22- Pesadelos, medos e inseguranças voltando à tona

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Josh

Aos dezesseis anos, sofria bullying na escola. Isso sempre me assombrou. No começo, eu não ligava, mas com o passar do tempo, foi ficando difícil de suportar. Eu sempre tive amigos, mesmo confiando minha vida a eles, decidi não contar e esconder até da minha família. Era maior que meus colegas desde o ensino fundamental. O que antes era vantagem, tornou-se um problema, uma ofensa.  Xingavam-me de todos os nomes possíveis e eu desabava no banheiro masculino, depois do treino de basquete. Com o tempo, as ofensas começaram a passar para outro nível, sempre fui contra a violência. Passou a ser físico e eu voltava para casa com um olho roxo ou o lábio cortado. Na época, minha mãe trabalhava em período integral, então, quase não nos víamos. 
Três meses correram e tudo continuava a piorar. Meus sonhos estranhos e sem nexo, viraram pesadelos. Minhas faltas de sono geraram minhas insônias. Minhas insônias, as olheiras. Estava difícil de suportar, e, para melhorar, ironicamente, a garota que eu gostava tinha começado a namorar com outro cara. Tudo isso era muito para mim. Eu me sentia sem rumo, sem razões para viver e ainda por cima, um inútil. Eu era um fantasma, olhava para o espelho e não conseguia enxergar meu corpo. Não comia direito a três semanas e estava mais magro, inventei para minha mãe que tinha encontrado uma nova dieta para "entrar em forma sem esforço" e ela acreditou, mesmo achando estranho.

Resumo: não comia, não dormia, capotava nas aulas, minhas notas caíram consideravelmente, faltava aos treinos, evitava meus amigos, me trancava no quarto, não falava com meu irmão e trocava poucas palavras com minha progenitora. Fazia maratonas intermináveis de séries e filmes, virava noites, parei de escrever canções e era grosso com quem amava. 

Eu realmente havia chegado ao fundo do poço e estava completamente sozinho e perdido. Eu não chorava, eu desabava. Ombro amigo, palavras carinhosas e positivas ou abraços eram inexistentes para mim. Cheguei a um ponto em que não conversava com ninguém. Estava faltando até as aulas. Criaram um novo eu. 

Labirinto sem saída era pouco para mim. Parecia que estava em um mar profundo, sem ninguém, deixado para morrer. Afundava cada vez mais e mais. Desmaiei cinco vezes em uma semana. Louco era pouco para descrever como me sentia. Estava depressivo, deprimido, sem forças para me mover. Alguns dias pensei que fosse morrer de fato e meu pensamento era constantemente esse. Eu não desejava mais minha vida, sentia-me como um peso. Uma noite, de madrugada para ser exato, aproveitei que todos estavam dormindo e fui até a caixa de remédios para encontrar um que me fizesse dormir. Eu encontrei e comecei a tremer, tremer de nervoso. Peguei água e tomei, mas deixei o copo cair, logo senti minha vista escurecer e caí no chão desacordado devido ao efeito imediato da droga medicinal.

A primeira coisa que vi ao abrir os olhos foi um teto branco e meus braços com faixas, ou melhor, curativos. Obviamente estava em um hospital. Minha cabeça latejava e me senti pesado por um momento. Olhei para o lado e vi minha mãe segurando minha mão, que estava ligada a um soro e remédios. Tentei falar, mas simplesmente era impossível, ardia tudo. Sacudi a cama e logo uma enfermeira entrou, olhou na minha direção e saiu e voltou em seguida com um médico ao seu lado. Pediu para que minha mãe saísse do quarto, pois faria exames em mim.

-Como se sente filho? – fiz cara de confusão- Vou te fazer algumas perguntas e sei que não consegue falar, é normal por ter ficado muito tempo desacordado. Se sim, aperte minha mão.

-Está se sentindo pesado?- apertei sua mão.

-Seus braços ardem?- apertei novamente, se ardem? Queimam!

-Está sentindo algo estranho em você?- apertei.

-Consegue se mexer?- balancei a cabeça negativamente.

-Sua cabeça dói?-apertei.

-Certo, faremos alguns exames em você. Agora, descanse.

Ele sai pela porta e vejo minha mãe voltar com os olhos marejados me olhando e isso me parte o coração.

-Filho, por que não me contou? Recebi uma carta do diretor dizendo que suas notas estão no vermelho, que está faltando às aulas e aos treinos a duas semanas e que tem se isolado. Seus professores me disseram que haviam te visto com os olhos vermelhos, o olho roxo ou o lábio cortado quase todos os dias. Por que não me contou que estava sofrendo bullying na escola, meu amor?- ela começa a chorar e eu também.

Socorro, não sei como resolver! Estou incapaz de falar e sinto que a qualquer momento posso desmaiar. Ela sabe que não consigo falar e apenas me abraça com cuidado.

Eu também passei a me cortar com tudo pontiagudo que aparecia na minha frente. Meus braços eram pura carne viva e ardiam muito. Mas eu não tinha outra forma de recorrer o que estava sentindo, e achava, erroneamente, que me automutilar era a saída para amenizar minha dor. Um dia, em casa, sozinho, fiz isso uma vez, mas conforme a dor ia aumentando, tornou-se algo rotineiro e por incrível que pareça, um alívio para mim.

Agora, vejo que é algo inútil. Tudo por uma mera diferença fisiológica, que eu não tenho culpa.

Quando pude começar a falar, sem sentir tanta dor, expliquei ao doutor, minha mãe e a psicóloga detalhadamente todos os passos que me levaram a chegar a esta situação que estou no momento. As pessoas que foram responsáveis por me deixarem naquele estado, foram expulsas do colégio. Entramos com um processo judicial contra eles e ganhamos.

Nunca havia me sentido tão fraco e tão forte ao mesmo tempo. A justiça foi feita e estou aliviado por estar vivo.  Passei mais cinco meses me recuperando até estar cem por cento saudável. Depois de receber  alta do hospital, meu segundo lugar favorito na terra passou a ser o consultório da minha psicóloga e ganhei uma nova amiga, pois poderia desabafar o que quisesse  sem medo de vazar informação.  As feridas cicatrizaram-se depois de muito tempo, mas posso chamá-las de vitoriosas.  E orgulho-me de cada uma delas. Agradeço por cada amigo e integrante da família pelo apoio, amor e dedicação que tiveram por mim.

Não importa se é de sangue ou não. Família é tudo.

Hoje, esses acontecimentos não me abalam tanto, mas ainda assim, temo em ficar sozinho, pois sei do que sou capaz contra mim mesmo e continuo com minhas rotineiras terapias.

Às vezes, esse medo de me machucar, vem à tona. Posso afirmar que tenho medo de mim mesmo e isso é difícil de admitir. Mas, mantenho-me forte, não só para meu próprio bem, mas pelo das pessoas que amo e cuido.

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