Heitor parou no meio da sala, retirou os sapatos e meias, deu um suspiro longo e sorriu, esticando os dedos dos pés. Tirava o paletó quando a televisão ligou sozinha, chiando alta e sobressaltando o rapaz. Sua respiração acelerou, os olhos caçavam alguma presença de vida em volta e, diante da solidão, franziu o cenho.
- Maia? - gritou.
Só o silêncio o respondeu.Pegou o controle e desligou a televisão. Riu baixinho, puxando o nó da gravata. A televisão voltou a ligar, fazendo Heitor saltar, fechando os punhos, ele bufou e pegou o controle da mesinha, porém, antes que desligasse a TV mais uma vez, os canais começaram a passar. A respiração ficou gradativamente mais pesada, suor escorria pelas costas e laterais da cabeça, enquanto a face se contorcia numa careta. Sua mão apertava o controle com força e os dedos dos pés esfregavam-se uns nos outros.
A TV parou no canal que mostrava todas as câmeras de segurança da casa. Tremendo, ele se aproximou e estendeu o controle, abrindo cada uma das miniaturas e olhando o ambiente. Cozinha, jardim, área de serviço, escritório. Todos estavam em perfeita ordem, engoliu em seco, abrindo a última câmera. Ao olhar a imagem da oficina onde trabalhava Maia, seu corpo se retesou e o rosto perdeu o sangue e a expressão. Correu, largando o controle no chão.
Seus pés frearam na porta do local, o corpo tremia e as mãos suavam, tanto que escorregavam na maçaneta. Tocou na medalha fria da Virgem Maria que trazia no peito. O barulho frenético das batidas de seu coração e sua respiração entrecortada eram tão altos que ele não conseguia escutar mais nada. Respirou fundo e abriu a porta.
O lugar estava escuro. O cheiro de tinta, cola e serragem era forte, pinicava o nariz e os olhos de quem estava desacostumado. Dessa vez Heitor não olhou para os quadros, ou mesmo as belas esculturas que Maia fazia com tanto carinho. Não. Dessa vez ele olhou apenas para o corpo de sua namorada estirado no chão.
- Não... - sussurrou, a voz descrente.
Maia, os cabelos negros espalhados, o sangue, preto por causa da escuridão da oficina, ainda escorrendo pelo tablado. A única luz que lhe permitia ver o horror que estava acontecendo era a do corredor. Entrou no local aos tropeções, já com lágrimas nos olhos. Se ajoelhou ao lado de sua namorada, e a puxou do chão com força para perto do peito. Estava tão ensopada de sangue que ele nem conseguia ver o que a tinha ferido. Um grito quis escapar de sua garganta, mas ficou preso. Apenas soluços silenciosos eram escapavam do homem no aposento.
A porta fechou atrás dele num baque leve, quase imperceptível. Quase.
Heitor virou-se, os olhos arregalados, tentando ver ao algo no breu. Seu coração batia com força contra sua caixa torácica e a respiração, apesar de pesada e entrecortada, era silenciosa. Se agarrou mais ao corpo de Maia, de forma defensiva, mas luzes ligaram de repente e Heitor começou a piscar, espremendo os olhos, na parede em que ficava a porta, uma frase estava escrita em tom escarlate, o do sangue dela:
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Canções Submersas (AMOSTRA)
HorreurPortas trancadas, nenhum sinal de arrombamento, nenhuma testemunha. O edifício Belo Paraíso foi interditado. O início da decadência se dá por um desaparecimento, seguido de uma série de acontecimentos macabros e sem explicação, que transformaram a p...