UM

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Arthur Silva 

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Arthur Silva 

A história sempre se repete.

Fecho os olhos e absorvo toda a energia que emana da torcida. O estádio está em sua capacidade máxima, bandeiras com o escudo do clube e a minha imagem estampam a arquibancada. Numa festa democrática onde todos são convidados a compartilhar a felicidade: crianças, idosos, homens e mulheres. Juntos e misturados. Torcendo, cantando e chorando, vivenciando cada minuto do jogo.

Em inglês eles entoam o meu nome. Uma, duas, três, quatro vezes eles bradam antes de explodirem em gritos e aplausos. O cântico dos deuses, como eles próprios intitulam, é a força motriz que me faz abrir os olhos e encarar o defensor a minha frente. O homem de quase dois metros agiganta-se ainda mais quando nossos olhos se encontram. O juiz apita autorizando a cobrança, o goleiro abre os braços e repete, como num mantra, que defenderá. Respiro fundo e concentro-me apenas nele, um de nós sairá derrotado e eu espero que seja a mãe dele lamentando a derrota, não a minha. Com dois passos longos rompo a distância e me aproximo da bola, levanto meu pé e aplico a força suficiente para fazê-la deslizar rapidamente e nesse momento o silêncio impera no ambiente. Toda a atenção está voltada para a bola, assisto em câmera lenta quando ela resvala na luva do goleiro e continua rolando até parar no fundo da rede.

O silêncio ensurdecedor é substituído por gritos histéricos e eufóricos. Sou derrubado por um motim de homens, meus colegas de clube, que me esmagam, literalmente, e me cobrem de elogios. Rei, Gênio, Filho da puta de sorte e tantos outros adjetivos são destinados a mim, os vagabundos estão gratos por eu acabar de garantir mais um título para o nosso clube e, com isso, antecipar as nossas férias. Faltando ainda dez rodadas para o fim do campeonato somos os campeões e apenas nos próximos jogos. Quando consigo me reerguer, corro em direção ao técnico e o abraço para poder dizer em seu ouvido, sem ser flagrado pelas câmeras de TV:

— Minha parte foi cumprida, amanhã mesmo embarco para o Brasil! — Ele me abraça efusivamente, destina tapinhas em minhas costas e me empurra para voltar ao campo, não sem antes bradar "Máquina mortífera!"

O jogo recomeça sobre os gritos de olé da torcida e faço valer o espetáculo, distribuindo passos, lençóis, embaixadinhas e canetas que deixam os adversários raivosos e a torcida feliz. O apito final soa e os adversários disputam quem trocará a camisa comigo, mas ela já tem dono: o grande goleiro que valorizou o meu trabalho no dia de hoje. Ele sorri quando eu entrego a camisa e me passa a sua. Trocamos algumas palavras rápidas antes de eu ser cercado pelos meus companheiros de clube. Sou carregado nos braços por eles, para uma volta no estádio. A torcida volta a entoar meu nome e eu absorvo em êxtase.

Sil-va, Sil-va, Sil-va

Silva, máquina mortífera.

E a melhor parte da história, que sempre se repete, é a comemoração pós-vitória. A não-oficial, claro, será regada por bebidas e mulheres. Tudo que eu preciso depois de um longo período andando na linha, me dedicando ao futebol. Por enquanto, começo a comemorar aqui mesmo no vestiário. Quando as líderes de torcida adentram o ambiente e sorriem em minha direção, sorrio de volta, porque sei que a minha fama continuará sendo contada como uma odisseia.

Segundo Tempo (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora