Abro os olhos.
Luz.
Estou tonto, fraco, sonolento, mas posso ver a luz. Minhas pálpebras insistem em permanecer fechadas, me esforço. Não quero dormir.
Não posso dormir.
Dentro de mim uma sensação indescritível nasce. Sinto medo, alegria, confusão, angústia e outras tantas coisas incapazes de serem expressas em palavras.
O medo é de ser apenas mais um sonho como tantos outros que tive ultimamente.
Alegria por imaginar que pode ser real.
Confusão por não saber oque significa.
Estaria eu livre finalmente?Não sei quanto tempo estamos na escuridão, tenho dúvidas sobre a existência de Klint. Talvez eu esteja em coma e isso tudo é coisa da minha cabeça. Quem sabe eu morri e vim parar em aqui pra pagar pelos pecados cometidos.
Minhas pálpebras pesam e se fecham por alguns segundos. Abro novamente os olhos e vejo a luz embaçada no teto. Estou tão zonzo que não consigo sentir meu corpo. Ouço algum barulho, com certo esforço consigo virar poucos sentimentos o rosto, quase nada. Minha visão embaçada me revela uma sala branca e pequena. O barulho novamente. Água! O barulho é de água. Consigo mover mais um pouco o rosto e vejo uma pessoa, acho. Está vestido de branco, mas num tom diferente do resto do ambiente. O ser se vira na minha direção, seus cabelos são escuros, sua pele também é impossível ver o rosto, está tudo embaçado demais.
Pisco lentamente, tento dizer algo, mas tudo o que consigo é murmurar alguma coisa que nem mesmo eu entendo.O estranho pega um tecido e o coloca contra meu rosto. Sinto um cheiro forte, forte demais. A luz se esvai, assim como minha consciência.
Acordo.
Abro os olhos e não vejo nada. Novamente tudo está escuro demais.
Estou novamente na minha prisão nas trevas. Chamo por Klint.- Oi! - Ele responde. Sua voz é embargada, como se tivesse acabado de acordar. - Acho que caí no sono.
- Estive lá fora. - Digo enquanto engatinha até o vidro, seguindo na direção de onde veio a sua voz.
- Mais um daqueles sonhos?
Quando ele pergunta é como se um estalo ligasse alguma coisa em minha mente. Consigo lembrar vagamente da sensação, meu corpo imóvel, a sonolência, a luz. Havia luz. Nunca foram sonhos.
Tudo começou a sabe lá quantos dias, não sei quantos exatamente, mas poucos dias. Acordo e relato sobre um sonho pra Klint, é sempre a mesma coisa que eu digo: " Sonhei com a luz." Até agora eu imaginava que fosse sonhos normais, lembranças de quando eu estava livre. Mas, desta vez pareceu tão real. Eu estava sedado, eu vi alguém, senti seu toque em minha pele e aquela coisa no meu rosto que me fez dormir novamente.
Tudo faz sentido agora.
Se passaram meses e talvez já deva ter um ano, desde que estamos aqui, mas as roupas nunca chegam mal, nossos corpos sempre estão limpos, não há lixo pelo lugar, as bandejas de comida sempre desaparecem. Klint sugeriu que eles devem limpar tudo, inclusive nos limpar enquanto dormimos. Isso faz todo o sentido e é a única explicação. Mas agora tenho certeza de que somos levados daqui. Eles nos põe pra dormir e nos levam pra ser lavados e sabe lá mais o que.
Existe uma esperança de fuga afinal. Se eu conseguir ficar acordado, talvez consiga de algum jeito fugir daqui. Só preciso despertar e me manter desperto quando estiver lá fora.
O plano é não chamar a atenção quando despertar. Vou fingir continuar dormindo até estar totalmente ou suficientemente desperto pra tentar alguma coisa. As chances são mínimas de dar certo, mas eu preciso tentar.Decido não falar nada para o Klint, uma porque talvez ele seja uma ilusão minha, outra por eu não saber se eles podem nos ouvir.
- Sim. - Respondo. - Foi só mais um sonho.
- Eu queria sonhar com alguma coisa. - Ele fala de um jeito risonho. - Mas não existe nada em minha mente além do escuro e de você. Lembro da minha vida antes de tudo isso, mas tudo o que ando sonhando ultimamente é com a sua voz.
Suas palavras saem naturalmente, mas pra mim significam tanto. Peço a todo e qualquer Deus para que Klint seja realmente uma pessoa. Meu coração não suportaria saber que ele é fruto da minha mente.
- Você sonha com minha voz? - Ele pergunta.
Sorrio involuntariamente.
- Todas as noites Klint. - Talvez você seja um sonho agora. - Também sonho com seu sorriso. - É a única coisa que eu consigo focar quando acontece o flesh.
- Quero tocar você.
Eu também quero toca-lo, abraca-lo, olhar pra ele, faze-lo sentir dor, cócegas, qualquer coisa que prove sua veracidade.
- Eu sinto o mesmo.
- Eu seria louco se dissesse que você é a única pessoa com quem eu me importo?
- Eu sou a única pessoa com quem você tem contato a muito tempo. Não é loucura pensar assim.
- Você também se importa comigo?
- Tanto que as vezes dói.
Tenho muito medo de ele desaparecer e não voltar nunca mais.
Fico imaginando como vai ser se a gente sair. Klint é sinonimo de vida pra mim, certamente eu já teria desistido sem ele. As coisas vão mudar tanto, ainda vamos nos importar um com o outro? Ainda vamos conversar um com o outro? Ainda vamos existir um para o outro? E se o mundo lá fora tirar a cumplicidade que a gente construiu.
Meu peito aperta e uma lágrima escorre pela minha bochecha. De repente fiquei com medo da liberdade.
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Vidro
Mystery / Thrillerquando Kevin desperta percebe que foi raptado e aprisionado em um local cuja a finalidade é testar sua sanidade, ele embarca em um jogo perigoso pra tentar escapar de lá. mas todas as suas tentativas acabam falhando e o desespero aumenta gradativame...