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Arthur Silva

            Amanhã é o meu último dia no Brasil e, pela primeira vez em tantos anos, estou sentindo saudades antes mesmo de partir. A dona da minha saudade tem nome e sobrenome, além de uma agenda abarrotada. Eu tentei bancar o namorado compreensivo, aquele que aceita com um sorriso no rosto uma pequena fatia de atenção; Ela era super-certinha em relação a horários e compromissos e eu admirava isso nela, afinal eu também era assim, mas também queria que ela quebrasse as regras uma vez na vida. Seria mais do que justificado ela faltar um dia no trabalho para ficar com o seu namorado, mas não. Olívia não se rendeu as minhas inúmeras mensagens apelativas para que ela abandonasse tudo e corresse para os meus braços. Assim, não restou outra alternativa senão usar da minha influência para persuadir as pessoas ao meu redor com o objetivo, nada nobre, de atender as minhas vontades.  Eu era muito bom nesse lance da persuasão, isso explica o poder que exerço dentre de campo e fora dele, as marcas disputam a minha atenção, todas querem ter a minha imagem relacionada ao seu produto. A equação é simples: Arthur + produto= lucro. Juan, costuma brincar que tenho uma espécie de magnetismo, um rosto angelical e um tom de voz sempre amigável capaz de seduzir gregos e troianos. Meu amigo diz que as pessoas consumiriam qualquer coisa que eu indicasse, ainda que fosse um produto de má qualidade. Por sorte delas somos pessoas honestas e não associamos a minha imagem a qualquer produto, mas isso não impede que eu use dos meus atributos para levar alguma vantagem nessa vida. Como, por exemplo, agora que tentarei aplicar o meu magnetismo com os empregadores da Olívia.

Chego na escola no horário da aula de educação física de modo que a minha entrada, que deveria ser discreta, transforma-se em uma confusão de crianças gritando e correndo em minha direção. Sou salvo pelo inspetor que me livra das crianças e me guia rapidamente para a sala da diretora. A mulher de idade avançada com uma expressão ranzinza fita-me longamente como se estivesse tentando adivinhar se eu sou um pai de aluno ou um potencial cliente. Temo não passar na sua avaliação, pois ela continua a me olhar por trás dos óculos de armação grossa. Nesse momento começo a questionar se a minha escolha despojada de jeans e regata passará no seu crivo. Sou capaz de apostar que a mulher desviará o olhar e voltará a atenção a pilha de papéis a sua frente, ignorando por completo a minha presença. Eu devia ter contado com a possibilidade de encontrar uma anciã e que assim o meu costumeiro charme de astro do futebol de nada valeria.

Ao contrário do que as pessoas acreditam ser uma figura pública não diminui o meu receio em ser avaliado. Apesar de ser seguido e ter a minha vida exposta a cada minuto, o olhar de avaliação do outro ainda me causa certo incômodo, sorte que finjo bem.

            — O senhor deseja falar comigo? — A mulher me pergunta, muito tempo depois.

            — Sim, me chamo Arthur Silva...

            — O responsável pelos gritos histéricos, presumo — e eu achando que persuadir Olívia, fosse a minha tarefa mais árdua... Agora eu temia não só não conseguir a liberação dela, como também deixá-la em maus lençóis com essa minha aparição inesperada.

Segundo Tempo (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora