4. Sara, a fortunada!

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— Ainda acordada, Gulsum Kalfa. — Jamal diz a alcançar a mão para o Lokum, um sortido de doces de gelatina e nozes. Mas recebeu um tapa na mão.

— Mãos longe do rahat ul hulkum da Valide Sultana. —

—A Valide já está a dormir. — Jamal protesta se questionando para quem era aquela bandeja que parece mais para o Sultão e a sua família inteira.

— Ela comerá amanhã. — Gulsum Kalfa retruca e o encara em defesa do seu lanchezinho da meia-noite.

— Ai, Gulsum Kalfa, só um. —

—Devia estar à procura daquela rebelde que desapareceu do nada. — Gulsum Kalfa reclama.

— Lazima ainda está em frente a porta, de novo. — Jamal responde e Gulsum suspira a abanar a cabeça. Era a terceira noite que ela fazia aquilo.

— Só veio causar-me problema, essa menina. — Gulsum Kalfa encena um choro de angústia, já sentido o teto de Topkapi cair sobre a sua cabeça se Lazima se decidir a fazer mais do que sentar somente em frente àquela porta.

— Eu vi que se emocionou no outro dia, até pensei que tivesse entendido a língua.

Gulsum Kalfa franze os seus lábios, pensativa. — A Angústia, qualquer um pode entender. Ela tem de aceitar a sua nova realidade, só isso. —

—Não acredito que será fácil aceitar que ontem ela era a filha de um rei e hoje é simplesmente uma escrava. — Jamal frisa. Era muita das vezes difícil para uma simples burguesa, imagina para uma monarca. Ele era o único ali que entendia a melancolia nas palavras de Lazima sempre que ela se lamentasse.

— Não poderá fazer birra para sempre. — Gulsum Kalfa dá de ombros.

Jamal se aproveitou da sua distração para levar um doce. Quando a mulher vira para levar a bandeja, nota e logo se volta para ele o dando uma surra com o pano que tinha na mão.

—Jamal Agha, saia da minha cozinha, é já. Fora, vai buscar Lazima. —

Ele saiu a rir e divertindo-se com a senhora que tinha coração mole, mas agia com dureza inexistente.

Quando ele, não mais estava ali, ela pegou o seu lanche, que dizia ser para a Valide e foi-se sentar num cantinho para degustar da paz que finalmente descera dos céus, quando estava todo o mundo se recolhendo.

Lazima se sentava a olhar para porta por onde ela entrara pela primeira vez. Jamal a viu de longe e aproximou-se dela devagar, olhou para ela e depois abriu a porta.

Lazima olhou para porta e depois para ele. Se levantou e hesitou antes de sair. E ali ela puxou o ar para dentro dos seus pulmões. Ela podia finalmente respirar, mais uma vez.

Jamal se sentou na entrada e Lazima olhou para trás para tentar o entender.

— O que vais fazer com a liberdade? —

—Regressar. — disse cheia de certeza, e Jamal se riu.

Jamal estendeu a sua mão e a mostrou o doce que tinha na mão. Lazima o olhou hesitante, e levou.

— Eu não estou habituada a ficar presa. —

—Ninguém está. Se quiser pode fugir agora, e o sultão vai encontrar-te e colocar-te na masmorra ou matar-te. — Jamal sorria, como se aquilo fosse engraçado. — Ou pode ficar, conquistar alguma simpatia e aprender como pode sair daqui com dignidade.

— Neste lugar não há dignidade. Eu sou uma mulher livre. —

—É tudo que posso aconselhar. Seria uma pena se algum desfortúnio te tocasse. —

A Rainha do Harém [Desgustação]Onde histórias criam vida. Descubra agora