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Caminhei em passos suaves e confiantes até onde ela estava. Conforme a distância entre nós diminuía, mais detalhes seus me eram revelados. O contorno preto do olho, o verde como a imensidão de uma floresta, pequenas sardas tentando se esconder por baixo da maquiagem, os lábios finos rosados, o cabelo penteado milimetricamente de lado para não ter nenhum frizz. Ela era muito bonita, sem sombra de dúvidas. Seu olhar me acompanhou até que eu estivesse sentado ao seu lado.

— Acho que você me deve dez reais — ela disse para a amiga loira antes que ela levantasse e nos deixasse a sós no canto da mesa. Se antes eu estava curioso, fiquei mais. Sua atenção voltou para mim novamente — Você não trabalha na revista.

— Pode ser que eu tenha vindo de penetra, em minha defesa, eu não sabia que era exclusivo do trabalho.

— E o que o penetra faz? — sua voz era decidida em cada sílaba, como se sempre tivesse o controle na palma das suas mãos. Por um instante me ocorreu como ela ficaria sendo surpreendida, sem saber o que fazer.

— Sou neurocirurgião e primo do fotógrafo.

— Ah, ele comentou de você — franzi a testa imaginando o que ele disse. O homem era um tagarela que sempre dava com a língua nos dentes. Eu não queria nem pensar no que ele tinha dito... Eu não precisava que mais ninguém sentisse pena de mim. Eu precisava era mudar o foco daquela conversa.

— E você, o que faz na revista?

— Sou colunista de moda... E modelo nas horas vagas.

— Isso explica muita coisa — e quando vi já tinha falado. — O vestido verde combina com a sua... ahm...— procurei algo em que pudesse completar a frase, o suor frio já começando a escorrer sobre minha pele — bolsa.

Ela riu.

Eu também ri. De nervoso. Eu nem sabia que estava enferrujado naquilo. E eu nem estava tentando conquistá-la... Passar mais de três anos com uma mesma mulher, depois mais três sem ela, com certeza não te preparava para falar com outras mulheres.

Aquilo estava sendo desastroso.

— Gosta de apostas? — tentei de novo, lembrando quando sua amiga nos deixou a sós.

— Sim, e não costumo perder.

— Quer apostar algo?

Ela ergueu uma das sobrancelhas, desconfiada. A conversa, finalmente, tomando um rumo diferente. Seus olhos brilharam, curiosos.

— O quê?

Olhei em volta, procurando algo que pudéssemos apostar. Eu precisava do número de celular dela, só isso. Quando vi um garçom passando segurando salada e limões cortados, a ideia veio. Não era boa, mas genial para que eu conseguisse seu número.

Levantei a mão e prontamente o garçom veio, anotando meu pedido e deixando em nossa frente um limão cortado em quatro partes.

— Devo ficar com medo? — Ela ergueu a sobrancelha olhando para a fruta.

— Tem que chupar duas partes do limão, sem fazer careta, nem fechar o olho. Se eu ganhar, você me passa seu número de celular.

— Você é bom — ela sorriu, como se estivesse admirada com meu plano de conseguir seu número. — E se eu ganhar?

— Você escolhe — dei de ombros... aquilo nem estava passando por minha mente.

Seu sorriso aumentou.

— Feito — ela estendeu a mão e eu a apertei, era macia, de dedos longos e finos. Na verdade, está aí uma palavra que a descreveria bem: fina. Na altura, no corpo, na roupa, na atitude... Aquela mulher parecia levantar o nariz e nunca mais abaixar. — Já está valendo?

Idas e vindas de amor - O Encontro (Livro I) [Degustação]Onde histórias criam vida. Descubra agora