Merda! Cadê o bilhete?
Penso, desesperado, enquanto vasculho os bolsos da minha calça. Não é possível que algo tão pequeno e simples desapareça assim, do nada. Até onde eu sei, papel ainda não tem asa e, muito menos, perna para sair andando por aí. E mais, mesmo que tivesse, quem conseguiria ler aquilo? Eram só traços e pontos, nada mais. Não tinha muito significado verbal mas tinha muito emocional, mesmo que só pela minha parte.
Nunca nenhuma paixão minha, por menor que fosse, deu certo. Não que eu esteja apaixonado pelo Tomás, nem nada, é só que... Sei lá, ele despertou em mim algo diferente. Algo que eu nunca havia sentido antes. No segundo em que eu olhei para ele, foi como se o mundo tivesse parado e só existisse nós dois. Esse é o tipo de sensação que, com certeza, eu gostaria de ter mais vezes. Seja com o Tomás ou não.
Na bolsa!
Sem demorar nem mais um segundo, me viro e, com um movimento rápido, agarro a mochila. Sem pensar, apenas a viro de modo que todas as coisas despejem para fora, ainda com esperanças de encontrar um mísero bilhete em formato de código. Com todos os meus livros, cadernos, papéis e tudo o que costumo guardar dentro da bolsa jogados no chão do quarto, me ajoelho. Com os braços estendidos, mãos abertas e uma certa vermelhidão na face, bagunço mais o pequeno bolo estudantil que, até então, permanecia organizado dentro de uma bolsa.
Nada...
A vida não deveria ser tão cruel a esse ponto. Quer dizer, é a primeira vez, em toda a minha vida, que sinto algo verdadeiramente intenso e não tenho nenhuma lembrança, além daquela que paira na minha mente.
Sim, é verdade, eu estou criando expectativas. Se eu me importo? Não, eu não me importo. A vida só é uma. Pra quê ficar me restringindo? Pra quê estar sempre limitando o que posso ou não sentir? Pra quê pensar demais quando é a partir das ações que se conquista os objetivos? Não perderei meu tempo, meu precioso tempo, me preocupando com o que outra pessoa sente ou deixa de sentir. Eu quero sentir e não vou sufocar esse sentimento que bate em meu peito, implorando para sair.
Não que eu ame o Tomás. Não, isso não. Acabei de conhecê-lo e a única coisa que sei sobre ele é que, além de professor de Artes no Colégio Aplicação, ele é ator e...
Merda, merda, merda! Não, eu não posso!
Não posso fazer isso, não dá!
É errado, estúpido, ilegal... Porra, ele é meu professor, isso deve ser levado em conta. E mais, ele é bem mais velho que eu, ou seja, pedofilia com todas as letras e trouxismo-aventureiro também. Tipo, assim: tem tudo para dar errado. Errado é pouco, na verdade, a proporção da gravidade dessa situação merece um adjetivo com mais intensidade do que só "errado". Na minha brilhante vida, as coisas não costumam terminar bem e, muito menos, começar, então quem dirá essa paixão idiota.
Priii... Prii...
O celular vibra, interrompendo os meu pensamentos.
Quem será?
Com desinteresse, levanto do chão e vou à procura do meu telefone.
Priii... Prii... Priiii...
Outra vez, agora com mais insistência, o celular vibra.
Não acho que seja algo importante mas levando em consideração que ninguém do Colégio Militar perderia tempo falando comigo e nem do Aplicação, o que pode ser?
Isso! Achei...
Olhando para a tela do celular, me surpreendo com a notificação.
João Paulo [2:37 pm]: Ei, cara, vou te botar no grupo da sala blz?!
João Paulo [2:38 pm]: Outra coisa, vai rolar uma festinha na casa de uma amiga nossa. Quer ir?
João Paulo te adicionou no grupo "2º Manhã B"Em todos esses anos de Colégio Militar, ninguém nunca, nunquinha mesmo, me chamou para alguma festa e agora, apenas 6h dentro dessa nova escola, eu, ao que parece, já tenho um possível-amigo e melhor! Um possível-amigo que me chama para festas. Não só estou surpreso, como estou feliz. É esquisito dizer isso mas, sim, estou feliz e não vou recusar o primeiro convite do meu Ensino Médio.
Carlos [2:40 pm]: Quero. Quando vai ser?
Eu só espero não está sendo muito pertinente, apenas. Eu acabei de chegar, não quero que as pessoas fiquem com uma má impressão de mim.
João Paulo [2:40 pm]: Vai ser sexta à noite.
João Paulo [2:40 pm]: Te passo o endereço amanhã na escola.
Carlos [2:41 pm]: OkMeu Deus, será que eu fui seco demais? Ou talvez grosso? Droga! Eu devia ter mostrado mais empolgação, sei lá, mais energia. As pessoas normais e sociáveis com certeza agiriam muito melhor que eu nessa situação. E aí está o problema: eu não sou sociável. Eu nunca nem fui em uma festa de verdade. Não sei o que falar, o que fazer, como agir... É tudo novo pra mim e, ao mesmo tempo que isso me incomoda, também me excita, o que é muito bom.
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Crônicas De Um Amor Proibido
RomanceApós se meter numa briga no Colégio Militar, Carlos, expulso, decide ir para uma nova escola e, logo no primeiro dia, conhece alguém que foi capaz de mexer com os alicerces do seu coração: Tomás Ribeiro, professor enigmático de Artes, PhD em deboch...