Capítulo nove

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Não. Ela não podia explicar, mesmo que usasse toda a ladainha do mundo, eu jamais aceitaria os motivos que a levaram a ser tão cruel assim comigo. Eu caminho lentamente em direção a ela, olhando bem nos seus olhos, enquanto um silêncio quase interminável paira sobre nós.

– Quero o Eros aqui – sou dura com as palavras.

– Por que meter o Eros nisso, Zoe? – Ela diz enquanto enxuga as lágrimas – Eu sou a culpada de tudo. Fui eu que convenci a todos para mentir.

– Não me interessa – Eu tiro o celular do meu bolso e disco o número do Eros. Ele atende e eu peço que ele venha urgente até a minha casa – Quando o Eros chegar a gente conversa.

Eu simplesmente desabo sobre o sofá, enquanto ponho as mãos na cabeça, fecho os olhos e deixo toda a minha decepção fluir em silêncio. Embora eu não admita, sinto um calafrio ao pensar no Eros me confessando que também foi um canalha comigo durante todo esse tempo. Fico esperando-o chegar e não consigo olhar nos olhos da minha mãe e torço para que ela permaneça calada durante esse tempo. Espero meu coração voltar a bater como antes. Fico esperando voltar a controlar o meu próprio corpo. Fico esperando e esperando e me pergunto por quanto tempo vou ficar assim. Uma voz interrompe meu flagelo:

– Oi amor. – Então me viro, olho nos seus olhos e me levanto em posição de guerra. Estou furiosa – Diga o motivo de tanta urgência.

Pela primeira vez eu sinto repugnância ao ouvir a voz dele. Como ele pode ter feito isso comigo? Como todos puderam?

– Eu já sei de tudo. – Observo aquela sobrancelha adornada se erguer, percebo como minhas palavras devem ter soado – Sei que todos vocês mentiram para mim.

– Zoe, – outra sobrancelha se ergue espelhando a primeira. Sinto meu rosto queimar de ódio – nós podemos explicar.

Meu rosto fica ainda mais quente. Eu me pergunto, apavorada, como deve estar minha aparência nesse momento. Me sinto obrigada a desviar olhar do seu. Abaixo a cabeça e tento me controlar para tentar entender quais seriam tais explicações sobre fatos tão injustos. Respiro fundo, usando o gesto como uma desculpa para ficar mais calma.

– Foi por amor – ele me diz enquanto eu fico boquiaberta com sua cara de pau.

Cacete!

– Amor? – Eu sorri não sei o porquê – Eu não quero um amor que mente para mim, que me engana, que mata alguém por puro capricho.

– Você escutou o que você disse? - diz Elisabeth – Acha que mentiríamos por capricho? Não percebe que se o Arthur permanecesse vivo, ele arruinaria todo o seu futuro. Fizemos isso para te proteger.

– Estragaria o meu futuro mãe? – Pela primeira vez durante toda a minha vida, eu grito com ela – O que vocês fizeram foi o que?

– Como foi que você descobriu? – Ela me pergunta.

– Não interessa – eu digo.

– Não é para dizer a verdade? – Ela abre os braços disposta a fazer daquilo um grande tribunal – Pois então diga, porque eu sei que aquele seu interesse de ir visitar o túmulo do Arthur não surgiu por acaso.

– De fato, não – então me recordo das palavras do João quando me disse que todos mentiram para mim. E no final ele estava certo e o seu plano de me sentir mal havia enfim funcionado – O João me contou que vocês escondiam algo de mim.

– Você andou se encontrando com aquele cara?

– Não – eu digo, minha voz saí seca – Conversamos por telefone e ele só atiçou minha curiosidade, disse que vocês mentiram sobre a morte do Arthur e eu fui verificar se aquilo não era apenas um blefe dele para desviar minha atenção. Não foi tão difícil desvendar o mistério, encontrei um cartão na biblioteca essa manhã com o endereço de onde o Arthur provavelmente deve estar internado, liguei para lá e descobrir que no final era o João fora o único certo nessa insanidade toda.

Meu Delírio - Livro 2  DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora