Vermelho Vivo

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Maia terminou a pintura, cantarolando a melodia que escutara antes de se mudar

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Maia terminou a pintura, cantarolando a melodia que escutara antes de se mudar. Na tela havia uma forma como um desenho feito a partir de machas simétricas, similar a um teste de Rorschach, poderia parecer um buquê de rosas, um útero ou um corpo deformado, com os braços abertos, em tons de rosa, vermelho, amarelo, roxo e azul. Ao olhar para o desenho, a pintora sorriu com ironia, amarrando os cabelos.

Fechou os olhos e negou com a cabeça. A inclinou para a direita até estalar, depois a esquerda e, assim, ficou. Cantarolando. Coçou a bochecha e esfregou a orelha esquerda. Abriu os olhos, anuindo e sorrindo. Riso que se transformou em gargalhada e, por fim, choro. Limpou as poucas lágrimas e soltou o cabelo.

Olhou para trás, onde havia um bloco de mármore negro que, segundo o grande calendário pregado na parede, esculpiria nos próximos meses, seria a maior e mais importante peça de sua exposição. Todos os dias no calendário, de feriados a fins de semana, estavam dedicados à exposição Melodia Secreta. Andou até sua mesa de trabalho, pegou um dos rascunhos desenhados naquela noite, a base para a pintura recém pronta, amassou e jogou no lixo. Em sua planilha, ao lado de "Sombra da Vida", nome da pintura, escreveu: quase pronta.

Encarou o grande bloco e os materiais, do martelo aos equipamentos de proteção, se aproximou e tocou na pedra fria e lisa, brilhante, com suas belas estrias brancas, que lembravam ondas quebrando no mar a noite. Bocejou tão forte que chegou a lagrimar e piscou os olhos várias vezes. Foi até a saída, apagou a luz e trancou a porta dando duas voltas com a chave.

Seu telefone vibrou no bolso, Maia estalou a língua ao ver que era sua irmã quem ligava, demorando alguns segundos para atender.

— Alô, — falou, o olhar vazio encarando a parede.

— Maia! Até que enfim atendeu, já deve ser a milésima vez que te ligo hoje. — Lara tossiu.

— Desculpe, passei o dia inteiro trabalhando.

— Não atendeu a semana inteira, Maia... Mamãe tá preocupada, faz mais de mês que não visita e mal liga.

— Estou ocupada, quando terminar as peças da exposição vou ter tempo. — Maia enxergou uma formiga no chão e começou a acompanhar seu caminho, bocejando.

— Cê tá estranha, mana, — Lara acusou.

— Olha, só tô cansada. Tô desdás seis da manhã trabalhando e venho trabalhando todos os dias, não tô com muito tempo pra fazer visita, será que é difícil assim entender?

— Ok, tudo bem. — Lara respirou fundo o suficiente para Maia escutar. — Hm, já se acostumou com a casa?

— Já, né. São três meses aqui, já.

— Tudo isso? — Lara pareceu realmente assustada.

— Já. — Maia bocejou e bufou. — Olha, mana, amanhã eu te ligo, ok? Já tá tarde e eu tô muito cansada.

Canções Submersas (AMOSTRA)Onde histórias criam vida. Descubra agora