Retorno de Saturno

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A semana que se seguiu deve ter sido a mais estranha da minha vida. Enquanto continuava indo para o trabalho, morando com Ben e Alex, ouvindo todos me chamarem por "Rita", não tinha mais a menor certeza sobre quem eu era. Quer dizer, certeza era algo completamente diferente do que estava rondando minha mente. Benjamin melhorou depois do pequeno surto e simplesmente ficou dias sem mencionar mais o assunto. Ainda bem, ou eu acho que enlouqueceria de vez. Mas deu para ver o quanto ficara afetado. Ao ponto de aceitar uma sugestão do Alex de irem visitar a mãe.

 — Você tem certeza, Ben? Eu sei como vocês não se dão tão bem... — falei, afagando o braço dele quando me contou a ideia estranha. — É, mas ela ainda é minha mãe né? Do Alex, primeiramente, mas também minha...— comentou pensativo. Achei melhor não insistir no assunto. De qualquer forma, era uma distração boa o suficiente para as coisas que estávamos descobrindo sobre mim, que não tínhamos como provar. Entendo que achem a gente um pouco covarde, mas se ponham no nosso lugar. Tudo que apareceu da minha vida "passada" era absurdamente grande e diferente, nem tínhamos provas. Não dava para simplesmente aparecer na gravadora (que eu nem faço ideia de qual era) e dizer: "aí eu acho que trabalhava aqui. Me devolve e o emprego e paga um exame de DNA". Fora que minha cara, inchada e com cicatriz era muito diferente de qualquer rosto perfeito de uma dessas cantoras bem-pagas para quem eles dariam alguma credibilidade. Assim, chegando o final de semana, pegamos carona com Alex para à residencia da mãe deles. Não era muito longe, mas o lugar onde ela morava conseguia ser ainda mais simples que a região onde ficava nosso apartamento. Depois que meu cunhado estacionou, tivemos que atravessar algumas vielas para alcançar a casa, segundo andar de um sobrado nos fundos de uma pequena vila.

 — Foi aqui que você cresceu? — perguntei a Benjamin. — Ah, não. Ela se mudou para cá depois que eu e Alex fomos morar sozinhos. A casa que cresci era beeem menor! — disse naturalmente, rindo. Eu não sabia se me sentia mal por ele, ou ria junto daquele sorriso cativante. Óbvio que sendo quem era, acabei rindo enquanto batíamos na porta. Benjamin se aproximou para me beijar, de um modo natural, que não fazia desde o dia em que cantei a música da Riley. Lógico que bem nessa hora a porta abriu.Uma senhora de vestido florido nos encarava de cara feia, cruzando os braços e segurando um pau de macarrão.

— Ora,ora, ele veio. — Roberta falou encarando Benjamin como um dragão. Alex pigarreou:

 — Oi, mãe! Como vai a senhora? 

— Olá, meu filho! Estou trabalhando como uma condenada, sozinha nessa casa! Cheia de dores nas costas... Mas estou bem. — deu uma sonora bufada. Só então olhou para mim. De cima a baixo. —Vamos, entrem! Já que vieram até aqui... Mas aviso que não tem comida para todos. —Esse comentário ela fez olhando diretamente nos meus olhos, sem esconder. Ótima maneira de conhecer a sogra, não é mesmo? Benjamin arregalou os olhos e já ia dar meia volta de volta para a rua, quando Alex segurou seu braço: 

—Não tem problema, mãe, eu peço uma pizza para todos. 

— E eu ajudo a pagar!— fiz questão de dizer. A bruxa, digo, minha sogra, me olhou com empáfia quando disse isso, mas outra treta foi evitada por Alex que começou a falar sobre os estudos de direito e um grupo de pesquisa jurídica do qual fazia parte agora. Os dois foram caminhando para a cozinha enquanto conversavam, deixando eu e Benjamin sozinhos na sala. Era um cômodo pequeno, mas aconchegante. Tinha as paredes pintadas de amarelo, uma mesinha com um laptop e um sofá de couro um pouco rasgado. Sentamos nele e meu namorado imediatamente me abraçou por trás. 

 — Não liga, ela está tentando ME perturbar. Nunca aceitou a ideia de que eu conseguiria me virar sem seguir os planos de carreira que tinha para mim. Muito menos conseguir uma namorada.— eu ri. — É uma maneira dela se preocupar comigo. Não a melhor, mas é uma. Ao menos, eu prefiro pensar assim.

Estrelas PerdidasOnde histórias criam vida. Descubra agora