I
Nove horas e trinta. Um cincerro tilinta. É um burrinho, que vem sozinho, puxando o
carroção. Patas em marcha matemática, andar consciencioso e macio, ele chega, de
sobremão. Pára, no lugar justo onde tem de parar, e fecha imediatamente os olhos. Só
depois que o menino, que estava esperando, de cócoras, grita: — "Íssia!. . . — " e pega-lhe
na rédea e o faz Volver esquerda, e recuar cinco passadas. Pronto, O preto desaferrolha o
taipal da traseira, e a terra vai caindo para o barranco. Os outros ajudam, com as pás. Seis
minutos: o burrinho abre os olhos. O preto torna a aprumar o tabuleiro no eixo, e ergue o
tampo de trás, O menino torna a pegar na rédea: direita, volver! Agora nem é preciso
comandar: — "Vamos!"... — porque o burrico já saiu no mesmo passo, em rumo reto; e as
rodas cobrem sempre os mesmos sulcos no chão.
No meio do caminho, cruza-se com o burro pêlo-de-rato, que vem com o outro carroção. É
o décimo terceiro encontro, hoje, e como ainda irão passar um pelo outro, sem falta, umas
três vezes esse tanto — do aterro ao corte, do corte ao aterro— não se cumprimentam.
No corte, a turma do seu Marra bate rijo, de picareta, atacando no paredão pedrento a
brutalidade cinzenta do gneiss. Bom trecho, pois, remunerador. Acolá, a turma dos
espanhóis cavouca terra mole, xisto talcoso e micaxisto; e o chefe Garcia está irritado,
porque, por causa disso, vão receber menos, por metro quadrado e metro cúbico. Adiante,
uns homens colocando os paus do mata-burro. Essa outra gente, à beira, nada tem conosco:
serviço particular de seu Remígio, dono das terras, que achou e está explorando uma jazida
de amianto. E, mais adiante, o pessoal do Ludugéro, acabando de armar as longarinas da
ponte.
Dez horas da manhã. A temperatura do ar prolonga do corpo. Só se sabe do vento no
balanço dos ramos extremos do eucalipto. Só se sabe do sol nas arestas dos quartzos cada
ponta de cristal irradiando em agulheiro. Cantos de canarinhos e pintassilgos, invisíveis. E
cheiro de mato moço. Tudo muito bom. E isto aqui é um quilômetro da estrada-de-rodagem
Belorizonte Paulo, em ativos trabalhos de construção.
Seu Marra fiscaliza e feitora. De vez em quando, pega também no pesado. Mas não tira os
olhos da estrada.
Bem, buzinou. E o caminhão da empresa. Vem de voada. Diminui a marcha... Seu
Waldemar, o encarregado, na boléia, com o chauffeur... O caminhão verde não pára... Mas,
lá detrás, escorregando dos sacos e caixotes que vêm para o armazém, dependura o corpo
para fora, oscila e pula, maneiro, Lalino Salãthiel.
Os trabalhadores cumprimentam seu Waldemar, seu Marra esboçou qualquer coisa assim
como uma continência, seu Waldemar bateu mão e passou.