Capítulo seis

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O ar estava frio naquela manhã. Eu saí de casa com Elisabeth ainda dormindo e encontrei o carro de Naomi estacionado já me esperando. Havíamos combinado antes do final de semana que ela me buscaria em casa sempre que possível, e não sei se deveria, mas me surpreendi que ela houvesse lembrado disso.

– Bom dia Zoe – Ela dá partida no carro, mas não me olha – Me conte como foi seu final de semana.

Eu solto um meio sorriso no canto da boca, me lembrando do desastroso almoço de domingo em família.

– Divertido. – Eu disse, contando para ela como minha mãe me defendera deixando a minha sogra sem defesa – Só lamento que tenha estragado os planos do Eros de unir as famílias.

– Por esse lado em querer agradar o seu noivo, realmente foi, – Naomi sorriu achando graça de tudo aquilo – mas por outro lado a velha bem que mereceu.

Eu tive que concordar com ela. Elisabeth mandou muito bem, melhor do que qualquer coisa que eu imaginaria fazer. Nos calamos por alguns minutos e eu pude observar um pouco a Naomi. Ela era uma mulher robusta, atarracada mesmo. Vestia um macaquinho preto que dava para mostrar suas pernas musculosas. Talvez ela pedalasse, eu pensei enquanto colocava uma mexa do meu cabelo desalinhado atrás da orelha e me sentia tão insignificante perto daquela bela mulher. Usava um batom vermelho nos lábios e parecia que só havia aquilo de maquiagem no seu rosto. Tinha a postura de uma Leide que eu desejei me espelhar. Eu nunca me arrumava direito, aliás eu nunca aprendi como me comportar como uma mulher. Não usava brincos, nem roupas que revelasse meus atributos. Ainda havia muita timidez em mim quando o assunto era eu e o meu corpo. Ser tímido parecia muito com não tentar, da mesma forma que eu não tentava muito mudar meu visual, eu me acomodava em ser como era. Não sei por quantos minutos fiquei observando-a, apenas sentir o veículo parar me dando conta que havíamos chegado.

Ela estacionou o veículo fora do colégio, bem perto da entrada. Descemos e quando eu me virei para acompanhá-la, minhas pernas simplesmente travaram. Eu não conseguia me mover e foi como se todos os meus sentidos desaparecessem. Prendi a respiração enquanto olhava nos seus olhos. Perto demais, tão perto que estremeci.

– Você conhece esse homem, Zoe?

Eu não queria ter que responder aquilo. Mas agora quando minha respiração finalmente começa a se tornar um pouco mais fácil, eu desejo gritar para todos ouvirem o quanto aquele homem parado a poucos centímetros de mim, é um canalha e que eu o odeio como nunca serei capaz de odiar ninguém.

– Olá querida, Zoe. – Ele diz sorrindo – Queria muito rever a minha velha amiga.

– Então vou entrar, – Naomi disse – e os deixarei a sós.

Eu ligeiramente segurei com força o braço dela a impedindo de dar qualquer passo para longe dali.

– Não faça isso – eu imploro para ela – Eu não sou nada desse homem e ele está permanentemente proibido de se aproximar de mim.

– Como? – Ela parece confusa.

– Não vou machucá-la.

– Mais do que me machucou, impossível. – Jamais imaginei que seria tão corajosa de encará-lo como eu estava fazendo – Se você não for embora agora João vou chamar a polícia para você.

Ele sorri de um jeito que eu consigo ver a maldade no seu rosto. Os motivos que fazem ele agir assim eu já conheço, mas seus passos dados em seguida a cada ação, me dão arrepios.

– Estou indo – murmurou – Estou indo mesmo, mas voltaremos a nos ver.

Porém ele permaneceu onde estava por mais um instante, como um animal mantido na jaula por tanto tempo, que não acreditava na sua liberdade, mesmo que essa não lhe fosse merecida. Passou por mim, ainda roçando seu braço no meu. Eu fechei meus olhos de pavor enquanto deixava minhas lágrimas descerem. Ele dava longos passos por um jardim que se misturava a calçada. Eu não conseguia tirar meus olhos dele até vê-lo virar a esquina e desaparecer. Eu quase desabei depois disso.

Meu Delírio - Livro 2  DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora