistia que eu deveria, pelo menos, escutá-la. Ela entrou hesitante, como alguém que teme o que vai encontrar, mas a porta já estava aberta, e não havia mais volta.

"Parece que não mudou muita coisa desde que fui embora..."

Ela comentou enquanto se acomodava no sofá, os olhos varrendo a sala de estar como se procurassem algo familiar, algo que ela pudesse ainda reconhecer. Mas era evidente que não notara as mudanças. Eu mesma havia redecorado cada canto daquela casa, substituindo os móveis antigos por peças novas e usadas que consegui com muito esforço. O processo foi longo, e terminar de pagar tudo demorou ainda mais. Mas ela não reparou. Por que repararia? Era apenas mais uma sala, mais uma memória que ela havia deixado para trás.

DevilGirl vs DevilHunter: Bad Romance (EM ANDAMENTO)Onde histórias criam vida. Descubra agora