um texto sobre (in)certezas.

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então
tem esse cara
e ele é todo lindo e mais velho e ele usa vans old school preto e calça jeans preta e moletom preto e ele ta sempre com um pirulito como quem diz você tem certeza de que não quer provar meu gosto?
e eu idealizo ele inteligente e do tipo que ficaria acordado conversando comigo até as três da manhã e me explicando sobre o big bang no sentido astrológico mesmo eu achando que isso não faz sentido porque astrologia não é aquilo de signo? mas aí eu iria explicar a minha agonia em ver que o big bang é a metáfora mais clichê utilizada pela maioria absoluta dos que se dizem poetas e escritores mas de certa forma tudo bem eu entendo afinal foi ele que criou tudo ao lado dEle mas sei lá me incomoda apenas
eu diria pra ele que me sinto um tanto insuficiente e insegura porque há tanto no mundo que eu desconheço e que estou deixando passar e ele vai olhar pra mim sentada na cama escrevendo esse texto e dizer
ao seu lado eu sinto que não perco absolutamente nada
e eu iria dizer tentando fazer sobressair minha voz ao som de love is a bitch que ele teria colocado na caixinha de som
como você pode ter tudo se eu nem ao menos sou real?
eu sou um conjunto de ações e contextos preso em um corpo que vive pra fazer reações químicas que envolvem oxigênio e dióxido de carbono
eu sou fictícia
e ele diria
talvez você seja fictícia mas foi two feet quem te escreveu
mas nada disso acontece de fato porque há algo
algo que amarra meus pés e minhas mãos e me impede de me mover e de dizer ei por favor me deixa provar seu gosto
o conjunto de contextos e ações que eu sou me obriga a ser espectadora e eu não consigo parar de pensar no que aconteceria se quando você passasse eu me levantasse e dissesse
1. olá
2. eu to cansada de me sentir como uma formiga que passa pela vida dos outros sem conhecer sem analisar todas as possibilidades sem pensar no que aconteceria se eu simplesmente tivesse a coragem de me impor ou de te convidar pra um café
3. qual seu nome
4. eu odeio café
5. ultimamente eu tenho te escrito e por favor não me ache maluca mas há algo sobre você que me leva a acreditar que você não se importaria se eu fosse fictícia
6. outro dia eu tirei uma foto sua na rua mas faça a gentileza de não chamar a polícia
7. você sabia que a maior parte da poeira da sua casa é feita na verdade de você de partículas de você?
você ja ouviu falar no conceito de amor platônico? minha professora de literatura disse que há um sentimento proibido e secreto de alguma coisa que vai além do toque que vai além do tesão disse que é um amor inventado
mas o amor platônico é tão mais que isso
ao meu ver
o amor platônico se resume a algo que nunca vai acontecer mas isso não é culpa minha não é culpa sua porque a gente é só um conjunto de ações e contextos que são tão tão cruéis
o contexto de que os átomos não permitem o toque real me destrói porque como diabos você espera que eu sinta seu gosto?
eu mandei uma mensagem pra você esperando que você entendesse a minha piada dizendo potassiopotassiopotassiopotassiopotassio a gente nunca vai de fato se sentir porque a física não aprova o romance
mas veja bem
agora é o momento em que você percebe que isso nunca aconteceu porque tudo que eu faço e vivo é platônico
o que me impede de mandar essa mensagem nesse exato momento vai além de tudo que eu sei e posso explicar pois o contexto que te fez te colocou aí e o contexto que me fez me colocou aqui e os padrões corporais as inseguranças que eu já expliquei as falsas expectativas me congelam e  eu não vou tentar mudar os contextos pré-definidos
se todo mundo no mundo sabe exatamente o que eu sinto porque a gente é um emaranhado de retas concorrentes se todo mundo no mundo é fictício todo mundo vai saber que isso é uma ode a você que tem uma existência platônica aqui bem colada na minha
se todo mundo de fato tiver uma conexão com todo mundo no mundo eu espero que nesse exato momento você esteja recebendo isso
eu espero que você saiba que isso é um adeus
mas só por ora

Com amor, Catarina.Onde histórias criam vida. Descubra agora