Capítulo 4 - Eu não devo estar mudando, estou?

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   O sinal toca (...)

-"Patrícia, eu preciso ir, terá revisão da prova de história".

-"Tudo bem, tamvém vou indo. Pode me chamar por Pati".

-"Tudo bem então".

-"Tchau!".

-"Tchau!".

   Ela dá um sorriso tímido. Sem que eu percebesse, acabei retribuindo da mesma forma.

   Não posso me deixar levar pelos sentimentos. Da última vez que me apaixonei, tudo começou de forma estranha, cheguei a perder totalmente a noção de tempo, por um curto período. Tudo parecia acontecer em câmera lenta, tudo que ela me dizia era bom, troca de olhares que faziam eu sentir minha alma a levitar, era simplesmente incrível. Talvez isso que eu sentia era por conta da depressão, que sinto atualmente que superei. Eu era muito triste, chegava a cometer erros contra mim mesmo, coisas pesadas.

(Salto no tempo)

   A aula acaba agora, estou exausto de um dia de estudos. Além do mais.

   Meu corpo está em uma constante guerra de sentimentos, com um lado defendendo minha oportunidade de se deixar levar pelos sentimentos, mas do outro lado, uma resistência que diz que o correto seria eu manter a cabeça no lugar, pois a primeira experiência com a paixão, foi um tremendo fracasso, tudo ocorreu de forma negativa, apenas trouxe mágoas.

-"Victor, eu vou no benheiro, me espera antes de voltar pra sua casa".

-"Tudo bem, volta logo João".

-"Sim".

   Começo a ouvir uma voz, parece vir de dentro da minha cabeça, às vezes do meu lado direito, do esquerdo, como se fosse logo no pé do ouvido.

-"Victor, porque você se prende tanto ao medo de se entregar?".

   Com vergonha de se passar por louco, finjo estar em uma ligação no celular, pergunto:

-"Quem é?".

-"A minha voz não soa familiar?".

   Paro para pensar por alguns instantes.

-"Pati? É você?".

-"Olha só, quem diria!".

-"Onde você está?".

-"Não sou a Patrícia! Sou seu subconsciente!".

-"Oi?".

-"Tim, você sem fronteiras!".

-"Como assim? Como meu subconsciente chega a dominar tanto assim a mente, a ponto de conversar comigo mesmo? Eu preciso me tratar em uma clínica psiquiátrica".

-"Claro que não, só me escute".

-"Okay".

-"Olha só, já não me obedeceu".

-"Por quê?".

-"Eu falei pra só me escutar!".

-"Entendido".

-"Você só pode estar de beincadeira? Deixa quieto, vou dar meu próprio jeito de descobrir porque tem tanto medo de se entregar".

-"Como você vai fazer isso?".

-"...".

   Nossa, parei de ouvir aquela voz, simplesmente do nada! Seria mesmo meu subconsciente falando comigo? Isso é realmente possível? Eu entendi foi nada.

-"Victor, vamos?".

-"S-sim, claro".

-"Essa gaguejada aí?".

-"Que gaguejada?".

-"Se encontrou com a Pati nesse tempo que eu saí?".

-"S... Não!".

-"Óia óia, menininho!".

   Dou de ombros, como se não entendesse a desconfiança de João.

-"Victor, você viu onde o Kevin está?".

-"Ela me disse que os pais dele iriam buscá-lo hoje, de carro".

-"Entendi. Mudando de assunto, sabe por quem eu passei quando passei pelo bebedouro?".

-"Imagino".

-"A Patrícia!".

-"Tá, e daí?".

-"Ela estava vendo fotos suas, do seu perfil!".

-"Tá e daí?... Espera aí! Como?".

-"Ela estava vendo fotos suas. Apoio vocês dois, são tão fofos".

-"Cara, para com isso. Já te falei que eu estou focando nos estudos".

-"Dá uma chance pra ela, ela estava olhando para você até na última esquina".

-"Sério?".

-"Sim".

-"João não fica de zueira comigo não, até parece que ela iria aparecer de repente, atrás de mim, como em filmes de terror, como se fosse a...".

-"Oi, Victor!".

   No susto, acabo me arrepiando por inteiro, tropeço e caio no chão.

-"Hahaha, Victor caiu nessa de novo!".

   João conseguia imitar exatamente a voz de Pati. Ele continua andando, me deixando ali mesmo.

-"Victor, você se machucou?".

   Me assusto novamente, era a Patrícia, querendo me ajudar a levantar.

-"Estou sim, Pati".

-"Que bom, achei que havia se machucado".

-"É, mas foi só um tombo bobo, nada de mais".

-"Seu cotovelo está sangrando...".

   Olho para meu braço, vejo uma pequena ferida:

-"Tudo bem, só ralei um pouco".

-"Vamos pra minha casa, são duas quadras daqui, posso fazer um curativo".

-"Não precisa, não está doendo".

-"Mas pode infeccionar".

-"Muito obrigado mesmo, mas acho que não é necessário".

   Ela continua insistindo. Ela faz uma cara de coitada, como um cachorro que caiu da mudança. Eu não me aguentei a partir daí:

-"Tudo bem, eu vou".

-"Oba! Então vem comigo".

   Vou indo junto à ela, ela chega cada vez mais perto, a mão dela toca a minha. Fico preso em uma timidez nunca sentida antes.

   Ela olha nos meus olhos, percebo a carência sentida por ela. Muitos zombam dela, por ser muito tímida e sua altura, pequena para a idade. Eu particularmente considero essas coisas fofas.

   Pego em sua mão, ela se assusta brevemente, pega em minha mão, olhando nos meus olhos, percebo que ela estava emocionada, os olhos cheio de lágrimas. Antes que eu podesse dizer se quer uma palavra, ela escora sua cabeça no meu ombro.

   Estou totalmente sem reação, mas adorando tudo.

-"Chegamos Victor, essa é minha casa!".

   Ela me pucha pelo braço, com pressa, provavelmente preocupada com minha ferida.

   Patrícia passa algo no meu cotovelo ralado, arde um pouco, involuntariamente sussurro:

-"...ai...".

-"Desculpe Victor, mas logo estará melhor!".

   Ela termina de fazer curativo, eu falo:

-"Agradeço seu gesto de bondade, mas eu preciso ir agora".

   Patrícia me segura pelo braço, de cabeça abaixada, me diz:

-"Preciso falar com você, por favor".

-"T-tudo bem, o que houve?".

-"Preciso lhe confessar algo, de coração...".

Despertar de uma chamaWhere stories live. Discover now