Sempre?

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     No dia seguinte de manhã, após ter passado uma noite na casa do pai, Jonathan sentou-se à mesa de fórmica na minúscula cozinha de Lonnie, em Indianapolis, a cidade próxima a Hawkins, comendo uma tigela de cereal Froot Loops com leite de soja e tentando ler o jornalSeu pai, Lonnie, já terminara as palavras cruzadas, e havia manchas de tinta nas páginas.

Cynthia, sua madrasta, estava na sala próxima à cozinha. Ela acendera incenso de patchuli, e toda a casa cheirava como uma tabacaria. O barulho calmante de ondas batendo e o som de gaivotas vinha da televisão da sala. Inspire pelo nariz no começo de cada contração, instruía a voz de uma mulher. Quando você expirar, produza os sons hee, hee, hee. Vamos tentar juntas.

— Hee, hee, hee — repetiu Cynthia.

Jonathan abafou um gemido. Cynthia, grávida de sete meses, estava assistindo a vídeos sobre isso havia uma hora, o que significava que Jonathan aprendera por osmose técnicas de respiração, bolas de ginástica e os males das anestesias epidurais.

Depois de uma noite quase toda insone, Jonathan ligara para o pai bem cedo naquela manhã e perguntara se poderia ficar com eles por um tempo. Em seguida, antes que sua mãe, Joyce, acordasse, Jonathan colocou algumas coisas em sua mochila e saiu. 
Cynthia aumentou o volume da televisão — aparentemente ela não conseguia ouvir mais nada por causa do barulho de sua respiração hee. Som de ondas. Um gongo soou. Você e seu companheiro aprenderão maneiras de amainar a dor natural do nascimento da criança e apressar o processo do parto,disse a instrutora. Algumas técnicas incluem imersão na água, exercícios de visualização e deixar seu companheiro levar você ao orgasmo.

— Oh, meu Deus. —Jonathan tapou os ouvidos com as mãos. Era surpreendente que ele não tivesse ficado surdo no ato.

Ele olhou para o jornal outra vez. Uma manchete estampava a página principal. Onde está Ivy Brown e os irmãos Swan?, perguntava o jornal.

Boa pergunta, pensou Jonathan.

Jonathan ligou a televisão no balcão da cozinha, ansiando por alguma distração. O canal 6 exibia a reconstituição do assassinato de Barb — Jonathan já tinha visto aquilo duas vezes. Ele mudou de canal. No canal seguinte, um policial conversava com alguns repórteres. Ele vestia um pesado casaco de lã azul-marinho forrado de pele, e havia pinheiros às suas costas. Parecia que aquela entrevista estava acontecendo na beira da floresta que margeava o laboratório. Na parte inferior da tela, uma legenda dizia: Barbara Holland viva?

Jonathan se inclinou, o coração palpitando.

Quando Jonathan olhou para a televisão outra vez, estava passando o comercial de uma loja de móveis que estavam em liquidação chamada The Dump. Ele olhou para o telefone sobre a parede, dando-se conta de que havia uma ligação que deveria fazer. Eram quase onze horas — Nancy com certeza já estava acordada. Jonathan discou o número de sua casa. O telefone tocou uma, duas vezes. Houve um clic e alguém disse:

—Alô?

As palavras de Jonathan ficaram presas na garganta. Era Billy Hargrove. Ele parecia contente e relaxado, completamente à vontade para atender ao telefone dos Wheeler. Será que ele dormira lá e pertubara Nancy? Aí, meu Deus.

— Alô? — disse Billy outra vez.

Jonathan desligou na mesma hora.

— Jonathan?

Jonathan pulou e olhou para cima. Seu pai, Lonnie, estava de pé diante dele, usando uma camisa velha e exibindo seu típico cabelo de quem acabou de acordar. Ele sentou à mesa perto dele. Cynthia, usando um vestido de grávida que parecia um sári e sandálias de dedo, andou até ela num passinho de pinguim e se inclinou sobre o balcão.

O Demônio De BlairOnde histórias criam vida. Descubra agora