Capítulo 4: Charlie Fink.

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— Eu não sei se vou querer morar com ela.

A voz geralmente irritante da minha irmã alcançou meus tímpanos, falando algo depois dos minutos de silêncio pela notícia que ela deu. Minha única reação foi encarar a Nina esse tempo inteiro, esperando que desmentisse ou sei lá. Mas ela só deu a porra da notícia e abaixou a cabeça.

— Nem eu – soprei minha resposta, que saiu num fiapo de voz.

— Você é menor de idade. E tua mãe é ela, ou seja...

— O que? Porra de mãe!

Mãe de caralho nenhum. Lixo de mãe.

A morena se levantou e foi de passos retos e curtos para o quarto. Como sempre, a Nina fez pouco caso do que eu acho ou não. Na maioria das vezes, ela só tá cansada demais para se importar comigo. Isso inclui minhas decisões, escolhas, pensamentos e meu futuro. O qual ela também não dá a mínima. Não que eu faça muita questão também, mas a Nina realmente não liga. É um pouco difícil a minha convivência com ela, já que a minha irmã é bem egoísta. Com o passar do anos, sinceramente, ela meio que forçou cada vez ligar menos para o que ela acha. Mas tem situações ainda que é quase impossível não ficar chateada.

O Sebastian, namorado da Nina que deveria ser feito de ouro de tão rico, ficou me encarando com audácia. Os olhos dele, azuis, continham uma expressão doentia. Eram curiosos e pareciam sentir prazer em ver nós duas sofrendo por conta da Francesca. O rosto dele perguntava para mim o que havia acontecido nessa família, para a Nina chorar e eu ficar parada igual uma estatua ao saber que nossa mãe estava voltando da Europa. O Sebastian queria decifrar o que eu estava sentindo e pensando. Não era acolhedor, na verdade era mais parecido com dois cubos de gelo frios vidrados em mim e no meu problema familiar.

Cansada, aterrei minha cabeça nas mãos e um curta metragem de todas as memórias da Francesa me atingiram. E adivinhem? Nenhuma memória boa sequer. Tudo o que aquela mulher fazia era planejado, arquitetado e superficial, na tentativa de incentivar uma boa imagem aos olhares alheios. Cresci com a Nina e quando menor, era ela que cuidava de mim. Mas após todos os anos e já começando a pensar por mim mesma, passei a rejeitar Francesca. Não gostava de vê-la, então não ficava em casa se ela estivesse. E se estivesse, me trancava no meu quarto e fingia que não a escutava gritando comigo. Se existia alguma conversa, era monossilábica. Com o passar do tempo, ela se tornou uma das pessoas que abomino. E é uma droga pensar que nunca tive nem pai e mãe. E só de pensar que a terceira criança dela irá passar pelas mesmas coisas que eu, sinto um arrepio percorrer minhas costas.

— Vocês a odeiam tanto assim?

A pergunta me fez lembrar que o Sebastian ainda estava lá e devo ter ficado corada de vergonha. Não sou o tipo que demonstra fraquezas ou sentimentos. E eu de certa forma via Francesca como minha parte fraca, doente e que não conseguiria sentir absolutamente nada. É como um buraco. Sem fundo. Mas pensando bem... Eu sentia sim. Raiva, ódio, desprezo.

Levantei bruscamente do sofá e fui surpreendida pelo Rotten que puxou meu antebraço e apontou para o lugar ao lado dele no estofado. Não sei que merda passou pela minha cabeça, mas eu sentei.

— O que você quer? – falei com a voz embargada. Em uma simples pergunta podia-se ouvir o ressentimento. Só de tocar no nome dela, eu ficava mal. Mas não era algo que as pessoas poderiam saber de forma alguma. Apoiei meus cotovelos nos joelhos magros e segurei minha cabeça com as mãos dentro das minha madeixas onduladas.

— Posso te dizer uma coisa?

Silêncio. Ele viu que eu não ia responder, e senti o corpo dele se posicionando pra frente, como se tivesse olhando pra algum ponto fixo.

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