✰000 - prologue✰

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Minha clichê história começa como qualquer outra história clichê. Meu pai largou minha mãe alguns meses depois de eu ter nascido e os anos seguintes foram dolorosos e difíceis para que tivéssemos comida em casa.

Então meu padrasto apareceu. Ele era como o príncipe dos contos, nos dava amor e moradia. Tudo estava perfeito. E sim, eu também estava receosa com ele, mesmo com meus 10 anos. Porque para quem cresceu a vida inteira sem nada, começar a viver uma utopia parecia muito estranho.

Mas não foi ele o problema, e sim seu filho. Nick era seu nome, ele tinha dezesseis anos e era uma graça com seus olhos azuis. Ele adorava brincar comigo e me fazer consquinha, como um verdadeiro irmão. Minha mãe não notava nossa proximidade, afinal ela estava feliz demais para deixar esses pensamentos lhe afetarem.

Eu me lembro do primeiro dia que ele me molestou. Nossos "pais" tinham saído, e nós estávamos brincando de boneca, até suas mãos entrarem por baixo do meu vestido.

Quando ele percebeu que eu não abriria o bico, as mãos deram lugar a algo muito mais nojento. Minha respiração está falhando enquanto lembro disso. Durante um tempo eu só desejava me jogar da escada para ver se talvez minha cabeça acertasse uma quina e eu esquecesse disso tudo.

Eu estava assustada e recolhida, tinha medo até mesmo da voz da minha mãe. Ela não percebeu isso, e Nick achou que ninguém perceberia. Eu também pensava nisso.

Mas como sempre há um clímax em histórias clichês, Klark, meu padrasto, avisou que iria ao mercado, e quando ele fechou a porta, não demorou nada para a coisa toda recomeçar. Só que a porta se abriu alguns minutos mais tarde, revelando ele e minha mãe, enquanto Nick tirava minha saia.

Nick levou uma porrada tão forte no rosto que vi seu corpo atingir a parede, minha mãe me agarrou e me abraçou com tanta força que podia ouvir meus ossos estalando. A partir daí eu não me lembro mais, só alguns flashes confusos que eu agradeço por não recordar.

Meu padrasto mandou Nick a um reformatório ou algo assim, mas eu ainda não estou preparada para tocar em seu nome e perguntar seu paradeiro.

Minha vida virou um lixo. Eu virei um lixo. Minha utopia distorcida virou uma distopia suicida. Mamãe entrou em estado vegetativo, mal sai da cama desde o choque, fica vagando pela casa com suas olheiras profundas, negando qualquer remédio ou tratamento.

Novamente, Klark foi minha saída. O príncipe se transformou em um sapo bêbado, mas que me ajudou muito. Com suas palavras secas e uma garrafa de vodka, eu e ele seguimos, endurecidos, desconfiados e, acima de tudo, fortes. Ele me fez estar aqui ainda, e mesmo gastando meu dinheiro em bebidas com gosto azedo para que eu não possa roubar um pouco, eu ainda devo muito a ele.
Como Haymitch ajudando Katniss.

Só que eu não sou o Tordo. Ou a garota em chamas. Ou alguém que faz algo útil para a sociedade. Não.

Meu nome é Annabeth McLean, e eu estou beirando o abismo da insanidade, louca para pular. Venham crianças, venham se juntar a seus pesadelos e a falta de amor próprio. Vamos todos nos juntar em uma grande roda e contar quantos vezes por dia você quis se matar. Quero te contar meus desejos sombrios e meu passado nojento. Me dê sua mão e eu te levarei até o final dessa trilha.

Não se assuste com isso, afinal, isso é só um clichê. E clichês são tão nojentos quanto eu mesma.

ruined innocence ➳ matthew espinosaOnde histórias criam vida. Descubra agora