Prólogo [Parte 2]

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Atrás do distrito comercial, um outdoor com os dizeres "Tudo à Venda" chamava a atenção num edifício recém-construído. Nakajima caminhava em linha reta, olhando para baixo e movendo os lábios continuamente. Para qualquer pessoa que passasse, ele pareceria um estudante comum, perdido em concentração para tentar memorizar algo para uma prova. Mas as poucas pessoas que ouviam um fragmento das palavras que ele estava falando se viravam e o direcionavam um olhar de suspeita. Isso porque elas pareciam um recital baixo e hostil de uma magia negra, e isso não é exatamente algo que se espera ouvir de um estudante do ensino médio. Uma flor de cerejeira caiu de um muro de concreto próximo e encostou na bochecha de Nakajima, mas ele a ignorou e continuou andando, com os olhos fixados no chão. Quando finalmente olhou para cima, ele estava na frente de um edifício residencial excepcionalmente alto.

Colocando a chave eletrônica na fechadura, as portas de vidro automáticas se abriram com um som pesado. A entrada do prédio era decorada com um extravagante mármore canadense, mas ainda parecia um tanto artificial. Uma vez lá dentro, Nakajima respirou fundo e endireitou o corpo.
Nakajima entrou no elevador e apertou o botão do 13º andar. Com a mudança na pressão atmosférica, seu corpo começou a tremer, lembrando-o do desagradável acontecimento da tarde. Uma placa de cobre com a palavra “NAKAJIMA” estava fixada na porta do apartamento 1302. Nakajima tocou a campainha, mas ninguém atendeu. Deixando escapar um suspiro, destrancou a porta.
Abrindo a porta e entrando, Nakajima tirou os sapatos, jogou num canto qualquer e foi para o banheiro. O lábio ferido do rosto no espelho inchou como um balão, e estava um tanto desagradável de se olhar. Sua bochecha esquerda também tinha um hematoma amarelado.
Depois de se olhar um pouco no espelho, Nakajima abriu a torneira e molhou o rosto. Voltando à sala de estar e desabando no sofá, percebeu um bilhete na mesa de canto.

"Vou demorar numa reunião. Esquente o jantar no micro-ondas"

Nakajima amassou o bilhete sem terminar de ler.

— Se vai usar a mesma desculpa velha, devia tirar uma cópia de uma vez.

Depois que o pai de Nakajima foi transferido para a sede da empresa em Los Angeles, sua mãe ficou cada vez mais envolvida com o seu trabalho de designer. Às vezes ela só chegava em casa de madrugada.

Ao imaginar o rosto da mãe, a raiva contida de Nakajima de repente se acendeu. Bem naquele momento, o telefone tocou. Claro que devia ser a mãe dele. Deixando o telefone tocar, Nakajima abriu a porta do seu quarto.

O quarto de Nakajima era um tanto sem vida, sem um único enfeite ou pôster na parede. Excetuando a parede da janela, todas as outras eram cobertas de grandes estantes que iam até o teto. As estantes tinham revistas de anime e mangás, como era de se esperar do quarto de um estudante, mas um canto parecia decididamente fora de lugar. Aquela estante estava cheia de livros sobre magia e feitiçaria, com títulos como “O Livro dos Mortos” e “Manuscritos Pnakóticos”. Sobre a sua mesa de metal havia um computador totalmente equipado, e ao seu lado um livro de referência em magia chamado “A Teoria do Novo Amanhecer Dourado”. Pela aparência desgastada da capa de couro, ficava claro que o livro era muito usado.
Nakajima puxou a cadeira e sentou na frente do monitor. Ligando os alto-falantes, a voz de David Coverdale preencheu a sala. Os dedos de Nakajima começaram a voar pelo teclado.

> LIST

Inserindo o comando, um programa muito longo rolou pela tela. Acompanhando a lista do programa com olhos afiados, Nakajima começou a digitar as teclas num ritmo fluente.
Nakajima começou a se interessar por magia quando teve a oportunidade de ler “A Teoria do Novo Amanhecer Dourado”. Apesar de o livro ter uma linguagem superficial e, logo, a interpretação ser difícil e pouco produtiva, Nakajima leu até o fim. Embora o mundo da magia tivesse um apelo por abrigar um lado obscuro e sinistro, também demonstrava um realismo racional e científico. Enquanto relia passagens que lhe pareciam estranhas pela segunda ou terceira vez, Nakajima chegou a uma repentina percepção que foi quase uma epifania.

Digital Devil Story: Megami TenseiOnde histórias criam vida. Descubra agora