Então, sabe, meu diário, eu olhava no espelho e via meu corpo… Era meio gordinha, nem sei por quê, nem comia muito. Estava sempre com fome e o que me salvava era a merenda da escola. Tinha uns seios bem redondos e um pouco de barriguinha… A Cejana, com aquela mania de médica, vivia dizendo que eu precisava fazer regime.
Penteava o cabelo solto na costas, um cabelão bonito, bem Preto, que combinava com meus olhos verdes. Sempre fui vaidosa, a mãe até dizia que eu vivia me olhando no espelho. Minha maior vontade era ter um espelhão pra me olhar de corpo inteiro, mas eu só tinha um espelho partido no guarda-roupa, que dava pra ver só até a barriga.
Eu me sentia moça e bonita, e queria que o Gelcimar me achasse assim. Ele era tão gozado! Às vezes me chamava de moça, outras de criança. Também, ele tinha vinte anos e eu só doze, uma porcaria.* * *
Ele começou lá no emprego de guarda-noturno, e trabalhava a noite inteira. Quando voltava, eu já estava na escola, estudava de manhã. A hora do almoço era a melhor coisa que me acontecia. Quando chegava da escola, o pai, a mãe e os irmãos estavam fora. Então eu, vinha correndo pra encontrar o Gelcimar, que já estava acordado…A mãe deixa a comida em cima do fogão e a gente almoçava junto. Ele perguntava:- Como é que foi a escola, hoje, Taís?
- Ah, foi bom. E o seu trabalho?
- Uma droga! Quase morri de frio. Que terra fria que é esta aqui, não?
- Pois eu dormir muito bem.
- Sua sonsa - ele ria, mostrando a falha do dente. - Mangando comigo, é?
- Que nada. Pensei em você passando frio lá na construção. Me deu até pena…
- Eu nao quero pena, não.
- O que você quer?
Os olhos azuis também sorriam:
- Quero é ser seu amigo, muito amigo, viu?
- Ué, e a gente não é amigo?
- Mais ainda.
Fiquei vermelha de emoção. Aquele moço feito, como dizia a mãe, querendo ser meu amigo. Então ele não me achava tão criança assim.
- Você deixou namorada lá no norte?
- Um montão.
- Seu Convensido. Vai ver que não deixou nenhuma.
- Deixei,sim. Mas nenhuma tão bonita como você.
- Eu sou criança ainda.
- Nem tanto. - O Gelcimar me olhou dos pés á cabeça. Me mediu toda. Eu tava lavando a louça na pia, me senti esquisita:
- Não olha assim não, Gelcimar.
- Que é que tem, você não gosta?
- Até que gosto.
- Então, sua boba. Olhar não tira, pedaço.
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O portão do paraíso- Giselda Laporta
RomanceTaís uma garota de doze anos inocente e encantadora, sua vida começa a mudar quando seu primo Gelcimar vem morar na sua casa onde sua vida muda completamente de criança para adulta com grandes responsabilidades.