Capítulo Quatro

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    Cheguei a meu quarto bem a tempo de pular na cama e me cobrir, antes que Patrícia entrasse, acompanhada pela sra. Bethany. Uma luz fraca vinha do corredor, e tudo o que eu via a silhueta da diretora.
    - Você sabe por que temos regras aqui, Patrícia - ela falava em voz baixa, mas dava para perceber que estava muito seria. Era bem mais que um pouquinho intimidante, e não era nem mesmo em mim que ela estava dando bronca. - Vocês devem entender que essas regras têm de ser obedecidas. Nao podemos ficar percorrendo os arredores durante a noite. As pessoas começariam a falar. Os alunos perderiam o controle. O resultado seria uma tragedia. Estou sendo clara?
    Patrícia fez que sim com a cabeça, e a porta se fechou. Sentei-me na cama
    - E aí, foi horrível? - sussurrei.
    - Não, só uma confusão - ela resmungou, começando a tirar a roupa. Fazia mais de uma semana que nos trocávamos juntas no mesmo quarto, mas eu  ainda tinha certa vergonha de fazê-lo. Patrícia não. Enquanto tirava a blusa, ela me olhava.
    - Você ainda está vestida!
    - Hã, sim.
    - Achei que tinha voltado cedo da festa.
    - Voltei. Mas eu... eu não conseguia entrar na escola. Estavam vigiando. Então descobriram onde estava todo mundo e foram atras de vocês. Consegui chegar aqui só uns três minutos antes de você.
    Patrícia encolheu os ombros enquanto pegava sua camisola.Fiz o possível para me trocar voltada para meu canto do quarto. A conversa estava encerrada, e pela primeira vez eu tinha mentido com exito para minha colega de quarto.
    Talvez eu devesse ter contado a Patrícia por que atrasara. A maioria das garotas provavelmente estaria superansiosa para contar a todos tudo sobre o rapaz maravilhoso com quem acabara de rolar algo. Mas eu gostava do segredo. De algum modo, isso tornava mais especial aquilo que só eu sabia.Lucas gosta de mim e eu gosto dele. Quem sabe vamos estar juntos.
    Esse ultimo pensamento talvez fosse um exagero, decidi ao acomodar-me sob as cobertas de novo. De qualquer modo, eu não podia fazer nada. Minha mente corria depressa demais para que eu pudesse dormir, e dei um sorriso de encontro ao travesseiro.
    Ele é meu.

- Ouvi falar que houve uma festa e tanto esta noite - disse meu pai, colocando um hambúrguer com batatas fritas diante de mim, na mesa do apartamento de minha família.
    - A-hã - respondi, com a boca cheia de batatas fritas. Então cai em mim e murmurei:- Quer dizer, também ouvir falar.
    Meus pais trocaram olhares, e tive a impressão de que estavam mais achando engraçado do que irritados. Era um alivio.
    Aquele o primeiro do que seriam nossos jantares semanais de domingo. Cada segundo que eu pudesse estar de volta com minha família, e não rodeada do pessoal Noite Eterna, era maravilhoso para mim. Mesmo que tentassem agir de forma casual, eu via que tinham sentido minha falta tanto quanto eu sentira a deles. Duke Ellington estava no toca-discos e, a despeito do interrogatório familiar, o mundo havia voltado aos eixos.
     - Pelo que ouvi, houve basicamente cerveja e musica. As coisas não saíram de controle, saíram? - pelo visto, minha mãe tinha decidido ignorar minha negativa de ter estado lá
    - Não que eu saiba - não era uma negativa de verdade. Afinal, eu só tinha ficado na festa uns quinze minutos.
    Meu pai sacudiu a cabeça.
    - Não importa se foi só cerveja - disse para minha mãe. - As regras devem ser obedecidas, Célia. Tudo bem, aconteceu na área da escola, mas e quando eles forem para cidade no próximo fim e semana? Eu não me preocupo com Bianca, mas, alguns dos outros...
    -Não sou contra as regras. Mas é natural que os alunos mais velhos se revoltem contra elas as vezes. É melhor termos alguns deslizes a cada tanto do que algum incidente mais serio - minha mãe voltou para mim sua atenção. - Qual sua aula favorita ate agora?
    - A sua, é claro - dei-lhe um olhar que perguntava se ela achava mesmo que eu seria tão tonta a ponto de dar outra resposta, e ela riu. 
    - Fora a minha - ela apoiou o queixo na mão, ignorando por completo a regra sobre cotovelos na mesa.- Talvez Inglês? Sempre foi sua preferida.
    - Nao com a senhora Bethany.
    Isso não agradou muito.
    - Dê ouvidos ao que ela diz - meu pai soou severo, e pôs seu copo na velha mesa de carvalho com força demais, fazendo um tunc. - Ela é alguém que deve ser levada a serio.
    Pensei, Idiota, ela é a chefe deles. Que tal se corresse por ai que a filha deles andava falando mal da diretora? Preocupe-se com alguém que não seja você, só para variar.
    - Vou tentar - prometi. 
    - Sei que vai - minha mãe colocou sua mão sobre a minha.

NOITE ETERNA                    DE CLAUDIA GRAYOnde histórias criam vida. Descubra agora