No Compasso do Seu Coração - 1° temporada - NOVA VERSÃO

Capítulo 4 - Divórcio

Daniel

"Na vida tudo passa não importa o que tu faça. O que te fazia rir, hoje já não tem mais graça. Tudo muda, tudo troca de lugar..." Tudo Passa - Túlio Dek ft. Di Ferrero

Ela tem os olhos mais lindos do mundo. Era só o que eu pensava enquanto a gente se olhava. Eu não pretendia parar de olhá-la até ela começar a falar. Então eu fui obrigado a parar de olhar para os olhos para olhar para a boca. Não que eu estivesse reclamando.

"Me desculpa, eu não estava prestando atenção." Ela disse com a voz fraca mas ao mesmo tempo decidida. Como se estivesse vulnerável, mas não quisesse me mostrar isso.

De alguma forma eu encontrei minha voz e respondi "Que isso! Eu que estava olhando pra cima e não te vi."

Eu estava até agora tentando descobrir o que tanto me atraía naquela garota. Ela tinha o cabelo longo e preto com cachos caindo pelas costas, era consideravelmente mais baixa que eu, tendo que levantar a cabeça para me olhar. Tinha a pele morena, o rosto fino e os olhos... Os olhos grandes e castanhos, que transbordavam curiosidade e alegria, apesar de estarem vermelhos de choro. Tinha uma expressão triste, como a da minha mãe, que me deu vontade de perguntar o que tinha de errado e fazer de tudo para melhorar o dia dela.

Saí do meu transe e parecia que eu tinha levado um choque. O que eu estava pensando? Meus pais tinham acabado de se separar. Um dos poucos casais que achei que ficariam juntos pra sempre, mas que se separaram de uma hora pra outra, separando minha família. O amor na minha opinião, era um conceito que não existia mais. Eu pretendia fugir de qualquer coisa que resultasse numa paixão e possivelmente um amor. Amores acabam e vendo de perto como meus pais ficaram, eu decidi que não queria aquilo pra minha vida.

Mas aquela garota definitivamente fez alguma coisa se acender em mim.

"Sem problema." Ela disse baixinho.

Eu ainda estava tentando absorver cada detalhe do seu rosto, quando um senhor as minhas costas nos pediu licença. Consegui desviar nossos olhares e dei um sorriso. Pedi desculpa mais uma vez e sai atrás da minha mãe.

Quando a achei, ela já estava sentada nas nossas poltronas. Sentei ao seu lado e ela desatou a falar. "Ah, Dani eu estou tão feliz que vamos finalmente viajar juntos. Desde o ano passado a gente está planejando e nunca vínhamos por causa do seu...", ela deu uma pausa, mas eu sabia muito bem o que completava aquela lacuna. Seu pai. "Bom não importa porque não viemos antes não é? O que importa é que estamos indo agora." Sorriu fechado.

Há dias ela evitava tocar no nome do meu pai. Só quando muito necessário.

"É, mãe. Eu também estou muito feliz." Eu estava dizendo a verdade. Nós dois estávamos planejando essa viagem a meses, mas o propósito da viagem era virmos todos nós. A Mari estava louca pra visitar os parques, e, agora apenas dois de nós estavam indo. Então não era fácil estar 100% na viagem ainda mais tendo que ver o olhar de tristeza da minha mãe sem me lembrar de tudo.

Sem querer, me desliguei dela, e mergulhei nas lembranças daquele dia.

Mari e eu estávamos na sala assistindo TV. Eu adorava passar esse tempo com ela mesmo sendo mais velho, a gente se dava relativamente bem.

Estávamos rindo de alguma coisa que tínhamos visto, quando nossos pais apareceram e disseram que queriam conversar. De cara notei que alguma coisa estava errada. Meu pai estava muito calado, e minha mãe com os olhos inchados de choro. Algumas das coisas mais difíceis de ver.

"Nós... estamos conversando há alguns dias, e tentando tomar a melhor decisão pra nossa família." Meu pai disse e nós nos entreolhamos tentando entender o que se desenrolava na nossa frente.

"Pai, nós não estamos entendendo nada." Eu disse como se fosse óbvio.

Eles se olharam buscando apoio um no outro e tiveram uma discussão silenciosa. Após alguns segundos, minha mãe se pronunciou.

"Nós vamos pedir o divórcio." Disse de cabeça baixa e eu demorei uns segundos para processar. Quando caiu a ficha um bolo se formou na minha garganta.

"Por que?" Perguntei com a voz travada.

"Porque o nosso casamento já está mais do que desgastado, Daniel. Há quanto tempo a gente não tem um momento em família? Ficamos tão focados em nossos trabalhos, as nossas vidas, que esquecemos disso. Esquecemos de vocês dois!" Meu pai respondeu e balancei a cabeça.

"A gente entende, pai! É só uma crise! Vocês vão voltar a ser como eram antes. Só temos a vida que temos por causa do trabalho de vocês." A Mari falou enquanto algumas lágrimas rolavam.

"Minha filha, se chegamos a falhar com vocês... Imagine o nosso casamento como está!" Quando meu pai disse isso, minha mãe começou a chorar copiosamente. "Calma Vitória, eles vão entender que é melhor pra nossa família." - Meu pai falou tão triste quanto minha mãe e minha irmã. Eu entendia, mas Mari não iria entender. Era mais avoada, não tinha percebido o que eu percebi. Eles mal se tocavam e viviam discutindo pelos cantos da casa.

Quando contaram que meu pai ia levar Mari para o Rio de Janeiro com ele, senti tanta pena dela que tentou argumentar de todo jeito possível mas acabou indo.

Na hora de ir embora ela me abraçou tão forte, que eu não consegui me segurar e chorei igual a uma criança no seu abraço. E assim ficamos só minha mãe e eu em BH enquanto uma parte da nossa família se mudava para o Rio.

"Ooi! Terra para Daniel. Está aí ainda, filho?", minha mãe estava estalando os dedos na minha frente, e percebi que enquanto lembrava de um dos piores dias da minha vida, deixei ela falando sozinha. "No que você estava pensando, meu filho?"

Precisei pensar um pouco. Ela não precisava saber o quanto as lembranças daquele dia me assombravam, então eu disse o que ela queria escutar, mas não que fosse mentira. Eu só queria ver um sorriso no rosto da minha progenitora.

"No quanto eu te amo, e que apesar de tudo, a nossa viagem ainda vai ser a melhor de todas, mãe." - Ela sorriu e então eu soube que tinha dito a coisa certa.

Coloquei meus fones de ouvido e tentei dormir um pouco, mas eu não tirava a garota do corredor da cabeça. Mas eu precisava. Qual o sentido daquilo? A gente nunca mais ia se ver.

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