40-Descontrolado

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Josh

Dois meses depois

-Quer ajuda com o pernil, mãe? – Ela o tira do forno com luvas de silicone. – Posso dar os toques finais.  Vá se trocar, estou pronto. – Ela me olha e sorri.

-Faltam apenas alguns temperos especiais e recoloca-lo no forno mais uns dez minutos. –Tira as luvas e o avental. – Nossa, o pessoal chega em uma hora, melhor me apressar. Obrigada, meu filho. – Sobe as escadas e Miguel corre pra cozinha.

-Lolla vai demorar? Preciso mostrar um livro que com certeza viraria um filme. – Nota os temperos na pia e me olha- Tô com fome. Tem alguma coisa pronta? – Miguel diz e abre a geladeira.

-Tem, sim. Todas na outra geladeira, será que pode ajudar a colocar a mesa? – Falo e ele começa a pegar os talheres e copos. – Pra você, copo de plástico.

-Por que não posso usar copo de gente grande? – Faz um biquinho fofo. – Deixa, vai. É Natal, Deus tá vendo. Acho bom concordar, então.

-Credo, sem chantagens. Nem vem, você pode derrubar o copo sem querer e quebrar. Daí quem limpa? Eu. A resposta é não e vai lá brincar, tenho que preparar o restante.

-Tá, eu vou. Seu chato de galocha. –Ele vai pro quarto e volto a preparar as coisas.

***

-Esse pernil está maravilhoso, dona Carla! – Lolla diz e minha mãe sorri para ela e olha para mim.

-Josh quem deu os toques finais. Não sei porque ele ainda não se inscreveu no Masterchef.

-Simples, é só um hobbie.

-Um hobbie que pode te deixar rico, você é louco por culinária, amor.

-Concordo com sua namorada, filho. Já está na hora de mostrar ao mundo seu talento.

-Vamos apenas comer, okay? Depois tocamos nesse assunto. Não quero saber disso, já cansei de falar e odeio que me pressionem. - Odeio falar sobre isso. - Podem parar de falar? Chega, eu não quero saber, cacete! - Acabo me descontrolando e bufo.

Minha mãe percebe o clima.

-E seus pais, querida? Estão bem?

-Sim, Carla. – Sorri. – Fizemos chamada de vídeo antes de termos que vir pra cá e conseguimos conversar bastante. Estou com saudades.

-Oh, minha flor. Desculpe perguntar, eu não fazia ideia. Pode passar o tempo que quiser aqui em casa, sempre que se sentir sozinha.

-Tudo bem, mesmo. Eu já venho. – Lolla levanta e eu a sigo com o olhar, mas claramente sou ignorado.

-Eu já venho. – Todos me olham. – Vou atrás dela. - Falo e levanto.

Procuro pelos cômodos no térreo e subo as escadas, a vendo no quarto de meu irmão.

Ela me vê e apoio minha cabeça no batente da porta, analisando como ela está bonita naquele vestido.

-Você está linda. – Ela desvia o olhar. – Desculpe por falar daquele jeito na mesa. Não sou muito aberto sobre coisas que não tenho certeza total ainda e reconheço que nada justifica minha atitude, por isso, desculpe. De verdade.

Ela olha para os lençóis da cama e de repente eles são mais interessantes que nossa conversa.

-Nada justifica, como disse. Já pode sair daqui. – Em momento algum seus olhos encontram os meus. Eu quero que me olhe. – Vamos, saia. – Ao perceber que fico imóvel, ela levanta e tenta passar por mim.

-Não faça isso. Por favor, me desculpe, eu não pensei quando falei. – Ajoelho a sua frente. – Por favor, Lolla. Deixe-me ficar. Estou arrependido. Muito, muito mesmo.

-Eu vou embora. Encontrarei as meninas na praia. – Ela solta meu pulso de sua mão e desce as escadas, sigo-a até a sala.

-Eu te levo. – Ela faz que não com a cabeça. – Por favor.

