Washington:
Morto. Era assim que eu me sentia.
— Você vai cair, moço, pelo amor de Deus! — exclamou a enfermeira.
Tudo o que eu queria era as minhas pernas de volta, e não essas inúteis. Desci da maca, e caí de cara no chão. Mais uma vez a vida me fazendo cair dessa forma.
— Para com isso, Tom! — gritava minha mãe ao lado da enfermeira.
— Eu lhe disse, você não pode andar! — dizia a mulher de cabelos dourados, com jaleco branco e expressão de desespero.
— ME SOLTA! — eu vociferava — EU QUERO ANDAR. EU QUEro andar — eu chorava aos soluços. Não era um choro comum.
Cada palavra dita por mim ia ao íntimo da minha própria alma, e trazia consigo lágrimas. Lágrimas de sangue que não eram vermelhas. Tinham cores normais, mas que carregavam o peso da tristeza de um garoto de pouco mais de vinte anos, que recebeu a notícia de que não poderia mais andar. Que teria uma vida limitada a ficar em cima de uma cadeira-de-rodas.
Depois dessa cena um médico apareceu e consigo alguns enfermeiros. Me aplicaram uma injeção. Acordei horas depois, e assim foram sucessivamente os dias, culpei meio mundo por estar aqui, mesmo sabendo que o único culpado era eu.
Só queria estar perto da Raquel, mas ela não me respondia. Meus amigos aos poucos foram aparecendo, com aquele olhar miserável de pena que eu odeio mais que tudo.
O primeiro a se apresentar… Richard. Trouxe alguma porcaria na mão, parecia um salgadinho. Era o meu favorito. Dane-se. Quando me entregou eu o joguei contra a parede.
— Suma daqui! — disse com a voz firme.
— Você não precisa...
— SOME, RICHARD! — alterei minha voz com ele. Tudo o que eu precisava era que não me olhassem com olhar piedoso.
Logo após veio Rafael. Nunca fomos tão próximos, minha amizade era mais com Richard. No entanto ele apenas deixou algo em cima da mesinha de remédios e disse:
— Liberdade, é mais do que andar.
E desapareceu. Veio aqui somente para dizer idiotices. Andar. Fácil falar. Ele anda, não está condenado a ser um lixo excluído pela sociedade pra vida toda. Em seguida quem entra é o… Henrique! Confesso que não tive forças para expulsá-lo do quarto. Eu quis gritar, xingá-lo, no entanto não dava. Não com ele.
— Como você tá, Tom? — ele não estava com pena, eu podia notar.
— Nada bem, cara — demorei alguns segundos para responder.
— Te trouxe isso aqui — me mostrou a camisa do Tottenham.
— Valeu, mas... quero ficar só, se é que me entende.
— Qual é, Tom. Sempre te achei o cara mais incrível, até mais do que o meu irmão. Não vai ser isso que vai te impedir de seguir com a vida! — saiu do quarto. Em seguida, entra ela. Amanda.
— Oi, Tom! — sorriu fraco.
— O que você quer aqui, garota? — disse sem me arrepender. Ela não perde tempo, nem quando prefiro morrer do que viver.
— Eu... só queria dizer que... estou aqui pro que precisar.
— Eu não preciso de nada. Agora desaparece da minha frente! — e foi com ela que saíram as palavras mais duras.
Quero que se exploda. Já deixei claro que a minha garota é a Raquel há muito tempo.
Foram todos embora. Mas deixaram as coisas pra mim. Pedi para que pegassem o salgadinho e a camisa. Henrique, sempre foi um amigo de verdade, mesmo sendo mais jovem, me entendeu desde o início. Ele era o irmão menor que eu nunca tive.
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Elo
RomanceSINOPSE: Tom: "Eu me lembro que doía, não como um corte profundo ou uma doença que te mata devagar, mas sim a dor da consciência voltando aos poucos e, junto a ela, a certeza de que nada mais seria igual. Um acidente muda tudo, e desse tudo, sobr...