10. O MOMENTO DA ESCOLHA

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Ambelle 

Eu nunca fui uma boa jogadora. 

Apesar de ganhar sempre na primeira partida, a má sorte parecia um cavalo desgovernado depois disso, atropelando toda a esperança que tivesse a audácia de se colocar a sua frente.

Não, eu não estava sendo irônica, muito menos modéstia. Não sei o que raios aconteceu comigo durante aquela noite, o vento parecia estar mais frio que o normal e todos pareciam com energia de sobra, Freyja convenceu o marido a ficar na fogueira até mais tarde, Cloe conseguiu a mesma proeza. 

Uma noite de jogos! Foi isso o que disseram. Talvez fosse a ansiedade inquieta que me sufocava que me fez concordar em ficar.

Não sei o que me deu, eu melhor que ninguém deveria conhecer minha inutilidade para tal passa-tempo, mas de qualquer forma ali estava eu. Sentada em meio aquele bando de abutres, loucos para me verem desistir primeiro.

"Parem de olhar pra mim!" Falei irritada. O bico que se seguiu ao término da frase foi inevitável.

Richard bufou. Não sei porque ele decidiu participar disso também, estava claro como uma poça de lama o quanto ele era bom naquilo.  Agora sim eu estava sendo um tanto irônica.

"É a sua vez de falar. Vamos conte algo assustador que já viveu!" Ele provocou me fazendo suspirar impaciente. Ele podia ser lindo, mas sua grande idiotice supera isso.

Não sei se o que me chateava mais era o fato de meu noivo zombar de mim a cada chance que tinha, ou o simples fato de estar noiva dele. Levei pouco tempo para notar que Richard era mais sapo que príncipe, e eu tinha uma grande histórico de ódio com os sapos!

"Imaginem um campo, ou melhor, um vale entre uma encosta rochosa e montanhas enormes." Comecei, já podia ver algumas pessoas revirando os olhos para minha história. Como se eu fosse incapaz de viver uma aventura! Audaciosos, era isso que esses abutres eram. "Agora pensem em observar todo esse vale repleto de pequenas fogueiras vistas de longe, a noite completamente negra e silenciosa ao seu redor... o som de ossos sendo partidos... rosnados," sorri afetadamente. "Agora imagine que a única coisa que divide um exército negro do mundo mortal é..."

"O jovem lobo?" Richard gargalhou com desdém, dando motivo para que outros também fizessem isso. Estreitei os olhos irritada. "Todos sabemos que você não sai das saias de sua mama, não precisa ficar criando histórias Ambelle."

Senti minhas bochechas arderem, mas não de vergonha, ódio sim, isso era bom o suficiente. Ódio por ser humilhada daquela forma na frente de todos, por meu noivo, ser taxada de mentirosa assim tão fácil.

"Eu não estou criando nada!" Falei irritada. Afirmei batendo o pé, o que só fez com que Richard risse mais.

Freyja me olhou com o rosto levemente pálido, talvez percebendo enfim como eu iria me casar com alguém que não dava a mínima para os meus sentimentos.

"É claro que sim meu bem." o sarcasmo gotejava.  Levantando o mesmo se aproximou de onde eu estava. "Vou levá-la agora, antes que sua mama venha buscá-la."

Sua voz doce e sorriso caloroso eram uma bela máscara para disfarçar a provocação oculta de que eu não passava de uma criança. Uma criança mentirosa. Sorri, porque era exatamente isso o que esperavam de mim, e deixei que ele me guiasse entre as árvores até a pequena trilha que levaria ao acampamento. Agradeci aos céus silenciosamente, se não tivéssemos parado na tribo eu só teria conhecido Richard no dia do nosso casamento como pede a tradição do clã dele.

O encanto dos primeiros dias só atrasaram a profunda insatisfação que veio logo depois.

Caminhamos em silêncio, Richard não era muito bom em conversar e eu também não fazia a menor questão de falar com ele nesse momento. As árvores se abrindo logo a frente no começo de uma clareira, as flores ainda pequenas, algumas já estavam esmagadas. 

Conectados Por Essência | DEGUSTAÇÃO |Onde histórias criam vida. Descubra agora