Capítulo 2

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     — Vamos terminar.

     Eu o abracei e disse:

     — Eu também te amo... O que?

     Eu senti o mesmo cheiro de perfume e amaciante, o mesmo calor que ele emana quando nos abraçamos, eu sei que isso não é um sonho por isso as lágrimas instantâneamente brotaram.

     Me afastei e a turma ficou em silêncio. Ele está brincando, certo? Ele é muito brincalhão, sempre fica cercado de amigos e deve estar me pregando uma peça.

     — Daniel, não tem graça. Todo mundo está olhando.

     Sussurrei a última frase no ouvido dele, mas ele me afastou e disse:

     — Achou mesmo que alguém como você serve para ser minha namorada?

     A maioria da turma riu, e algumas pessoas filmavam o momento. Eu dei dois passos para trás e fui finalmente enxergando com clareza os últimos quatro meses. A medida que eu me afastava e algumas lágrimas pediam para descer meu coração foi desacelerando e eu apenas disse:

     — Daniel? Foram quatro meses de namoro.

     Naquele dia, até a temperatura baixa das ondas que molhavam meus pés parecia incrível, mesmo detestando sentir frio. Tudo era perfeito demais para ser verdade, ilusório demais. Não foram apenas alguns dias, foram meses.

     Me senti uma joaninha que não viu que o seu predador estava ali, camuflado e se sentiu sortuda por finalmente encontrar o que procurava. Camaleão.

     — Nosso "relacionamento" foi uma aposta, espero que não tenha se apegado.

      — Uma aposta!?

     — No retiro de carnaval quando você estava isolada tirando barro do sapato e todos estavam interagindo, era a pessoa mais lamentável do grupo, e me desafiaram, não nego um bom desafio, mesmo que leve um pouco de tempo.

      Ele disse rindo com desdém.

     — E então me usaram para satisfazer o tédio escolar de vocês por meses? Todos sabiam e ninguém teve um pingo de consideração? Ainda bem que não tenho intimidade com ninguém dessa escola, imagina como deve ser contar com pessoas que só pensam nelas mesmas? Daniel, garanto que você vai se arrepender de ser tão energúmeno.

     — Energúmeno? Você é muito idiota, não me culpe.

     Eu me recuso a chorar na frente dele. Eu sou Sanches, e nós não fraquejamos fácil.

     — Não te culpar? Agora quem vai apostar sou eu!

     — É? O que? Valendo?

     — Vai se desculpar?

     — Pelo quê?
 
     Ele ainda pergunta? Cruzei os braços e me aproximei dele de modo confiante.

     — Por ser um imbecil que brinca com o sentimento das outras pessoas.

      — O que eu posso fazer? É bom que elas aprendem que tem certas coisas que não podem ter.

     — Então eu aposto que farei você se arrepender, até o próximo dia dos namorados. Valendo a minha transferência, caso eu perca, mas caso eu ganhe, além da sua transferência, eu quero um pedido de desculpas público.

     As pessoas ficaram animadas com a minha proposta irrecusável por causa da imagem que ele precisa preservar.

     — Então você vai se transferir em um ano? É uma pena. Deveria ir hoje, não perca seu tempo.

     Eu ri sarcasticamente e o encarei confiante:

     — Esse é o seu sim? Ótimo! Vamos ver quem vai perder tempo.
     
     Saí da sala de aula e após certa distância corri em direção ao banheiro. Me desarmei e chorei oceanos. Agora eu entendo a dor do primeiro amor e também o quanto é horrível quando você ama alguém que não te corresponde.

     Eu quero contar para os meus pais sobre isso, eles gostavam muito do Daniel mas acreditavam que era apenas coisa de adolescente. Agora entendo, porém eu sinto tanto e não sei o motivo, já que é apenas coisa de adolescente. Vai parar de doer aos dezoito anos? Vai estar tudo bem amanhã pela manhã? Ou vai durar uma vida?

     O sinal que anuncia o fim das aulas do turno vespertino já tocou há alguns minutos mas eu apenas fiquei sentada na tampa do vaso sanitário ouvindo as meninas que saiam e entravam fofocarem sobre o assunto do dia, provavelmente da semana.

     Paredes em tons claros e quase alvos manchadas com todo o tipo de material. Não tem muito o que se esperar dos banheiros escolares, principalmente quando se estuda em uma escola pública e o governo não zela pela higiene do espaço nem pela educação dos frequentadores. Me distrai por algum tempo lendo os textos que alguns deixaram ali e vi uma mensagem discreta e com o final desmanchado.

      Quando a movimentação cessou resolvi encarar a vida e sair do meu casulo. Quero ser como uma linda borboleta. Li uma vez em um dos livros da escritora, Carina Rissi, o seguinte: "Borboletas eram lagartas vestidas em trajes de gala. Mas ainda eram lagartas. Nunca deixariam de ser, por mais que se metamorfoseassem." digo que isso é verdade, mas as borboletas, sendo meras lagartas, são incríveis por chegarem a produzir esses trajes de gala e se tornarem adimiradas por milhares de pessoas. São a personificação da volta por cima.

      Eu estou cansada de me sentir inferior e ser alvo de indivíduos como o meu namo... ex-namorado. Falei sério quanto à aposta, só não sei como tecer meu vestido de gala. Ainda.

Valentine's DayOnde histórias criam vida. Descubra agora