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            Eu fiquei gelada: casar!Que loucura era essa! Mas nem perguntei nada. Já pensou? Do jeito que todo mundo tava bravo naquela casa! Só fiquei ouvindo e rezando pra acontecer o contrário.
          Pra mim, até que os manos foram legais. Me olhavam também com tristeza e comentaram entre eles:
       
- Ele se aproveitou da inocência dela, esse canalha... Vê se ela tem cara de saber das coisas...
        
- O pai nunca devia ter posto esse cara aqui dentro... Mas será que ela não sabia mesmo?
        
- Deixa ela em paz, não tem mais jeito mesmo, e o  cara vai casar, não vai?
        
           Gozado, eles falavam de mim, mas não falavam comigo... Como se eu fosse de outro planeta. E eles também tinham namoradas. Será que eles faziam com elas o que o Gelcimar fez comigo?
           Queria tanto perguntar, mas morria de vergonha. E os dois batendo boca a meu respeito, que saco!
           E aonde tinha ido parar o Gelcimar?

                       * * *

            O Gelcimar só voltou bem tarde da noite. Mas o pai tava esperando por ele. E falou duro:
        
- Vou pedir pro juiz de menores casar vocês, entendeu, rapaz?
        
            O Gelcimar nem respondeu, de tanto medo. Só olhou feio pra mim. Que culpa eu tinha se o pai queria que a gente se casasse? A mãe ainda disse:

       
- O juiz não vai deixar. Ela só tem doze anos.
        
- Tem de deixar! - bufou o pai. - Eles casam de qualquer jeito. Filha minha é que não vai ficar largada por aí, com filho na barriga.

            Filho na barriga?! Até aí o médico, o pai, a mãe, os irmãos tinham falado de coisas que eu não conseguia entender... Mas aquilo, minha nossa, era por isso então que a minha barriga tava crescendo... Quer dizer que eu tava...
            Corri pro quarto e chorei que nem louca! Eu nunca tinha chorado daquele jeito. Então, de repente, aconteceu a coisa mais esquisita do mundo: aquilo que tava na minha barriga... mexeu! Saí gritando:
       
- Acuda, mãe, tem uma coisa mexendo na minha barriga!

            A mãe me pegou pela mão, me levou pro quarto e, gozado, fez uma coisa que nunca tinha feito antes: conversou comigo. Disse que eu tinha namorado com o primo e por isso tava grávida. Que o que mexia na barriga era o bebê, o meu filho, que ia nascer dali a alguns meses...
        
-  Mas nascer como, mãe? Por onde?

           A mãe parecia que não agüentava mais:

- Isso eu conto depois, quando chegar a hora. Pelo amor de Deus, Taís, me dá um tempo!

            Ela saiu do quarto e eu chorei mais um pouco. Depois cansei e fui ler umas revistinhas. Estava louca da vida com as minhas amigas. Elas nem ligavam mais pra mim. Pra falar a verdade, fazia um tempo que elas até...fugiam... Davam sempre uma desculpa esfarrapada pra não andar comigo... Ai, meu Deus, parecia tudo um sonho, ou pior, um pesadelo... Será que eu não ia acordar?
           Daí me deu um estalo... Será que elas faziam isso porque eu tinha um bebê na barriga? Ué, quando as pessoas ficavam grávidas, todo mundo fazia tanta festa! Por que comigo era diferente? Só porque eu tinha doze anos e o Gelcimar vinte? Ou porque não era casada ainda? Mas o pai disse que a gente ia casar... Será que depois elas voltavam a ser minhas amigas de novo?
           Só havia um probleminha, quer dizer, um problemão: eu não queria casar com o Gelcimar, não queria mesmo!
           Acho que comecei a ficar mais velha nesse dia, sabe, meu diário? Quando decidi que não queria casar de jeito nenhuma com o primo.
           Casamento parecia uma coisa tão boba! Via a mãe trabalhando sem descanso, noite e dia, o pai sempre bravo, agora ele tinha dado até pra beber. A mãe dizia que era de desgosto... Tudo por causa do bebê na minha barriga. Puxa, esse bebê tava dando mesmo uma confusão e eu nem tinha casado ainda.

O portão do paraíso- Giselda LaportaOnde histórias criam vida. Descubra agora