Sentamos ao longo do cavalete no qual os empregados da cozinha comiam suas refeições, tia Katherine e eu. Os serviçais limparam a galeria inferior e trouxeram luzes e velas de todos os tamanhos e diâmetros em castiçais de barro. Eles nos observavam das portas nos dois lados do cômodo, uma plateia maltrapilha, sorrindo e acenando como se aquele fosse um dia santo ou de festa e nós, os mascarados, estivéssemos ali para entretê-los. Drane apareceu e irrompeu por entre os empregados como uma barca sobre as águas. Ele trouxe pão fresco, uma tigela de mel, manteiga dourada e facas de prata.
"Aqui sim se come de verdade", eu disse. Mantive meus olhos em Katherine. Ela não parecia se importar. "Pão quentinho saído do forno." Ao abri-lo, a fumaça se espalhou. O paraíso deve ter cheiro de pão fresquinho. "Eu não tinha saudades de você à toa, Drane", eu disse sobre meu ombro. Eu sabia que o cozinheiro gorducho iria se vangloriar durante um ano por causa dessas palavras. Não senti saudades dele.
Nem sequer perdi um segundo pensando nele durante a centena de vezes que sonhara com suas tortas. Na verdade, eu lutara para me lembrar do seu nome quando o vi junto à porta. Mas havia algo naquela garota que me fazia querer ser o tipo de homem que se lembrava.
A primeira mordida acordou minha fome e caí sobre o pão como se ele fosse um pernil de veado, e eu e meus irmãos nos acotovelássemos no meio da estrada.
Katherine parou para ver, suspendeu sua faca sobre o pote de mel e contorceu os lábios num sorriso.
"Mmmm." Eu mastiguei e engoli. "O quê?", disse, ordenando uma resposta.
"Ela deve estar se perguntando se você vai para debaixo da mesa, quando o pão acabar, brigar pelos ossos com os cachorros." Makin se aproximara sem que eu notasse.
"Diabos, mas você tem pés de pantufa, Sir Makin." Eu me virei e ele estava lá, em pé, atrás de mim, com sua armadura cintilante. "Um homem de armadura deveria ter a decência de ranger."
"Eu rangi bastante, meu príncipe", ele disse, abrindo um sorriso impertinente.
"Você estava prestando atenção em coisas mais urgentes, quem sabe?" Ele prestou reverências à Katherine. "Milady. Acredito não ter tido a honra."
Ela lhe estendeu a mão: "Princesa Katherine Ap Scorron".
Makin ficou perplexo. Ele tomou sua mão e fez um novo aceno, muito mais reverente, levando os dedos dela até os lábios. Ele tinha lábios grossos, sensuais.
Bastava-lhe lavar o rosto para seus cabelos, negros e cacheados, cintilarem tanto quanto sua armadura. Ele se limpou de verdade e eu, por um momento ínfimo, o odiei sem reservas.
"Sente-se", eu disse. "Estou certo de que o excelente Drane pode trazer mais pão."
Makin soltou a mão de Katherine. Devagar demais para o meu gosto.
"Infelizmente, meu príncipe, é o dever, e não a fome, que me trouxe até a cozinha.
Achei que iria encontrá-lo aqui. Você foi intimado a comparecer na sala do trono.
Deve ter uma centena de escudeiros procurando por você. E por você também, princesa." A ela, Makin concedeu um olhar apreciativo. "Encontrei um sujeito, chamado Galen, à sua procura." Estas últimas palavras saíram um tanto amarradas.
Assim como eu, Makin não gostava muito de Sir Galen. E ele encontrara o sujeito.
Levei o pão comigo. Era muito bom para ser deixado para trás.
Seguimos nosso caminho de volta à superfície. O Castelo Alto parecia ter despertado durante minha visita às cozinhas. Escudeiros e camareiras corriam pra lá e pra cá. Guardas emplumados passavam aos pares e em grupos de cinco em seus afazeres. Contornamos um lorde trajando peles e uma corrente de ouro, cercado por lacaios, e o deixamos para trás, com seu espanto, suas reverências e seu "Bom dia, princesa!".
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Prince of Thorns
AdventurePrince of Thorns - Tem início a Trilogia dos Espinhos: Ainda criança, o príncipe Honório Jorg Ancrath testemunhou o brutal assassinato da Rainha mãe e de o seu irmão caçula, William. Jorg não conseguiu defender sua família, nem tampouco fugir do hor...