Ninguém diz nada, e não sei se é um bom sinal.

-Por que você vai embora, Lolli? Ainda tenho que te mostrar o que ganhei! - Miguel diz e faz uma carinha fofa.

-Eu preciso mesmo ir, Miguel. As meninas estão na praia e me chamaram pra um luau. – Ela segura sua mão. – Prometo que volto amanhã e brincamos o quanto você quiser.

-Poxa...Eu posso ir junto? - Ele tenta insistir.

-Quem sabe quando crescer mais um pouco? Falo com sua mãe e passamos a noite fora, que tal?

-Acho que dessa vez passa, porque estou ficando com sono. – Ele diz e a abraça. – Te espero amanhã, bem cedinho. Mas sem ficar com meu irmão.

Acompanho tudo sem dar um pio. Talvez essa seja a reação mais adequada.

-Dia do Miguel e da Lolla decretado. Até amanhã, pequeno. – Ela beija sua testa e ele sobe as escadas.

-Tchau, Lollita. – Acena e vai pra seu quarto.

Destranco o carro e abro a porta do carona, deixando-a entrar e dou a volta. Ligo o carro e quando paramos no sinal a encaro e vejo sua cabeça apoiada no vidro.

-Só precisa me deixar na praia, avisei Aysha que chegaria rápido. Estão me esperando.

-Pode me falar porque está fugindo de mim? – Pergunto e seus olhos fecham por alguns segundos e ela os abre. – Já pedi desculpa, estou realmente arrependido.

-Pedir desculpa não vai mudar o que você falou e como suas palavras me atingiram.

-Eu... Eu sei. Vou ficar contigo aqui.

-Não. Não vai, não. – Sinto a frieza em sua voz. – No momento, nem consigo te olhar.

Nunca pensei que ela pudesse me atingir com tanta força. Suas palavras doem e atingem meu peito, mas, de alguma forma, sei que é tudo culpa minha.

-Acho que você precisa de tempo. – Falo e ela parece sorrir, satisfeita. – Quando e se quiser conversar, me liga. Ou melhor, Podemos falar lá em casa enquanto Miguel dorme.

-Preciso pensar. Depois pensamos nisso. Agora, tchau. – Tira o cinto. – Obrigada pela carona.

Não consigo responder, fico totalmente sem forças e minha boca fica seca.

Nenhum beijo. Nenhum abraço. Nenhum olhar. Nem ao menos um sorriso.

E ela está certa.

Porque eu errei.

Lolla sai do carro e a vejo correr para os braços das amigas. Observo por um tempo e desligo o motor. Vejo seus cabelos de longe, sua maquiagem perfeitamente bem feita, combinando com seu vestido azul celeste na altura dos joelhos. Suspiro quando ouço sua risada e acabo a acompanhando do carro.

Chego em casa e a porta do quarto do meu irmão está fechada e a luz, também.

Pego um copo de água na cozinha e deixo-o sobre a pia. Depois, troco de roupa e encaro o teto de minha cama. Em pensar que poderia estar ganhando carinho dela agora, se não fosse pela minha grosseria sem limites, ela estaria em meus braços nesse momento. Ou então, estaríamos fazendo amor. Nem sei mais se vou sozinho pra Miami e eu realmente não quero ir se essa for a única opção. Não sairei daqui até tudo estar resolvido.

Com esses pensamentos, sinto meus olhos arderem e lágrimas descerem quase que instantaneamente. Eu choro. Por tudo que causei. Por estragar o nosso primeiro natal juntos. Por acabar com um clima maravilhoso. Porque não consigo controlar minhas reações.

-Mas que merda. Você é um otário, Josh Andrews. Olha o que fez, seu descontrolado. - Falo para mim mesmo em voz alta e o arrependimento me consome.

Soco o travesseiro uma, duas, três vezes e viro de lado.

Into YouOnde histórias criam vida. Descubra agora