Luz na Escuridão

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Benjamin tentou falar alguma coisa comigo logo depois, mas eu me virei para o outro lado sentido uma dor muito grande. Não emocional, física mesmo. Fortes pontadas na cabeça, como se estivessem sugando meu cérebro e girando dentro do crânio. Não sei exatamente o que aconteceu depois, porque não conseguia sentir mais nada de tão intenso que foi. Aos poucos, o que pareciam fogos de artifício em forma de socos no meu encéfalo foram se acalmando e quando me dei por conta estava deitada de novo, a peruca na mesa de cabeceira, vários enfermeiros ao meu redor.

— Calma, está tudo bem. Você ficou um pouco ansiosa e sua mente ainda está frágil, só isso. Respire fundo, procure relaxar, já estamos cuidando de você e só checando se não houve mais nada.

Tinha algo claramente errado com aquela declaração. Meu cérebro não estava "frágil", estava era trabalhando igual um louco tentando processar alguma informação. Só não havia entendido ainda qual era. Uma enfermeira, mais nova, usando um crachá escrito "estagiária" veio falar comigo sorridente:

— Não foi nada demais, essas crises de estresse são comuns. Não precisa ficar assustada. — Eu tava com uma expressão tão desesperada assim para todo mundo mandar eu me acalmar? — Olha, nós pedimos para seu amigo aguardar lá fora, mas pode conversar comigo se quiser. Meu nome é Milena e o seu?

— Ri... AAAAAAAAAiiiiiiiiiiiiiihhhhh!! — AQUILO doeu. Muito. De verdade. Impossível explicar a dor. Só posso garantir que uma facada teria sido quase um carrinho do lado da pontada que me deu. Todos os enfermeiros ignoraram a recomendação de deixar a paciente "calma" e começaram a falar ao mesmo tempo:

— Sua tonta! Ela está com quadro de amnésia retrógrada!

— Esqueceram de passar o prontuário?!

— M-mas ela começou a dizer o próprio nome, tenho certeza!

— Só o início, né? Por que será?!!

— Não estudou isso ainda não, sua mula?

— Mas eu fiz ela lembrar um pouco!

— Nós que estávamos errados achando que ela teve uma crise de estresse, admitam!

— Isso não tira a irresponsabilidade de ninguém!

Eu sei que enquanto alguma força invisível fazia vudu com a minha cabeça alguém teve a brilhante ideia de chamar o plantonista, que foi dispensando os enfermeiros e começou a me examinar animado. Voltou a fazer as perguntas inúteis, mas quanto mais ele me perguntava, mais a dor passava e mais nada vinha na minha cabeça. Foi um lampejo momentâneo. Sinceramente, se eu tivesse que passar por isso para cada sílaba da minha vida pregressa, acho que não seria tão ruim assim seguir a vida desmemoriada.

O médico, ao terminar, me disse que era normal não lembrar tudo de uma vez porque esses avanços são lentos mesmo. Mas ele disse também que para o meu estado, eu deveria ficar esperançosa pois ocorreu rápido demais. De qualquer forma passaria o resto do dia em observação, o que significava dormir com eletrodos e enfermeiros anotando os sinais que aparecessem na tela do aparelho.

Também significava que Benjamin não me veria mais hoje. Confesso que fiquei aliviada. Não sabia se queria realmente ouvir ele me dizendo que não voltaria mais. Então fiquei o resto do dia concentrada em tentar lembrar resto do meu nome, mas nada me vinha pela cabeça.

Nesse dia sonhei que estava caída no asfalto duro e tudo ao meu redor era gigante e escuro. Aparecia um ser disforme e me oferecia mão para que eu levantasse. Fiquei primeiro com medo, mas o monstro estalou os dedos e num passe de mágica estava tudo iluminado. Ele me ofereceu a mão de novo. Dessa vez aceitei e no momento em que encostei nele o monstro se transformou em um magnífico espelho. Tentei me ver nele, mas não tinha reflexo.

Estrelas PerdidasOnde histórias criam vida. Descubra agora