Epílogo

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Há algo de muito peculiar nas partículas mínimas do universo. São partículas invisíveis que levam internet Wi-fi para a casa de Jade.  São partículas invisíveis que levam internet Wi-fi para a casa de Isaac. A partícula de ar que respiram é a mesma e, naquela tarde no Hyde Park, era ainda mais. Estavam lá, quase frente a frente, sentindo as mesmas partículas de água começando a formar uma chuva torrencial. Mas, no instante seguinte, as mesmas partículas responsáveis por os aproximar conseguiram separá-los, muito mais do que poderia ser imaginado. Isaac percebeu que dói muito mais perder o que está diante de seus olhos do que o que estava longe, mas esse era justamente o problema. Jade sempre estaria diante de seus olhos, não importava qual o número de partículas que os separavam fisicamente. Talvez por isso o desencontro fosse tão frustrante.

Talvez por isso um simples cadarço desamarrado pudesse ser tão odiado pelo garoto. Fora o cadarço que o impedira de correr atrás de Jade, pois o fez cair no exato momento em que chamou a garota. E ele tentou se recompor no momento seguinte, mas a frustração era tanta que demorou uma eternidade para amarrar seu tênis. E perdeu Jade de vista.

Foi trágico.

Imagine: Perder a garota no momento em que a encontra! Por causa de um simples cadarço! Imagine a frustração do jovem italiano! Mas a frustração dele nunca se compararia a dela, concluiu o rapaz ao correr. Imagine: Você descobre que o cara que ama foi te encontrar em um parque, mas te desencontrou por causa de um simples cadarço! Você perdeu a oportunidade de olhar nos olhos do amado porque um cadarço o desestabilizou. Ele estava lá, te olhando, mas você não o viu! Imagine a frustração da jovem inglesa!

Mas as partículas ainda estavam a favor deles.

Partículas de água caíram sobre os dois, os obrigando a entrar na estação de metrô mais próxima. Jade foi a primeira, molhada o suficiente para sentir as roupas um pouco pesadas. Isaac veio um minuto depois, correndo em desespero. Não podia perder aquela oportunidade única! Estava completamente encharcado, mas quem ligava? Ele só precisava encontrar Jade; precisava descobrir se seus sentimentos por ela eram reais ou não. Mas quando teria chance de fazer isso?

A resposta era simples e curta: agora

Ele olhou para baixo nas escadas, Jade se posicionava na plataforma, esperando o próximo metrô. Algumas pessoas e partículas de ar os separavam. Principalmente as partículas de ar, pois o vento indicava que o próximo trem estava chegando. E as pessoas estavam na sua frente! Era gente demais e ninguém lembrava de deixar as escadas livres para os apressados. Devia estar faltando algumas partículas de ar no cérebro daqueles seres humanos. Isaac entrou em pânico. Tentou desviar do máximo de pessoas que pôde, mas ainda havia gente demais. Gritou, pedindo licença. As pessoas deram, não muito felizes com sua educação, mas isso ainda não era suficiente. Jade estava entrando no vagão.

— Jade! — O italiano gritou, correndo o mais depressa que pôde. A garota se virou, mas o choque a impediu de sair do vagão. O coração de ambos estava acelerado. As pessoas ao redor não estavam satisfeitas com as partículas de água que Isaac espalhava ao correr. Ele também não, já que escorregava a cada passo. Só não podia deixar tudo aquilo o impedir. 

Jade prendeu a respiração.

Isaac escorregou, mas não deixou de correr.

Jade abriu a boca para dizer algo, mas o sinal de fechamento das portas a impediu.

Foi tudo muito rápido. 

E também foi tudo muito demorado.

Isaac escorregou em sua corrida. Amaldiçoou a água, mas percebeu em seguida que não seria nada sem ela. O escorregão o deu um último impulso, fazendo-o entrar no vagão.

Fazendo-o quase cair nos braços de uma garota inglesa.

Fazendo-o respirar as mesmas partículas de ar que a inglesa.

Jade piscou.

Isaac pensou em dizer algo, mas lhe faltava fôlego.

Jade sorriu.

Isaac fez a única coisa que lhe cabia.

Os dois se abraçaram, ansiando pelo toque do outro. Era como se fossem amigos de longa data. E o que os impedia de ser? Sabiam o suficiente.

— Achei que ia te perder. — Sussurrou ele, afastando-se para olhar o rosto da garota. E tropeçando, pois era difícil ficar em pé em um vagão em movimento. — Parecia que as circunstâncias iam nos separar. 

— Nada no mundo pode nos separar! — Foi a primeira coisa que Jade disse para Isaac. Os olhos dela brilharam com a veracidade das palavras. Poderia ter perguntado o que ele fazia ali, ou como a encontrara. Ou qualquer outra coisa comum. Mas não. Não precisava. Precisava apenas deixar claro o que enxergava como verdade.

— Nem a distância? — Ele perguntou, receoso. Estava com medo de ter se esforçado tanto para acabar com nada. Ela pegou a mão dele e colocou sobre uma barra de ferro. E sobre a mão dele estava a dela. Era para não caírem, claro, mas havia mais do que apenas isso. O coração de Isaac estava descompassado. O coração de Jade estava calmo, apesar da arritmia. Ela sabia que estava onde devia estar.

Jade não se preocupou em responder à pergunta de Isaac. Não era necessário! Contentou-se em colar seus lábios aos dele, de forma carinhosa. Era uma promessa de conexão eterna, independente do que estivesse acontecendo entre os dois. Não importava que os dois haviam se conhecido em um jogo, muito menos que eram de países diferentes. Não importava que aquele beijo tivesse completa falta de lógica, pois não há lógica nos sentimentos. Há beleza. E não importa quanto tempo demore para um sentimento bonito nascer, importa o fato de ele ser eterno. Importa quem o sente. Importa como se sente. Importa o quanto se sente. E, naquele momento, Isaac e Jade sentiam muitas coisas, com uma intensidade incomparável.

Fecharam os olhos. Jade encostou a cabeça no pescoço de Isaac e lá ficou, em silêncio. As palavras não eram necessárias. Precisavam economizar partículas de ar para todas as juras de amor que fariam no futuro.

Sorriram.

Uma partícula de água desceu pela testa de Isaac, deslizando logo em seguida para bochecha de Jade. Não há como saber se era da chuva ou do choro, mas esse detalhe tão pouco importa. Outras partículas seguiram essa, passando de um para o outro. Os corações estavam em sintonia. Parecia tudo certo naquele segundo. E estava.

Outra partícula de água passou dele para ela, silenciosamente, delicadamente; conectando-os da mesma forma que as partículas da internet fizeram nos meses anteriores.

Para sempre.


FIM

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