Assim que os pacientes foram dispensados da fila de medicamentos, alguns médicos apareciam e chamavam aleatoriamente os demais para as sessões em grupo. Clarissa detestava ter que participar disso, mas era inevitável. Não tinha vontade de sair daquele lugar e as sessões eram como comida em um deserto. Tornava-se indispensável.
A sua frente, o enfermeiro da ala cinco acompanhava a psicóloga Letícia, enquanto o Psiquiatra seguia a frente deles. O refeitório era pequeno, então não fazia tanto comodismo como seria necessário. O segurança que anteriormente tentou forçar Clarissa a entrar na fila, agora lhe fitava com um sorriso escondido entre os lábios.
( Babaca. ) Pensava ela.Seguindo pela sala principal, os demais se separaram pelo corredor. A psicóloga Letícia e o psiquiatra Paulo parou lendo uma lista com nomes e conferindo se estavam todos ali. Clarissa os acompanhou até a sala onde geralmente eles têm sessões em grupo. Mesmo detestando a ideia de ficar por uma hora ali, se sentiu melhor em saber que com a psicóloga ali, o Psiquiatra dificilmente lhe provocaria algum mal.
Conforme entravam, cada um estava sentado em um lugar. Clarissa como sempre se sentava o mais longe possível dos outros. Puxou uma cadeira e foi para perto de uma janela no fim da sala. estavam em quatorze pacientes, mais o psiquiatra e a psicóloga. Os olhares corriam pela sala, e a psicóloga fitava Clarissa com uma expressão de felicidade. Enquanto Paulo sorria como um predador.
- Olá a todos. Bom dia. - Dizia Leticía sendo simpática para com todos.
- Estamos aqui novamente para outra sessão em grupo. Sou a psicóloga Leticía e este é o Doutor e Psiquiatra Paulo. - Disse ela, passando a vez a seu colega que fingia ser cortês.
- Bom dia. Temos um novo paciente entre-nos, gostaria que todos fossem receptivos e civilizados. - Enfatizou soando como uma ordem autoritária.
- Como tem sido essa semana para vocês? Alguém gostaria de começar? - Perguntou a psicóloga correndo os olhares entre todos da sala.
- Ninguém? Então vou escolher. - Comentou Paulo com uma expressão falsa de desapontamento. Continuou:
- Eu escolho. - Fez um suspense e demora olhando cada um da sala. A maioria não parecia entender nada, enquanto poucos expressavam algum sentimento. - Bruno. - Disse ele por fim, acabando com a tortura dos demais.
- Aqui. - Levantou a mão. Ele era um homem de aproximadamente trinta anos, um pouco calvo, com olhos esbugalhados, roía as unhas e parecia em pânico.
- Como tem sido sua semana Bruno? - Perguntou a psicóloga Leticía sentando-se confortavelmente em uma cadeira e esperando que o paciente falasse para começar suas anotações.
- Tem sido triste. – Comentou desanimado. Mas algo parecia estar incomodando lhe muito.
- Isso é mau, mas é melhor do que péssima. Quer nos dizer o porque acha que esta mal, ou o que lhe deixa triste? sente mais alguma coisa? Aconteceu algo em particular que o deixou assim? - Perguntou ela olhando para Bruno com um olhar caridoso e de pena.
- Sim, Sim! Meu urso foi roubado. - Disse ele triste.
- Seu urso? - Perguntou confusa.
- Sim, Bruno tem um Urso de pelúcia com quem conversa e tem relações interpessoais. - informou o Psiquiatra Paulo, bufando da falta de conhecimento da psicóloga recentemente admitida.
- Certo. Desculpe, ainda estou tomando conhecimento dos casos e dos pacientes. - Tentou se explicar inutilmente. O doutor já lhe ignorava e seguia com as perguntas.
- Porque acha que foi roubado? - Perguntou Paulo ao Bruno, que estava ficando nervoso.
