Eu já havia completado meus 17 anos e lá estava eu, sentada no banco da praça central da cidade, lendo a maldita placa que contava toda a história de como nossa cidade havia sido destruída num incêndio para, depois de anos sendo ignorada pelo governo, ser reconstruída com o dinheiro e a força dos próprios moradores, em um terreno particular comprado por eles mesmos. A cidade ficou menor, incrivelmente cheia e o arquiteto que a planejou é a pessoa mais preguiçosa de quem já ouvi falar, mas aquilo é melhor do que um monte de cinzas.
Estava esperando por ela, nós obviamente não eramos mais tão próximas quanto um dia fomos, (principalmente depois que ela descobriu tudo sobre mim e a Olívia) mas ainda nos víamos com uma certa frequência, nunca tínhamos sobre o que conversar, mas daquela vez eu precisava falar com ela, tinha certeza disso, porém, toda essa convicção se foi no momento em que vi seus cachos ruivos balançando contra o vento, seus olhos eram como duas esmeraldas que iluminavam seu rosto excessivamente pálido e contrastavam com suas bochechas rosadas por causa do sol que havia decidido aparecer em toda a sua glória.
—Oi Lis. — ela disse ao se sentar ao meu lado.
—Oi Sarah — disse meio sem jeito.
—Então...sobre o que você queria falar?
Eu não sabia exatamente por onde começar, mas comecei.
—Eu vou falar, mas você não pode me interromper em nenhum momento. — ela assentiu — Certo. Olhe para estas pessoas, indo, vindo, de lugar nenhum para lugar nenhum, todos vivendo exatamente como os pais deles, sem nenhuma ambição, nenhum sonho, nenhum objetivo, nada. Eu sei que para muitas pessoas esta é uma proposta tentadora, mas pra mim não é. Eu quero mais pra mim — parei, respirei, me preparei e... — Por isso eu vou começar na faculdade, em Amsterdã daqui à dois meses.
—Terminou? — assenti — Por favor, me fale que Amsterdã não fica onde eu penso que fica.
—É a capital holandesa — era evidente a expressão de desaprovação no rosto dela — Não é por causa dele — disse, adivinhando no que ela estava pensando — Não quero ver o homem que matou a minha mãe.
—Então me explica: porque você está indo justamente para o país onde ele está se não é para encontrá-lo?
—Acho que mencionei que consegui uma bolsa de estudos integral para cursar cinema em Amsterdã — ela tentou dizer alguma coisa mas eu interrompi — Isto está fora de discussão, em dois meses estarei a um oceano de distância e achei que minha melhor amiga deveria saber.
—Tudo bem. — ela disse depois de um tempo — Então, já que você vai embora em pouco tempo, conceda-me um ultimo desejo.
—Que desejo?
—Primeiro diga que aceita. — assenti — Nós iremos nos formar amanhã, e eu quero que você vá na festa dos alunos, e queria que você, pelo menos, tente se divertir.
Concordei, mesmo sabendo que eram dois pedidos. Naquela época eu não sabia, mas este foi um dos meus maiores erros.
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Fantasmas do Fim do Mundo
AcakHeloísa viveu boa parte da sua vida em uma cidade pequena com suas próprias regras e costumes, nos quais nunca se encaixou e pelos quais tanto se machucou, mas agora ela está de volta e irá descobrir que os fantasmas de seu passado ainda estão vivos...