- EU tenho certeza que foi! E sei quem roubou. - Disse ele em tom ameaçador se levantando da cadeira.
- Acalme-se senhor. Por favor, sente-se. - Pedia Leticía tentando tomar controle da situação que rapidamente se desencadeou em confusão.
- Foi ele! Seu verme miserável. Ele roubou meu Ursinho! - Gritava Bruno apontando para um homem a frente de Clarissa que era catatônico.
- Isso não tem graça Bruno. Você sabe muito bem que Fernando é catatônico. - Paulo o repreendeu como se fosse um menino mal que desobedece ao pai.
- Ele finge ser catatônico! Eu o vi andar a noite pelo quarto e fugir para o banheiro com a minha Betty! Seu safado ordinário! - Gritava o homem pulando em direção do homem catatônico.
- Bruno! Contenha-se! - Exigia o Dr, já se levantando e indo até a porta muito rapidamente. Gritou para os seguranças:
- Aqui, preciso de ajuda! - Gritou ele escancarando a porta.
Os dois seguranças estraram muito rápido, correndo entre os demais pacientes até chegar a Bruno que batia violentamente no homem que estava paralisado. Clarissa se levantou e seguiu para o outro canto da sala, tentando se manter o mais longe daquela confusão. Alguns pacientes começaram a chorar e outros dois a brigar. Infelizmente havia alguns ali que realmente não tinham consciência do que estavam fazendo.
Leticía tentava acalmar duas senhoras que choravam e batiam a cabeça na parede, enquanto o Dr. Paulo saía rapidamente da sala chamando alguém no corredor. Clarissa não ficou surpresa, já era experiente com esse tipo de situações. Não que estivesse numa boa com aquilo tudo, mas também tinha esperanças que tudo acabasse logo para ser dispensada daquilo.
Em poucos instantes o psiquiatra estava de volta com um enfermeiro que segurava uma seringa. Enquanto os seguranças seguravam bruno de forma que parasse de se mexer, o enfermeiro passava a injeção ao doutor que lhe injetava na veia. Sem qualquer delicadeza. Na sala, alguns gritavam e a psicóloga não sabia ao certo o que fazer. Muito de repente Bruno foi parando de resistir e fechou os olhos, caindo no sono. Os homens o levaram e com certeza iria para o castigo.
- Sessão encerrada. Vamos, cada um para seu quarto. Agora! - Gritava Paulo saindo da sala, e seguindo os demais seguranças e enfermeiro que levavam bruno.
- Em fila, por favor, mantenham a calma. - Pedia a psicóloga tentando acalmar os poucos que ainda estavam aflitos.
Todos saiam da sala, seguindo um atrás do outro, e por ultimo Clarissa sem nenhuma pressa. Em seus pensamentos ela sabia que iria para o quarto, mas a vontade de passar pela biblioteca era maior. Tentou planejar um jeito de não ser acompanhada até o quarto por algum segurança e se convenceu que a melhor forma era passar despercebida. Mas a grande pergunta que não calava era: Como um paciente podia não chamar atenção? O lugar era cercado de guardas e câmeras. (Eu vou me arrepender disso. Provavelmente.) Pensou ela tomando coragem antes de se espremer pela porta e gritar em alto som:
-Arranha!!!
Ela passou agachada entre as duas mulheres de idade que estavam na porta, elas começaram a gritas e se jogar em cima da psicóloga. No meio do agito, as três caíram enquanto os demais gritavam correndo pelo corredor. Clarissa saiu andando apressada, conseguindo passar pelos seguranças que corriam até a psicóloga para ajudar. Riu baixinho, seguindo o caminho da biblioteca.
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Além do Tempo
Lãng mạn" As vezes a morte leva aquilo que mais amamos, e cabe a nós decidir o que fazer com o que ela deixou para trás". Uma professora de História perdeu o amor da sua vida. Após alguns anos conturbados em luto, ela finalmente entende que a vida é preci...